Viviane Maurey é escritora, autora de #Fui.
Como você começa o seu dia? Você tem uma rotina matinal?
Caminhadas, sol, exercícios e ar livre sempre que possível. Não importa onde eu esteja, a parte da manhã é a hora mais importante do dia pra mim e, apesar de ser justamente o momento que mais estou inspirada e poderia até escrever e produzir mais rápido, sinto que é o momento melhor pra ir dar uma volta, meditar, relaxar e permitir que essa inspiração ganhe ainda mais corpo e força e fique comigo. Se eu não faço exercício, o dia é bem mais vazio e triste.
Em que hora do dia você sente que trabalha melhor? Você tem algum ritual de preparação para a escrita?
Por pressão e necessidade, já tive que trabalhar praticamente em todas as horas do dia em momentos diferentes da minha vida. Hoje em dia, escrevo à noite, porque é único momento que tenho livre, o que é uma raridade. Se eu pudesse escolher, começaria a escrever de manhã depois da rotina matinal da pergunta anterior e seguiria por horas até depois do almoço. Já tive que escrever em ônibus, em cadernos, em celular, no restaurante, até em guardanapos, quando vinha uma ideia muito boa e eu não estava com meu bloquinho por perto, então acho que não, não tenho rituais. Quando escrevi meu livro e tinha prazo para entregar, eu sentava a bunda na cadeira todos os dias depois do trabalho e escrevia por horas até sentir sono e não aguentar mais. Meu único ritual era ter a disciplina de fazer isso todos os dias sim ou sim, mesmo que eu fosse descartar boa parte depois do que estava escrevendo.
Você escreve um pouco todos os dias ou em períodos concentrados? Você tem uma meta de escrita diária?
Quando tenho um projeto e um compromisso não tem muito como fugir de uma meta diária – 2 ou 3 mil palavras, às vezes até mais, embora seja muito difícil pra mim escrever mais que isso, ainda mais com outro emprego. Quando não tenho prazo e tenho ideias para vários projetos ao mesmo tempo, escrevo aos poucos, dias bem espaçados e bem devagar. Um pouquinho por semana, por mês. E sem muita pressão, quando o motivo por não estar escrevendo com mais frequência é tão importante quanto.
Como é o seu processo de escrita? Uma vez que você compilou notas suficientes, é difícil começar? Como você se move da pesquisa para a escrita?
Minha pesquisa não vem antes, mas antes, durante e depois. Quando eu tenho uma ideia, costumo sentar e escrever e ver até onde vai essa primeira etapa. Se perco o interesse, abandono e começo outra coisa. Se passa um tempo, e ainda estou apaixonada pelo tema, pelos personagens e/ou pelo conflito, eu continuo escrevendo até chegar num momento em que preciso parar e estruturar a história; ou escrever em linhas gerais tudo pra entender pra onde quero ir ou dividindo em tópicos e trechos. Tudo sempre visando entender o que quero dizer com a história. Se não encontro a resposta para a pergunta principal: “o que eu quero contar, sobre o que é essa história?”, eu costumo deixar na gaveta respirando, até chegar o dia que vou descobrir isso – ou não.
Como você lida com as travas da escrita, como a procrastinação, o medo de não corresponder às expectativas e a ansiedade de trabalhar em projetos longos?
Quando tem pressão, eu não travo. Quando alguém me dá um prazo, funciono bem melhor. Meu maior inimigo sou eu mesma nessas questões de terminar uma história ou criar expectativas. Eu não fico muito preocupada com o outro, porque enquanto escrevo ninguém está lendo o que estou escrevendo. Eu é que estou. E sou eu a grande limitadora das possibilidades que se apresentam e sou eu que costumo ser muito exigente com tudo que escrevo. Eu demoro pra aceitar algumas coisas. O grande problema disso pra mim não é o bloqueio, ideias eu tenho muitas, mas o tempo que leva às vezes para eu enxergar algo de bom no que eu esteja fazendo, e aí quando percebo é tarde demais e perdi o interesse e quero partir pra próxima ideia. E isso é fatal. Se tem uma coisa que aprendi nos últimos anos é: não abandonar mais as histórias, escrever até o final, mesmo que seja uma história horrível. Sigo tentando seguir esse conselho.
Quantas vezes você revisa seus textos antes de sentir que eles estão prontos? Você mostra seus trabalhos para outras pessoas antes de publicá-los?
Se tem algo que eu faço muito mais na vida que escrever é revisar meu próprio texto. Pode chamar de narcisismo, perfeccionismo, insegurança, medo, masturbação, chame do que quiser, mas eu não consigo, de jeito nenhum, mostrar pra quem quer que seja, se o texto não tiver sido revisado zilhões de vezes. Sério. Meu último livro foi revisado NOVE vezes antes de eu mandar pra minha agente. Lógico que não faço isso com tudo. Tem post de blog que eu releio uma vez apenas só pra ver se não errei uma vírgula, mas não me incomoda tanto se eu tiver escrito algo ruim ou errado. Agora, com meus contos e minhas histórias eu sou muito neurótica.
Como é sua relação com a tecnologia? Você escreve seus primeiros rascunhos à mão ou no computador?
Gosto dos dois. AMO digitar no meu teclado de laptop, que é uma delícia e macio e me faz escrever até mais só porque é uma sensação gostosa, hehe (computador novo então é uma maravilha pra incentivar alguém a escrever!), mas também adoro um caderno e uma caneta pra esclarecer as ideias. Depois que comprei uma caneta tinteiro então não há coisa melhor. E percebi ao longo dos anos que é difícil eu escrever diálogo e detalhes da história no caderno, deixo para fazer essa parte quando vou pro computador. E com a caneta eu foco no outline, resumos, ideias, estrutura, linhas gerais. Curioso, né?
De onde vêm suas ideias? Há um conjunto de hábitos que você cultiva para se manter criativa?
Além da meditação e dos exercícios, que eu já comentei, eu tiro inspiração de literalmente tudo na minha vida; dos amigos, de situações inusitadas e até comuns, de algo que escuto aleatoriamente na rua, de uma paisagem, de um cenário, de uma viagem, de um corte de cabelo, da cor de um sapato, de um episódio de série ou algum filme, enfim, qualquer coisa pode servir de inspiração para as ideias. Acho também que manter o hábito de ser disciplinada para coisas básicas do dia a dia, como fazer a cama ou algum exercício, refletem na minha escrita e na capacidade de sentar pra escrever.
O que você acha que mudou no seu processo de escrita ao longo dos anos? O que você diria a si mesma se pudesse voltar à escrita de seus primeiros textos?
A única coisa que fica mais fácil é construir frases e usar o português, porque de resto nada mudou. Não importa quantas histórias eu escreva, as mesmas dificuldades e os mesmos demônios estão sempre presentes e em todas as vezes, sem exceção, eu preciso derrotá-los, um por um, para conseguir escrever até o final e passar por todos os obstáculos da escrita. Acho que a única coisa que eu realmente acho que valeria a pena dizer para o “eu” mais novo é: “Deixa pra pensar só na hora de editar e revisar.” Pensar muito enquanto escreve limita bastante. Mas é o tipo de coisa que só se aprende na porrada.
Que projeto você gostaria de fazer, mas ainda não começou? Que livro você gostaria de ler e ele ainda não existe?
Não existe projeto que eu gostaria de fazer e ainda não tenha começado, porque se tem uma coisa que sei fazer é começar projetos (rindo alto mas de nervoso). O problema, amigo, é conclui-los. São justamente esses projetos que começo os livros que não encontro e gostaria que existissem. Ou que existem e eu, por algum mole, ainda não tenha lido.