Vivian de Moraes é escritora em Araraquara.
Como você começa o seu dia? Você tem uma rotina matinal?
Minha rotina matinal é dormir. Durmo 12h por dia, da meia-noite ao meio-dia. Portanto, é nesse horário que começo a ficar ativa. Tomo um substancioso “café da manhã”, leio as notícias e abro e-mail e Facebook.
Em que hora do dia você sente que trabalha melhor? Você tem algum ritual de preparação para a escrita?
O meu melhor horário para escrever é de madrugada. Sofro de insônia e, no silêncio em que todos dormem é quando mais produzo. E adoro isso! Quanto a ritual, não tenho nenhum, exceto tomar notas durante todo o tempo quando estou mais criativa. Depois seleciono as mais interessantes e procuro dar formas a poemas, contos e capítulos dos meus dois romances em andamento.
Você escreve um pouco todos os dias ou em períodos concentrados? Você tem uma meta de escrita diária?
Escrevo em períodos concentrados, sempre de acordo com a minha insônia, devido à fase maníaca do transtorno bipolar de que sofro e que é a minha face criativa como escritora e na vida. Para se ter uma ideia, em 2014 escrevi as bases do meu primeiro romance em 33 dias seguidos. Ao longo do tempo, fui mudando, lapidando, acrescentando, e hoje ele está em fase de finalização. Por conta dos períodos de depressão e à instabilidade mesma da minha doença (que tem como comorbidade o transtorno de personalidade borderline, também), não tenho como estabelecer uma meta de escrita diária. Bem que gostaria!
Como é o seu processo de escrita? Uma vez que você compilou notas suficientes, é difícil começar? Como você se move da pesquisa para a escrita?
Não é difícil começar se eu estiver com a ideia saltitante na cabeça, e é bem assim que acontece. Um dia, do nada, vem uma inspiração, algo para um pontapé inicial, uma ideia de enredo, como no caso do romance em 33 dias que mencionei. Às vezes ponho as ideias em prática imediatamente, às vezes prefiro ir tomando notas para que a coisa toda se esclareça na minha cabeça e eu saiba exatamente o que quero fazer. Começo na escrita, não na pesquisa. Primeiro escrevo, escrevo, escrevo, e depois, com calma, vou checar cada detalhe. Mesmo assim, sempre fica alguma dúvida.
Como você lida com as travas da escrita, como a procrastinação, o medo de não corresponder às expectativas e a ansiedade de trabalhar em projetos longos?
Lido bem, pois não exijo de mim senão lealdade ao meu propósito de escrever quando e como quero. Quando estou engajada num projeto, não há procrastinação: as madrugadas me salvam. Quanto a projetos longos, tenho um segundo romance no qual deixei de mexer há mais de um ano. Trata-se de uma autoficção e perdi o fôlego dela. E não é que ontem (dia 28 de agosto) tive um pesadelo horrível e me vi, novamente, diante de uma madrugada inspiradora? Dei um gás no projeto e penso que ele pode vir a ser até mesmo publicado antes do que o primeiro romance que escrevi e que passei para amigos lerem e opinarem.
Quantas vezes você revisa seus textos antes de sentir que eles estão prontos? Você mostra seus trabalhos para outras pessoas antes de publicá-los?
Ops, me adiantei! Sim, mostro, pois penso que sempre há pontos cegos nos meus textos. Sobre o meu primeiro romance, por exemplo, pedi opiniões em diversas versões para o grande escritor e amigo Éder Rodrigues. Ele me sugeriu tornar o texto mais “caótico” e sugerir mais do que mostrar. Foi um grande aprendizado. Embora o texto ainda esteja com um final provisório, passei também para a Cinthia Kriemler, autora de Todos os abismos convidam para um mergulho (Patuá, 2017).
Como é sua relação com a tecnologia? Você escreve seus primeiros rascunhos à mão ou no computador?
Normalmente à mão, em caderninhos que ganho de amigos. O Éder, por exemplo, já me presenteou com dois, e são muito úteis. Mas isso quando a minha mente fervilha e eu fico dias inteiros pensando num texto. Quando estou mais “calma”, digamos assim, abro o computador e digito minhas notas.
De onde vêm suas ideias? Há um conjunto de hábitos que você cultiva para se manter criativa?
Eu já sou criativa. Quem é bipolar sabe como é. Naturalmente, quando estou deprimida não tenho nem vontade de comer, o que dirá pensar literariamente. Minhas ideias vêm de ritmos que escuto e leituras que faço, especialmente na poesia. No conto, creio que estou criando um estilo, que está deslizando também para o meu segundo romance: um estilo de fluxo de consciência, absurdo e angústia.
O que você acha que mudou no seu processo de escrita ao longo dos anos? O que você diria a si mesma se pudesse voltar à escrita de seus primeiros textos?
Se eu pudesse voltar, não sairia publicando (risos). Considero pífios meus quatro primeiros livros. Mas eu tinha uma necessidade, escrevo desde os nove anos e tinha de me aventurar, e disso não me arrependo, nesse aspecto. Hoje estou bem mais cautelosa.
Que projeto você gostaria de fazer, mas ainda não começou? Que livro você gostaria de ler e ele ainda não existe?
Nossa, que perguntas difíceis! (risos) Eu gostaria mesmo é de escrever um romance que fosse mais audacioso e radicalmente moderno que Ulysses, do Joyce, um livro que amei de paixão e já estou pensando em reler. O livro que gostaria de ler e que ainda não existe é justamente um como esse que, quem sabe um dia, eu me aventure a escrever. É importante dizer que gosto de “livrões”. O último que li foi Ilusões perdidas, do Balzac, uma obra-prima. Entre os contemporâneos, amei Graça infinita, do Foster Wallace. E uma obra a que me dediquei meses a fio foi um divisor de águas em termos de leitura e escrita para mim: Em busca do tempo perdido, do Proust. E amo Dostoiévski e os russos em geral.