Victor Mendes é ator, autor e diretor.

Como você começa o seu dia? Você tem uma rotina matinal?
Não tenho uma rotina de escrita matinal, geralmente gosto de me informar assim que acordo. Como se precisasse me encher de coisas um pouco. Ano passado, por exemplo, eu escutava o podcast Café da Manhã (da Folha) e lia algumas noticias na internet, mas tem dias em que assisto um episódio de Friends por exemplo. Não tenho mesmo uma rotina estabelecida.
Em que hora do dia você sente que trabalha melhor? Você tem algum ritual de preparação para a escrita?
Sinto que de manhã e a tarde eu rendo muito mais… a noite não evoluo direito, não sei se estou cansado ou querendo fazer outra coisa… mas eu me distraio mais, só escrevo a noite quando tenho que escrever, quando estou apertado com um prazo ou algo do tipo. Gosto de ter sempre água do lado e as vezes um café. Depois do almoço por exemplo, sento feliz com um café do lado para escrever. Agora um ritual do tipo, só escrevo em determinado lugar, ou ouvindo musicas de fossa… isso não, rs.
Você escreve um pouco todos os dias ou em períodos concentrados? Você tem uma meta de escrita diária?
Não escrevo todos os dias, mas queria. Quero na verdade. rs. Tem fases que escrevo todos os dias, principalmente quando estou envolvido em algo, me estimulando, me sentindo desafiado por algo que comecei ou que tenho que entregar, aí eu vou que vou, todos os dias. Mas tem fases que não. Acho que o que rola comigo é que fico pensando muito até começar a colocar as ideias no papel, então esses momentos que não escrevo, acho que estou gestando.
Como é o seu processo de escrita? Uma vez que você compilou notas suficientes, é difícil começar? Como você se move da pesquisa para a escrita?
Meu processo é meio estranho. Não sei se tenho muito um mesmo jeito de fazer sempre. As vezes anoto um monte de coisas e depois começo a desenrolar uma ideia no papel e aí começa a tomar forma. As vezes fico com a tv ligada, em algum programa que já conheço, que me é familiar, e vou deixando aquilo invadir um pouco, vou escrevendo coisas soltas. As vezes sento em cafés e passo as tardes ouvindo as pessoas conversarem e fico escrevendo. Mas o que eu acho que é regular é que eu fico muito tempo pensando, pensando, as vezes até anos pensando e aí vou pro papel, mas uma vez que estou no papel, as coisas fluem mais.
Um detalhe, toda vez que eu falo papel é aqui no teclado do meu computador, tá?
Como você lida com as travas da escrita, como a procrastinação, o medo de não corresponder às expectativas e a ansiedade de trabalhar em projetos longos?
As travas da escrita aparecem pra todos nós né? Vai ter esse momento de sentar e nada sair, de começar a rascunhar alguma coisa e nada de bom sai dali… acho que isso é comum. E eu lido com isso enfrentando isso.. eu fico tentando combater isso… passo o dia pensando nisso, as vezes levanto e vou fazer outra coisa mas aí tenho uma ideia e escrevo lá duas, três linhas e continuo a pensar… aí uma hora de tanto insistir a coisa flui. Procrastinar não é muito minha praia. Eu gosto de fazer e me dedicar as coisas. Insistir nelas. Não tenho medo quanto a expectativas dos outros, talvez por na maioria dos casos escrever projetos pra mim, ou que estou bem envolvido. Ainda não estive em projetos que demandem muito e eu tenha uma relação mais burocrática com a obra… por enquanto tudo o que escrevi e escrevo tem muito a ver comigo dentro de algo. Não com algo fora de mim.
Quantas vezes você revisa seus textos antes de sentir que eles estão prontos? Você mostra seus trabalhos para outras pessoas antes de publicá-los?
Milhares de vezes. Por ser ator leio em voz alta muitas vezes… Rezo meus textos antes de deixá-los ir, como aprendi com um mestre. Mostro sempre meus textos a alguns amigos próximos antes de torná-los públicos… sempre! Pelo menos pra umas 3 ou 4 pessoas de confiança e que admiro muito.
Como é sua relação com a tecnologia? Você escreve seus primeiros rascunhos à mão ou no computador?
No computador. No começo resistia um pouco e queria fazer a mão. Mas a verdade é que funciono melhor no computador. Mas o papel fisico mesmo é muito importante pra mim porque eu adoro desenhar e escrever e desenhar pra mim tem raizes em comum, eu vou desenhando, rabiscando e quando vejo estou desenhado a obra que estou escrevendo.
De onde vêm suas ideias? Há um conjunto de hábitos que você cultiva para se manter criativo?
Acho que sou uma pessoa que colhe muitas referências. Vejo muitos filmes. Muito teatro. Leio bastante.(Não tanto quando deveria e gostaria, mas ainda sim bastante) E adoro ouvir estórias das pessoas, causos, historias de gente mesmo, do dia a dia, do tio da padaria, do porteiro, do motorista do app, de tudo…. ouvir é fundamental no meu processo de criatividade. Gosto de humanidades.
O que você acha que mudou no seu processo de escrita ao longo dos anos? O que você diria a si mesmo se pudesse voltar à escrita de seus primeiros textos?
Diria que fiquei mais profundo ao longo dos anos, mais responsável com a escrita. Tomei coragem e pulei na piscina… ainda nado no raso mas agora descobri que o fundo existe. Não cheguei lá, mas sei que ele existe.
Diria pra mim mesmo assim: Ó, parece muito difícil isso de escrever né?Mas lembra que nadar também era? Andar de bike? mas você vai conseguir, prometo! Leia coisas que você se interessa, não ligue tanto pros outros, leia mais e mais. E continue aí escrevendo meio escondido sem mostrar pra ninguém mas saiba que um dia isso tudo vai fazer sentido.
Que projeto você gostaria de fazer, mas ainda não começou? Que livro você gostaria de ler e ele ainda não existe?
Escrever uma série de televisão. Isso ainda tenho muita vontade de fazer. Ou um filme. É, uma serie e um filme na verdade. Quero fazer parte de mesas de roteiro, aprender com a galera mais experiente, trocar, aprender e evoluir. Quero continuar escrevendo teatro, colaborando em séries, escrevendo contos e me arriscando em projetos até me sentir pronto pra me aventurar em projetos pessoais de grande porte.
O livro que gostaria de ler e ainda não existe é sobre a minha criação evoluindo, a minha ou uma outra qualquer, mas uma história que nunca fica pronta porque a vida nunca fica pronta. Algo tão real quando viver. Uma espécie de Sinédoque New York.