Como eu escrevo

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Como escreve Victor Colonna

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Victor Colonna é poeta e cronista, autor de Sujeito Oculto (1999), Cabeça, Tronco e Versos (2009) e Antes que eu me Esqueça (2015).

Como você começa o seu dia? Você tem uma rotina matinal?

Acordo, tomo café, vejo as notícias no computador e na televisão e saio para trabalhar.

Em que hora do dia você sente que trabalha melhor? Você tem algum ritual de preparação para a escrita?

Quando escrevo um poema não há hora marcada. Em geral, o poema nasce de alguma frase que penso e acho interessante, ritmada. A partir desse primeiro verso é que o poema se desenvolve, tenho que ter algo (um verso, uma estrofe) para desenvolver o poema.

Já a crônica é diferente. Definido o tema da crônica, eu sento e escrevo, a hora não importa.

Você escreve um pouco todos os dias ou em períodos concentrados? Você tem uma meta de escrita diária?

Escrevo em períodos concentrados. Não tenho uma meta.

Como é o seu processo de escrita? Uma vez que você compilou notas suficientes, é difícil começar? Como você se move da pesquisa para a escrita?

Na crônica eu faço uma compilação de notas. É mais fácil começar uma crônica que um poema.

Um poema é sempre difícil. Na verdade, é impossível. Todas as vezes que escrevo um poema tremo de pavor de nunca mais voltar a escrever um.

E quando não escrevo, também tenho esse pânico, vivo com medo de que seja meu último poema.

A crônica é diferente. É mais racional, pelo menos no seu início.

Defino o tema, elenco aquilo que eu creio ser interessante e começo a trabalhar, ou seja, escrever e cortar, lapidar, lapidar, lapidar.

Escrever é tirar a sujeira do texto.

Como você lida com as travas da escrita, como a procrastinação, o medo de não corresponder às expectativas e a ansiedade de trabalhar em projetos longos?

Como não sou escritor profissional, os projetos, em geral, são próprios, quer dizer, as expectativas que eu correspondo são as minhas expectativas.

É complicado. Durante muito tempo acreditei que um dia eu iria “aprender” a escrever e que “teria certeza” de ser um escritor.

Só que o tempo passava e a certeza não vinha. Até que descobri que um artista nunca vive na certeza, a arte é fruto e raiz dessa incerteza.

Logicamente estou falando de poesia.

Na crônica, o processo é diferente.

Quantas vezes você revisa seus textos antes de sentir que eles estão prontos? Você mostra seus trabalhos para outras pessoas antes de publicá-los?

Uma crônica? Umas 15/20 vezes.

Um poema? Pelo menos 50.

Mostro para alguns amigos mais íntimos.

É sempre bom avaliar as reações.

Mas há textos em que a confiança é tão grande que eu já tenho certeza de que o publicarei. Não são todos, mas há aqueles. (risos)

Como é sua relação com a tecnologia? Você escreve seus primeiros rascunhos à mão ou no computador?

Poema eu sempre escrevo à mão.

Amo os rascunhos.

Pelos rascunhos consigo ver todo o processo de escrita do poema, a sujeira, os erros, os versos cortados.

Muitos dos meus poemas são metapoemas, poemas que falam sobre o processo de escrever poemas. Então, para mim, estudar os rascunhos é uma delícia, é como se eu me reconhecesse no que eu escrevo. Na verdade, me conhecesse naquilo que escrevo.

O poema nos revela. Para o mundo. E para nós.

A crônica eu escrevo no computador. Releio e vou fazendo novas versões. Sempre espero pelo menos três dias para publicar.

Uma das vantagens do poema sobre a crônica é essa. O poema sempre demora mais para ser publicado (no meu caso, pois não costumo escrever e publicar um poema na internet antes de se passar um bom tempo.) Então posso trabalhar mais nele. E o tempo faz com que os erros do texto saltem aos olhos, quando o texto descansa os erros se revelam. Então é só cortar. E cortar. E cortar.

De onde vêm suas ideias? Há um conjunto de hábitos que você cultiva para se manter criativo?

As ideias vêm da vida. Tenho o costume de conversar muito comigo mesmo (o que é diferente de conversar sozinho).

Tenho altas conversas comigo mesmo. E deixo meu pensamento voar, sem crítica alguma. Muitas vezes, aparece um verso neste momento. E eu me permito a tudo antes de publicar, me dou total liberdade para escrever qualquer coisa, por mais boba que possa parecer. A crítica vem depois, quando eu lapido o texto.

O que você acha que mudou no seu processo de escrita ao longo dos anos? O que você diria a si mesmo se pudesse voltar à escrita de seus primeiros textos?

A consciência do processo. Eu não tinha a consciência de como era meu processo de escrita.

Eu me diria para escrever mais. E para não ter medo de ter medo. Medo é uma constante para qualquer artista. Medo de não criar, medo de falhar.

Que projeto você gostaria de fazer, mas ainda não começou? Que livro você gostaria de ler e ele ainda não existe?

Quero escrever uma peça de teatro e um roteiro de cinema.

Há muitos livros que já foram criados e tenho vontade de ler.

Mas a criatividade humana é infinita. Sempre haverá novos livros surpreendentes, emocionantes, maravilhosos. Neste mundo caótico em que vivemos a arte sempre vai resistir.

* Entrevista publicada originalmente em 7 de agosto de 2018, no comoeuescrevo.com (@comoeuescrevo).

Arquivado em: Entrevistas

Sobre o editor

José Nunes é editor da Colenda.

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