Vanessa Ratton é escritora.
Como você começa o seu dia? Você tem uma rotina matinal?
Sou viciada em café, então, meu dia sempre começa com um copo de água e café de coador. Meu vício. Depois vou acordando toda a família e tomo meu banho para me arrumar e ir trabalhar. Sou jornalista e professora, atualmente, trabalho com Educação Política na Escola do Legislativo de Guarujá. A rotina tem a ver com esta atividade. Um dia espero poder só trabalhar com literatura e arte, ainda não dá!
Em que hora do dia você sente que trabalha melhor? Você tem algum ritual de preparação para a escrita?
Funciono bem, no momento da inspiração, então, escrevo à mão, num caderno que tenho perto da cama ou numa caderneta que fica sempre na bolsa. Casei e tive minha primeira filha aos 23 anos, recém-formada da faculdade, mesmo assim, fiz especialização e mestrado e além de trabalhar lecionava numa universidade. Então, os momentos de paz para escrever sempre foram as madrugadas, ou esperava todos dormirem ou levantava umas três horas antes de todos. Foi assim que consegui dar conta de ser mãe, esposa, profissional e escritora. Esse jeito prevalece até hoje, gosto do silêncio da casa, da madrugada.
Você escreve um pouco todos os dias ou em períodos concentrados? Você tem uma meta de escrita diária?
Comecei a escrever aos 14 anos para teatro, sou atriz, venho de uma grande (de tamanho) família de artistas: pai, mãe, tio, primos… Depois, da faculdade, fiquei um tempo sem escrever nada. Mas as ideias na cabeça. Não conhecia como era a vida profissional de um escritor, achava tudo muito distante. Esperei quase 20 anos para voltar a escrever, de repente, me vi fazendo poemas. Me inscrevi em alguns concursos e fui vencendo entre primeiro e terceiro lugar, acreditei que tinha algum talento com as palavras, resolvi publicar um livro, mas ainda não tinha confiança, então, criei um concurso, divulguei e selecionei 20 poetas para lançar junto comigo meu primeiro livro. Faltava coragem e foi em grupo que consegui mostrar meu trabalho para o mercado. A produção do livro, bancado por mim, foi meu presente de aniversário aos 38 anos. Depois vieram os livros infantis, e assumi o pseudônimo de Tatá Blloom.
Como é o seu processo de escrita? Uma vez que você compilou notas suficientes, é difícil começar? Como você se move da pesquisa para a escrita?
Acontece um fato, vejo uma cena, uma matéria no jornal, ou penso numa questão, essa ideia fica na cabeça, vou pesquisando sobre o tema, e a ideia vai tomando forma, o texto fica se repetindo até que eu escreva, pode começar com um verso, ou uma fala de uma personagem… Enquanto eu não escrever aquilo, fica na minha cabeça me perturbando, não consigo dormir, nem trabalhar direito, já sei que tenho que anotar e, depois, no momento oportuno, volto na ideia e vou desenvolvendo. Às vezes sonho com a cena e vou dirigindo o que vai acontecendo na cabeça. Acordo e escrevo. Não tenho dificuldade de escrever, desde que encontre tempo e não tenha interrupções o primeiro texto sai. Depois aprendi que é preciso ser relido, lapidado, umas duas ou três vezes. Sempre gosto de mostrar para um editor ou amigo escritor, vêm novas observações e enriquecem muito. Daí preciso de um distanciamento. Um tempo sem ler o texto, para depois deixá-lo no ponto. Mas só aprendi isso no terceiro livro, Uma Menina Detetive e a Máfia Italiana, editora Trejuli.
Como você lida com as travas da escrita, como a procrastinação, o medo de não corresponder às expectativas e a ansiedade de trabalhar em projetos longos?
Escrevo 90 por cento das vezes para crianças e jovens. É uma escolha da psicopedagoga, gosto de ajudar a criança a sonhar, a encontrar respostas para os seus conflitos e emoções por intermédio da literatura ou da dramaturgia. Nesta área não tenho trava. Quando escrevo poemas, é muito pessoal, sempre algo que estou sentindo em relação a algum momento ou pessoa. Mas, ao escrever para adultos, sinto que em alguns momentos a ideia flui, em outros, fico sem imaginação. Geralmente, deixo o texto descansando vou pesquisar mais, ler autores que gosto, conhecer personagens que possam ter paralelos com os meus. Tenho um livro de crônicas de humor baseado em fatos reais da minha vida e um romance em parceria com meu marido, o jornalista Carlos Ratton, mas nenhum dos dois está pronto ainda. Estou dando o distanciamento para voltar neles, o esqueleto está pronto, faltam as carnes.
Quantas vezes você revisa seus textos antes de sentir que eles estão prontos? Você mostra seus trabalhos para outras pessoas antes de publicá-los?
Aprendi que é preciso ser relido, lapidado, umas duas ou três vezes. O primeiro texto é feito no calor da emoção, muita coisa passa. Sempre gosto de mostrar para um editor ou amigo escritor, vêm novas observações e enriquecem muito. Daí preciso de um distanciamento. Um tempo sem ler o texto, para depois deixá-lo no ponto.
Como é sua relação com a tecnologia? Você escreve seus primeiros rascunhos à mão ou no computador?
Nem que seja a sinopse, um trecho que inspira o capítulo vem primeiro à mão. Depois sigo no computador sem problemas.
De onde vêm suas ideias? Há um conjunto de hábitos que você cultiva para se manter criativa?
Ler muito, de tudo, observar as pessoas no ambiente de trabalho, no círculo de amizades e na família. Viajar me inspira muito, conhecer novas culturas, lugares, pessoas.
O que você acha que mudou no seu processo de escrita ao longo dos anos? O que você diria a si mesma se pudesse voltar à escrita de seus primeiros textos?
Eu escrevi muito na adolescência e coisa bem interessantes, sinto uma tristeza ter perdido muitos textos com as mudanças, e na época não tinha computador, então, muita coisa se foi.
Que projeto você gostaria de fazer, mas ainda não começou? Que livro você gostaria de ler e ele ainda não existe?
Projeto que quero muito fazer e ainda não fiz é editar um livro com minhas peças de teatro infantil. Acredito ser importante para as escolas mostrar esse gênero literário e até ter o ensino do teatro, não podemos deixar o palco morrer. A arte nos salva e é fundamental para melhorar os humanos.
O livro que eu gostaria de ler, no momento, é o que nos fizesse entender o caos em que o ser humano se encontra hoje e que nos ajudasse a refletir o que fazer para mudar isso. Estamos vivendo um momento de tanto medo da violência, sem esperança em nenhuma instituição, cansados de tanta corrupção de todos os lados, que a minha impressão é de que estamos cometendo ou assistindo atrocidades, rindo quando deveríamos chorar, nos abstendo de votar ou de acompanhar a política, incapazes de acreditar que alguém possa resolver essa bagunça, então, estamos aguardando uma explosão para que nasça ordem do caos como que um novo mundo. E não sabemos quem está com a razão, estamos tentando desesperadamente de tudo. E estou pensando que triste vai ser recolher os cacos do que sobrar para tentar recomeçar uma sociedade com mais equilíbrio em tudo, mas, como muitos, me sinto impotente neste momento. Não tivemos uma grande guerra, nem um grande desastre ecológico que nos obrigasse a unir forças para reconstruir. E a sensação que tenho é que enquanto não sofrermos muito, não teremos um país com o povo unido para recomeçar, continuamos aguardando um herói que faça isso por nós e ele não existe e nunca existirá. Somos todos nós, juntos, que teremos que aprender a reconstruir esta nação. Na minha humilde opinião.