Valéria Martins é jornalista, escritora e agente literária à frente da Oasys Cultural.
Como você começa o seu dia? Você tem uma rotina matinal?
Sim. No momento, moro sozinha, o que ajuda a ter uma rotina regrada. Acordo por volta das 8h e faço uma hora de meditação todos os dias. Às vezes, os compromissos não deixam, mas tento sempre fazer. Tomo café lendo ou olhando a paisagem da minha janela, que é muito bonita. Moro na Gávea, Rio de Janeiro, perto da floresta, e tenho o Morro Dois Irmãos bem de frente para mim. Vem muitos passarinhos e cada dia é um quadro diferente na minha janela. Também ouço música de manhã. Calma ou agitada, depende do meu estado interno.
Em que hora do dia você sente que trabalha melhor? Você tem algum ritual de preparação para a escrita?
Eu escrevo somente nos fins de semana, pois durante a semana trabalho muito. Após a meditação e o café, passeio no Parque da Cidade, ao lado de casa. Uma hora andando, observando a natureza, em contato comigo mesma. Tem um lugar no parque que é ‘o meu lugar’. É muito bonito, de frente para umas árvores muito altas cujos caules foram envoltos por outras plantas. Parecem sentinelas vestidas. Eu paro ali e faço uma prece, pedindo clareza para o que quero escrever em seguida. Então eu volto e começo a escrever.
Você escreve um pouco todos os dias ou em períodos concentrados? Você tem uma meta de escrita diária?
Escrevo de umas onze até quase duas da tarde. Aí eu paro, almoço, descanso e volto até quando aguento. Normalmente, quando a noite chega fico cansada, sonolenta. Aí eu paro, me arrumo e saio. Não tenho meta, mas tento não me deixar contagiar pela preguiça ou procrastinação. Meu tempo para escrever é pouco e preciso aproveitar ao máximo.
Como é o seu processo de escrita? Uma vez que você compilou notas suficientes, é difícil começar? Como você se move da pesquisa para a escrita?
Eu simplesmente sento e escrevo sem pensar muito. Enquanto estou escrevendo, procuro não pensar e nem atentar para a forma. Sai num jorro, cheio de erros. Quando termina, eu volto e corrijo. Às vezes, só no dia seguinte.
Como você lida com as travas da escrita, como a procrastinação, o medo de não corresponder às expectativas e a ansiedade de trabalhar em projetos longos?
Sento e escrevo. Como já disse, meu tempo para a escrita é limitado. Não posso me dar o luxo de adiar, procrastinar, ter preguiça.
Quantas vezes você revisa seus textos antes de sentir que eles estão prontos? Você mostra seus trabalhos para outras pessoas antes de publicá-los?
Reviso entre três e cinco vezes. Não tenho o costume de mostrar, a menos que seja algo profissional, alguém que eu eleja para corrigir, opinar. Uma leitura crítica, vamos dizer.
Como é sua relação com a tecnologia? Você escreve seus primeiros rascunhos à mão ou no computador?
Sempre no computador. Vício de jornalista.
De onde vêm suas ideias? Há um conjunto de hábitos que você cultiva para se manter criativa?
Eu anoto meus sonhos. Tenho três cadernos cheios de sonhos. Algumas ideias vêm daí. Outras vem do dia a dia, e trato de anotá-las para não esquecer. As ideias mais consistentes, essas ficam dando voltas dentro de mim. Não esqueço, mas anoto assim mesmo, para reler antes de me sentar para escrever.
O que você acha que mudou no seu processo de escrita ao longo dos anos? O que você diria a si mesma se pudesse voltar à escrita de seus primeiros textos?
Poxa, eu diria: “Valéria, coragem!” Sempre quis escrever, mas não confiava no meu taco, não me considerava capaz de criar algo bom. Faltou ‘autorização’ – inconsciente, quero dizer – do meu pai, que foi um jornalista famoso, ganhou dinheiro com a profissão, mas não queria que eu seguisse esse caminho. Ele morreu quando eu tinha 17 anos e fiz muita terapia por causa disso! Hoje, tenho certeza de que ele aprovaria o caminho que percorri. Tenho muito orgulho de todas as dificuldades que superei e ele, esteja onde estiver, também está orgulhoso de mim. Ao menos, a parte dele que vive em mim está.
Que projeto você gostaria de fazer, mas ainda não começou? Que livro você gostaria de ler e ele ainda não existe?
Eu gostaria de escrever um romance ‘de verdade’. Será que vou conseguir? Não sei. Espero que sim. Eu gostaria de ler esse meu romance, ora.