Tracy Segal é atriz, tradutora, jornalista e escritora.
Como você começa o seu dia? Você tem uma rotina matinal?
Leio os jornais junto ao café, ao menos lia, agora me policio, tem me adoecido ler muita notícia. Não detecto em mim uma repetição diária de práticas. Por vezes escrevo de manhã, a mente tá clara, por vezes acordo embotada. A única rotina certeira é que tomo duas canecas de café com leite. Tenho tentando substituir as notícias ingeridas nos primeiros horários de meu dia por música ou poesia.
Em que hora do dia você sente que trabalha melhor? Você tem algum ritual de preparação para a escrita?
Esse horário é interno, vai de acordo com meu estado de ânimo. Ando buscando meus gatilhos para a escrita, meus rituais. Ler é o que mais se aproxima de um ritual. Ler sempre me inspira, procuro inspiração nos autores que admiro. A própria literatura é minha fonte, podendo ser poesia, prosa ou teoria. Ler notícias também é uma inspiração, adoro ser cutucada pelo absurdo cotidiano do noticiário, mas como dito acima, tenho me policiado na absorção da realidade impressa, ultimamente. Espero retomar em breve.
Você escreve um pouco todos os dias ou em períodos concentrados? Você tem uma meta de escrita diária?
Ainda não coloquei metas, sou bastante amadora. Tenho o que chamo de diário, que não se parece em nada com um diário – não tem datas, não escrevo todos os dias, é só um documento sem fim onde lanço o primeiro jorro –, se gosto de algo copio para um novo documento, e aí lapido.
Como é o seu processo de escrita? Uma vez que você compilou notas suficientes, é difícil começar? Como você se move da pesquisa para a escrita?
Sou cutucada por algo que li, vi ou vivi, então escrevo. A pesquisa surge com a demanda. Minha escrita é bastante caótica. Vou anotando, abrindo novos documentos, rearrumando. Entulho minha mesa de livros, ouço música. Procrastino. Volto a escrever… Converso com o texto em todos os lugares durante um processo criativo, fico atenta a tudo. Como se pudesse encontrar peças perdidas do quebra-cabeças a qualquer instante e em qualquer lugar.
Como você lida com as travas da escrita, como a procrastinação, o medo de não corresponder às expectativas e a ansiedade de trabalhar em projetos longos?
Acredito que o ócio, as travas e a procrastinação são fundamentais à escrita. Não sou um jorro de ideias, elas precisam depurar em mim. O não saber, o medo, a ansiedade, são partes do processo criativo, antecedem o que vai se configurar em linguagem.
Quantas vezes você revisa seus textos antes de sentir que eles estão prontos? Você mostra seus trabalhos para outras pessoas antes de publicá-los?
Mostro para pessoas queridas, em quem confio, sempre que acho que algo vale à pena (adoro este termo pelo seu sentido literal), até porque com o tempo costumo desgostar e acabo jogando fora. Mostro pra que alguém me diga se devo guardar, isso me dá uma balisa, um ponto de contato com a realidade.
Quanto a revisão, é uma nova escrita. Leio em voz alta, corto, troco sentenças de lugar. Um trabalho de ourivesaria. Alguns escritos surgem e são mais felizes já de cara, outros precisam de muito trabalho.
Como é sua relação com a tecnologia? Você escreve seus primeiros rascunhos à mão ou no computador?
Comecei a escrever tarde, já no computador. Mesmo quando anoto algo na rua, pouco aproveito. Escrevo nos livros que leio, mais para que aquilo se fixe pelo ato em si da escrita. Gosto da relação com o teclado, do barulho, da tela, da luz.
De onde vêm suas ideias? Há um conjunto de hábitos que você cultiva para se manter criativa?
Não cultivo hábitos, gostaria, mas não. Bebo, na realidade, do cotidiano e da memória. Às vezes bebo também. Tenho um estado criativo que se instaura, é perceptível. Quando isso acontece procuro escrever, é prazeroso.
O que você acha que mudou no seu processo de escrita ao longo dos anos? O que você diria a si mesma se pudesse voltar à escrita de seus primeiros textos?
Como sempre gostei muito de ler, e considero a leitura o melhor exercício, percebo que minha maneira de ler mudou muito, leio atenta ao que leio, percebendo a escrita.
Acho estranho pensar sobre o que diria a uma “eu” de antes, porque eu sou fruto do tempo que vivi, e acho que o tempo faz o que faz. Eu não poderia ser outra quando fui quem fui, nem ser quem sou hoje enquanto ainda não era.
Que projeto você gostaria de fazer, mas ainda não começou? Que livro você gostaria de ler e ele ainda não existe?
Tenho muitos projetos, mas em geral, o que se fixa, se fixa por si. Ainda não mergulhei em algo de fôlego, pretendo, mas ainda não fiz. São, certamente, livros que gostaria de ler. Alguém escreveria algo que não gostaria de ler?