Tailor Diniz é escritor e roteirista, autor de“A superfície da sombra”, adaptado para o cinema em 2018, “Em linha reta”, semifinalista do Prêmio Oceanos de 2015.
Como você começa o seu dia? Você tem uma rotina matinal?
Tenho uma rotina que procuro cumprir, embora não haja um compromisso firmado em cartório. Pode ser alterada eventualmente, sem problemas. Acordo por volta de seis e meia da manhã, tomo café, leio os jornais impressos do dia [coisa antiga], depois ligo o computador e começo a trabalhar.
Em que hora do dia você sente que trabalha melhor? Você tem algum ritual de preparação para a escrita?
Sem dúvida, as manhãs são mais produtivas. Mas isso não significa que eu não escreva também à tarde. Só deixo fora a noite que, para mim, foi feita para dormir. Não consigo produzir nada depois que o sol se põe. A não ser que venha em alta velocidade em algo que esteja escrevendo e não me dê conta da passagem do tempo. Isso, uma vez ou outra acontece, de olhar pela janela e o dia já ter ido embora. Mas ligar o computador à noite para começar ou continuar algo, jamais.
Não tenho ritual, a não ser reler aquilo que foi escrito no dia anterior, para retomar o ritmo.
Você escreve um pouco todos os dias ou em períodos concentrados? Você tem uma meta de escrita diária?
Quando tenho algo em produção procuro escrever todos os dias. Mas não tenho metas. O importante é não deixar o texto parado, não perder o contato com ele. Em muitas vezes, dependendo da situação, volto ao início e vou fazendo aqueles ajustes que se tornam necessários de acordo com o desenvolvimento da trama. Isso, muitas vezes, é mais útil do que produzir algo novo naquele dia.
Como é o seu processo de escrita? Uma vez que você compilou notas suficientes, é difícil começar? Como você se move da pesquisa para a escrita?
Não costumo me dedicar muito à pesquisa antes de iniciar uma obra de ficção. Mas sempre faço anotações, antes ou durante seu andamento. Não acho difícil começar um livro ou um roteiro. Pelo contrário, quando a história começa a incomodar na cabeça, querendo pular para fora, o difícil é não começar.
Como você lida com as travas da escrita, como a procrastinação, o medo de não corresponder às expectativas e a ansiedade de trabalhar em projetos longos?
Não tenho problemas com procrastinação ou travas. Escrever me dá prazer, tenha ou não qualidade aquilo que escrevo. Então, a coisa anda ao natural, sem muita dificuldade. Tempos atrás, já me preocupei mais em corresponder expectativas, embora a dificuldade para se conseguir uma editora nas condições atuais ainda me inquiete bastante. Mas, como disse, escrevo por prazer e isso me blinda um pouco contra a ansiedade.
Quantas vezes você revisa seus textos antes de sentir que eles estão prontos? Você mostra seus trabalhos para outras pessoas antes de publicá-los?
Isso, sim. Reviso muito, incansavelmente. Inclusive, destaco com cores todos os trechos revisados, alterados ou pendentes para novas revisões, até ficar satisfeito. A primeira revisão eu marco em vermelho, a segunda em amarelo e assim por diante até chegar ao verde, o mais próximo do ideal. Depois procuro esquecer o texto, me afastar dele. Deixo-o em processo de decantação, por um tempo, para que as impurezas remanescentes baixem e eu possa, a partir de uma certa distância, identificá-las com mais apuro.
Mostro a profissionais de confiança, para pessoas cuja atividade seja essa, ler originais, dar opinião e cobrar um valor pelo trabalho. Assim, a relação fica estritamente profissional, sem o risco de ser levada para o lado pessoal, tanto de um lado como de outro.
Como é sua relação com a tecnologia? Você escreve seus primeiros rascunhos à mão ou no computador?
Sempre no computador. Escrevi meus três primeiros livros na máquina e até hoje não entendo como consegui essa façanha. Mas faço anotações à mão quando tenho uma ideia e estou longe do computador, num restaurante, por exemplo. Mas só nessas situações.
De onde vêm suas ideias? Há um conjunto de hábitos que você cultiva para se manter criativo?
Sou um observador obsessivo. Tiro inspiração do quotidiano, nem poderia ser diferente. Sou como o fotógrafo diante de uma paisagem, sempre imaginando que aquilo, de um determinado ângulo, pode dar uma boa foto. De uma conversa no caixa do supermercado, de um diálogo ao telefone, de uma discussão no trânsito, sempre se pode tirar uma frase, uma cena que vai render depois.
O que você acha que mudou no seu processo de escrita ao longo dos anos? O que você diria a si mesmo se pudesse voltar à escrita de seus primeiros textos?
Alguns dos meus primeiros livros talvez hoje eu não publicasse da maneira como foram publicados. Diria a mim mesmo para não ter pressa. Quanto ao processo de escrita, acho que não mudou muito, a não ser a experiência natural que a gente vai ganhando ao longo da vida, em todos os sentidos. Isso, certamente, se reflete naquilo que escrevemos.
Que projeto você gostaria de fazer, mas ainda não começou? Que livro que você gostaria de ler e ele ainda não existe?
O meu sonho seria escrever livros e publicá-los em condições de viver deles, da literatura, levando em conta uma população com hábito de leitura e a consequente valorização de quem escreve. Livros que nos dão pleno prazer existem muitos, para todos os gostos. O que nos falta não é esse livro supostamente inexistente, mas condições ideais para que as pessoas possam chegar a ele.