Sulema Mendes de Budin é escritora.
Como você começa o seu dia? Você tem uma rotina matinal?
Não sei se chega a ser uma rotina, porque faço o mesmo escrevendo ou não. Quando estou escrevendo, começo imediatamente depois do café, que é a minha principal refeição. Antes do café, tomo banho. Termino de acordar debaixo do chuveiro (frio no verão, quente no inverno).
Em que hora do dia você sente que trabalha melhor? Você tem algum ritual de preparação para a escrita?
À noite. Embora escrever demande disciplina. Com ou sem inspiração, o texto deve seguir. Escrevo sempre ouvindo música clássica. De Beethoven a Vivaldi e Haydn, dependendo da intensidade de emoção das cenas.
Você escreve um pouco todos os dias ou em períodos concentrados? Você tem uma meta de escrita diária?
Não tenho meta diária. Quando escrevo o tempo desaparece. É como se eu passasse a porta para outra dimensão. Por isso, fico incapaz de exercer qualquer atividade que não seja escrever e escrever, além do cansaço. Como um transe que se prolonga até o final. E esse final pode durar por mais duas mil páginas escritas à mão durante um mês e meio (427 impressas em Chagas, O Cabra, meu primeiro romance).
Como é o seu processo de escrita? Uma vez que você compilou notas suficientes, é difícil começar? Como você se move da pesquisa para a escrita?
Sempre pesquiso antes, seja qual for o tema e a forma. E busco fontes sérias. Feita a pesquisa, começar flui naturalmente. Imaginação e realidade se juntam e se completam.
Como você lida com as travas da escrita, como a procrastinação, o medo de não corresponder às expectativas e a ansiedade de trabalhar em projetos longos?
Quando a escrita trava eu exercito a disciplina e sigo escrevendo nem que seja para, depois, abandonar aquela parte do texto. Nunca tive medo de não corresponder às expectativas dos leitores. Como romancista meus projetos sempre foram longos. É evidente que ninguém escreve para si, fora as anotações de compromissos nas agendas e reflexões nos diários (fiz poucas tentativas neste sentido). Escrevo para ser lida. Mas não com foco no que vai agradar ou desagradar o público.
Quantas vezes você revisa seus textos antes de sentir que eles estão prontos? Você mostra seus trabalhos para outras pessoas antes de publicá-los?
Sou muito exigente com o português e a forma. Reviso várias vezes o texto nesse sentido. Tomo algumas liberdades com a língua. Por exemplo, uso a palavra “poeta” em lugar de “poetisa”. Faço isso porque conheço a forma gramatical correta. Não mostro meus textos para ninguém, além dos editores. E não permito que mudem uma vírgula, sem o meu consentimento.
Como é sua relação com a tecnologia? Você escreve seus primeiros rascunhos à mão ou no computador?
Não faço rascunhos. Sempre escrevi melhor à mão. Até hoje, meu cérebro e imaginação estão diretamente ligados à mão direita. Porém, aprendi a lidar e a conviver bem com a tecnologia. Estou respondendo esta entrevista direto no computador. Mas para redigir um poema, só manuscrito.
De onde vêm suas ideias? Há um conjunto de hábitos que você cultiva para se manter criativa?
Minhas ideias surgem da imaginação, às vezes diante de fatos reais. Sou excessivamente criativa. Tenho que manter a minha imaginação de rédeas curtas. Essa criatividade ajuda muito além da literatura, na própria vida real.
O que você acha que mudou no seu processo de escrita ao longo dos anos? O que você diria a si mesma se pudesse voltar à escrita de seus primeiros textos?
Posso responder a essa pergunta porque escrevi duas teses. Na verdade, uma tese e um TCC. A tese foi para um Seminário de Direito Comparado, quando estava no quinto ano da Faculdade (sou advogada) e o TCC quando completei o MBA de Gestão Ambiental na FGV/RJ.
O tema da tese foi A Inconstitucionalidade da Lei que Estabeleceu a Censura Prévia. Pela Liberdade de Manifestação do Pensamento, que me valeu uma Bolsa de Estudos do governo americano.
O tema do TCC foi A Importância do Saneamento Básico para a Vida e a Saúde Pública.
Respondendo à pergunta, o que mudou não foi o meu processo de escrita, mas os temas que passei a abordar. Por muitos anos deixei a literatura e passei a exercer o meu ofício pelas causas ambientais e, ultimamente, política (política de cidadania). Cabe aqui um esclarecimento. Minha cabeça é livre. Não tenho nem jamais me submeti a ideologias, o que me leva a levar pauladas de todos os lados. E o meu partido é o Brasil.
Que projeto você gostaria de fazer, mas ainda não começou? Que livro você gostaria de ler e ele ainda não existe?
Escrever A Saga, um romance longo, em vários volumes, contando as histórias da minha família desde as origens, até o meu tempo. Se fosse possível, eu gostaria de ler mais um livro de Rilke, como as Elegias de Duino, obviamente psicografado!