Sonia Nabarrete é jornalista e escritora, autora de Eretos e Contos Safadinhos.
Como você começa o seu dia? Você tem uma rotina matinal?
Gosto de escrever pela manhã, logo após tomar café, antes mesmo de ler as notícias do dia, abrir e-mails e redes sociais. É nesse momento que as ideias surgem, o texto flui e consigo produzir bastante. Dou prioridade aos trabalhos profissionais – revisão ou produção de textos – e só então me dedico à literatura. A manhã também é o período em que costumo revisar textos escritos no dia anterior.
Em que hora do dia você sente que trabalha melhor? Você tem algum ritual de preparação para a escrita?
Por ter trabalhado em redações, dou conta de escrever a qualquer hora e em qualquer lugar, mas sinto que a minha produção é melhor nas primeiras horas da manhã, em minha casa, tendo a companhia apenas do meu cachorro, o Gil, e nada ligado (rádio, TV, som). Amo música, mas na hora de escrever, prefiro o silêncio.
Você escreve um pouco todos os dias ou em períodos concentrados? Você tem uma meta de escrita diária?
Procuro escrever todos os dias, seja o capítulo de um romance, um conto, uma crônica ou um poema. Acho importante exercitar a escrita. Gosto de trabalhar com prazos. Quando eles não existem, crio um cronograma e procuro cumprir. Essa disciplina é bastante salutar. Se ficar esperando por momentos de inspiração, os projetos acabam sendo “empurrados com a barriga” e não saem. Quando estou em oficinas de escrita criativa, faço os exercícios tão logo sejam passados. Gosto de ser desafiada.
Como é o seu processo de escrita? Uma vez que você compilou notas suficientes, é difícil começar? Como você se move da pesquisa para a escrita?
Se vou escrever uma reportagem, em geral colho todas as informações e escrevo. Mas, quando a matéria envolve várias fontes, vou inserindo as informações à medida em que faço as entrevistas. Esse processo, eu também adoto na literatura: escrevo e pesquiso simultaneamente. Na minha novela Eretos, por exemplo, um personagem havia sido torturador na ditadura militar brasileira e só quando ele entrou na história, pesquisei os métodos de tortura usados na época. Não planejo o que vou escrever. Já escrevi romances começando pelo meio ou pelo final. Escrevo capítulos aleatoriamente e depois edito.
Como você lida com as travas da escrita, como a procrastinação, o medo de não corresponder às expectativas e a ansiedade de trabalhar em projetos longos?
Poucas vezes tenho travas, mas, quando aparecem, faço algo diferente. Saio para fotografar, dou uma volta com o cachorro, cuido das plantas, assisto a um filme, faço alguma atividade artesanal, como colagens. Não costumo procrastinar. Apenas deixo de escrever se tiver alguma questão inadiável para tratar. Não tenho medo de não corresponder às expectativas. Escrevo porque é visceral, não pretendo agradar a ninguém. Meus textos são eróticos, com um toque de humor, mas sempre dentro de uma visão feminina e feminista. Nada de chicotes, algemas ou príncipes encantados. Não ganho dinheiro com literatura, então me dou o direito de escrever o que dá prazer. E acredito, sim, que é possível fazer literatura com qualidade em qualquer gênero. Embora me sinta mais à vontade ao escrever textos eróticos, também transito por outros gêneros. Escrevi um romance juvenil inédito que aborda a questão do racismo e tenho me dedicado à produção de contos e poemas de ficção futurista. Encaro bem projeto longos, desde que tenham um prazo para serem realizados.
Quantas vezes você revisa seus textos antes de sentir que eles estão prontos? Você mostra seus trabalhos para outras pessoas antes de publicá-los?
Reviso meus textos “trocentas” vezes e a cada vez, faço ajustes. Só paro quando seguem para publicação. Conto com algumas pessoas que fazem a leitura crítica do que escrevo e têm total liberdade para se manifestar.
Como é sua relação com a tecnologia? Você escreve seus primeiros rascunhos à mão ou no computador?
Tirando micropoemas e microcontos, que às vezes escrevo à mão, faço tudo diretamente no computador. Venho de um geração de jornalistas que usava a máquina de escrever, sempre usei teclados.
De onde vêm suas ideias? Há um conjunto de hábitos que você cultiva para se manter criativa?
As ideias para escrever um conto, um poema ou um romance, vêm da vida: pode ser uma lembrança, uma história que alguém contou, uma cena vista na rua, uma notícia de jornal, uma sensação, mas também pode ser algo apenas imaginado. Quase sempre, eu parto de uma situação real, mas invento todo o resto. Para manter a criatividade, leio muito, participo de oficinas e de coletivos literários, como o KriptoKaipora, que reúne escritores de ficção futurista. Acho importante, também, aprender sempre algo novo e desenvolver habilidades que não estejam relacionadas à escrita.
O que você acha que mudou no seu processo de escrita ao longo dos anos? O que você diria a si mesma se pudesse voltar à escrita de seus primeiros textos?
Escrevo ficção desde os 15 anos, embora só tenha me mostrado na maturidade, quando, incentivada por uma amiga, a escritora Nanete Neves, participei e fui classificada em um concurso literário em 2012. Se pudesse voltar atrás, diria a mim mesma: “Solta a franga, menina!”.
Que projeto você gostaria de fazer, mas ainda não começou? Que livro você gostaria de ler e ele ainda não existe?
Pretendo continuar participando de antologias sobre os mais diversos temas e tenho vontade de escrever um livro infantil. Ainda sonho, também, em fazer um livro de fotos autorais com legendas poéticas. Esse projeto é antigo, mas vem sendo adiado porque o custo é bastante alto. Só seria viável com patrocínio.
Gostaria de ler mais livros de mulheres. A participação feminina no mercado editorial brasileiro ainda é pequena, apesar dos inúmeros talentos que temos.
Manter um trabalho autoral no Brasil não é fácil, mas sou teimosa. Se conseguir tocar uma só pessoa, com um texto ou uma foto, já valeu a pena.