Rogério Silva é jornalista, professor universitário, diretor da afiliada Record no Triângulo Mineiro (TV Paranaíba) e o departamento de jornalismo da Rádio Educadora FM.
Como você começa o seu dia? Você tem uma rotina matinal?
Bom, não há mais a rotina de correr até o jardim e buscar o jornal impresso atirado pelo entregador. Crescemos assistindo a essa cena. Mas não existe mais. Tampouco sentar-se à mesa do café folheando páginas e mais páginas. Cabe tudo na palma da mão e essa alimentação de notícias é o tempo inteiro. Claro que após seis a sete horas de sono a gente acorda achando que perdeu algum capítulo da história da vida real. Mas isso é ansiedade comum de jornalista.
Abro o celular que cai direto no feed de notícias mais relevantes, de acordo com meus hábitos de leitura e ele me dá um cardápio dos periódicos mais relevantes, com assuntos locais, nacionais e internacionais. De dez a quinze minutinhos antes mesmo de escovar os dentes já me considero bem informado com todas aquelas notícias, que na maioria das vezes, estragam o nosso humor. Mas é do jogo, é da profissão. Impossível livrar-se disso.
Em que hora do dia você sente que trabalha melhor? Você tem algum ritual de preparação para a escrita?
Acho que cabe esclarecer que não sou um escritor profissional. Isso é apenas o meu lazer, um hobby. Como não tenho compromisso fixo com nenhum jornal ou revista, escrevo quando o momento merece. O leitor pode entender que o meu manifesto é uma reflexão sobre o tema ou apenas a expressão do meu ponto de vista. E, claro, ele tem o absoluto direito de concordar ou discordar, sobretudo na pauta política, que em geral exploro.
Quando me dediquei a escrever “O Mundo Maravilhoso…” costumava dedicar minhas manhãs, antes do expediente na emissora, para o livro. Foi um trabalho de organização de artigos mais relevantes, publicados de 2010 a 2018. Alguns precisaram passar por revisão, outros apenas por contextualização, a fim de oferecer registros históricos que fossem interessantes ao leitor.
Nunca pensei no momento da escrita como um “ritual”. Leio e escrevo o dia inteiro, dado meu cotidiano com o jornalismo de televisão e rádio. Então eu começo a escrever, paro pra ver uma notícia, me atualizo de algo, atendo uma ou outra pessoa, volto a escrever. Pra mim, funciona.
Você escreve um pouco todos os dias ou em períodos concentrados? Você tem uma meta de escrita diária?
Acho que a resposta anterior contempla parte dessa pergunta. Quanto a metas, isso só me diz respeito quando me comprometo com os prazos de fechamento de edições. As revistas canadenses Brazilian Wave e Senso, por exemplo, são publicadas mês a mês. Então, tenho datas estipuladas para a entrega dos textos. Como o cenário político é extremamente dinâmico, deixo para escrever na véspera ou bem próximo do deadline a fim de deixar o texto mais atual possível.
Como é o seu processo de escrita? Uma vez que você compilou notas suficientes, é difícil começar? Como você se move da pesquisa para a escrita?
Todo começo é difícil. Todo. Eu trabalho com artigos de 3500 caracteres, uma espécie de padrão para o impresso. Tem de haver uma explosão, a faísca que incendeia o ímpeto do jornalista. Ferreira Gullar falava em espanto: “…tem de haver espanto, não se faz poesia a frio”, dizia.
Portanto se algo incomoda, parece estranho, fora dos parâmetros de normalidade, há relevância para que eu reaja e me manifeste. Começa então o trabalho de apuração, com pesquisa de publicações sobre o assunto de diferentes ângulos. Comparo-os a fontes históricas ou oficiais. E esboço minha opinião, buscando carregar uma “legião de seguidores” para o meu raciocínio. Não é fácil, mas dá gosto de fazer.
Como você lida com as travas da escrita, como a procrastinação, o medo de não corresponder às expectativas e a ansiedade de trabalhar em projetos longos?
Não gosto de chamar de “medo”. É o entendimento de cada um de lidar com suas limitações. Sou um escritor conciso. Se posso dizer algo em 3 palavras, por que usar 5? Trabalho com a construção do raciocínio rápido, permeando fatos e confrontando-os – real ou metaforicamente – com o que deveriam ser. E não o são. Escolhi a crônica talvez inspirado pelo Fernando Sabino, em “O Homem Nu”, uma das minhas primeiras leituras ainda adolescente. Fascinou-me ler histórias completas em meia dúzia de páginas. Largar o livro num canto e tomá-lo de volta à hora que quisesse para ler uma outra coisa, sem comprometimento nenhum da linha de raciocínio.
Sobre corresponder ou não à expectativa do outro, isso em nada me inquieta. Temas espinhosos estimulam o contraditório.
Quantas vezes você revisa seus textos antes de sentir que eles estão prontos? Você mostra seus trabalhos para outras pessoas antes de publicá-los?
Texto tem que dormir. Eu escrevo, esqueço dele, releio no dia seguinte, limpo os exageros, aparo os absurdos e mando pra publicação, mas jamais sem antes compartilhá-lo com uma boa alma que o critique. Um dos meus maiores “confidentes”, se assim posso chamá-lo, é o jornalista Alexandre Leal. Ele me chama ao Planeta Terra sempre que necessário e me faz acordar quando viajo demais nas elucubrações ou carrego muito na tinta. O Leal é um bom exemplo, pois não é admirador, é crítico por natureza. E o faz com vontade, às vezes até dói. Mas só presta assim, com sofrimento. Santo Agostinho dizia: “Prefiro os que me criticam porque me corrigem. Os que me elogiam me corrompem”.
Como é sua relação com a tecnologia? Você escreve seus primeiros rascunhos à mão ou no computador?
Não uso mais a caligrafia há muitos anos. Tudo no computador.
De onde vêm suas ideias? Há um conjunto de hábitos que você cultiva para se manter criativo?
Como mencionei anteriormente, dos fatos cotidianos. Escândalos, mazelas da sociedade, da indignação com os absurdos do dia a dia.
O que você acha que mudou no seu processo de escrita ao longo dos anos? O que você diria a si mesmo se pudesse voltar à escrita de seus primeiros textos?
Já rasguei muito papel, abusei da tecla “delete”. Sou meu maior crítico. O ser humano é uma “metamorfose ambulante” e é bom que seja assim, do contrário não haveria evolução. Mas entendo que tudo tem seu tempo. Não tenho vergonha do que fui e nem das ideias que cultivei, apenas não concordo mais com muitas delas. Heróis que adorei traíram a minha confiança e levaram pelo ralo as convicções que compartilhavam comigo. Tranquilo. Sem traumas maiores.
Que projeto você gostaria de fazer, mas ainda não começou? Que livro você gostaria de ler e ele ainda não existe?
Tenho muita, mas muita vontade de escrever um romance. A história de um homem que quer ter controle absoluto de seu destino, que não permite que nada interfira nos seus planos e não quer esperar pelo acaso do fim. Quer, ele mesmo, definir o dia em que tudo terminará. Se ele vai manter-se firme nos seus propósitos ou se cederá, isso nem eu sei ainda.