Rodrigo Luiz Pakulski Vianna é poeta, autor de “Textos para lembrar de ir à praia” (2020).

Como você começa o seu dia? Você tem uma rotina matinal?
Eu costumo acordar cedo. Mesmo aos fins de semana, cerca de 6h30, 7h já estou de pé. Entre as burocracias de louça, ajeitar a casa, recolher o lixo, preparar café, tomar banho, procuro escutar um podcast ou música. Tudo culmina no ato de regar as plantas. Daí, já é hora de trabalhar. Ou, aos fins de semana, ler um pouco, escrever, ir à feira.
Em que hora do dia você sente que trabalha melhor? Você tem algum ritual de preparação para a escrita?
Não tenho muito um ritual. Descontada a questão da pandemia, gosto de me deslocar para escrever, andar pela cidade, ou até um ponto em que possa parar. Ao longo dos dias “úteis”, é quando dá tempo: no caminho pro trabalho, anoto uma ideia, um verso; ouvir uma música e ter uma ideia. Ao estar fazendo um trabalho, abrir o bloco de notas rapidinho.
Aos fins de semana, levava um caderno e um livro para um parque, uma biblioteca, um café, sentava no asfalto da Paulista. Observar o mundo e ir trabalhando coisas na cabeça, anotando pontos rápidos no celular. Ir editando tudo depois de um tempo.
Neste sentido, não tem muito um horário. Embora eu perceba que, à noite, escrevo e edito pior, em virtude do cansaço acumulado.
Você escreve um pouco todos os dias ou em períodos concentrados? Você tem uma meta de escrita diária?
A meta é escrever algo. Nem sempre se cumpre a meta. Em virtude de trabalho, faculdade e seus trabalhos para entregar, cursos, aulas pra dar, etc., é tudo quando dá. E, a partir disso, é inventar uns momentos para fazer valer. É ir rabiscando na hora do almoço, inventar um verso lendo um livro, é no deslocamento, tomando café, no banho. Isto tem suas desvantagens, mas, ao mesmo tempo, mantém o ouvido ligado pras possibilidades do cotidiano. Quando percebo que tem alguma coisa meio acumulada, procuro separar umas horas no fim de semana para tentar editar, que é boa parte do meu trabalho criativo.
Como é o seu processo de escrita? Uma vez que você compilou notas suficientes, é difícil começar? Como você se move da pesquisa para a escrita?
Eu procuro ouvir, ficar atento. Daí, quando me deparo com algo, algum som, imagem que me desperte, anoto; deixo guardado um tempo. Como procuro manter sempre um processo de escrita ativo, acho mais difícil “terminar”. O começar é constante. O editar é longo. A pesquisa pode ser observar algo, ver um instante e estalar com algo que possibilite a palavra; ler uma frase num livro, numa notícia; ficar segurando e ruminando uma palavra ao longo do dia.
Como você lida com as travas da escrita, como a procrastinação, o medo de não corresponder às expectativas e a ansiedade de trabalhar em projetos longos?
Procuro entender meu tempo. Há períodos em que é necessário deixar o corpo descansar, deixar os textos descansarem. Até porque creio que o processo de edição exija um cuidado e um espaço de atenção que não combinam com cansaço e estresse. Neste sentido, a procrastinação entra como uma ferramenta para entender melhor o texto também; porque eu posso não estar com o poema na minha frente, mas sigo dissecando o que pode estar de errado, o que eu gosto que ainda me mantém voltando pra ele. Mas aqui estou falando da minha escrita poética. Pro trabalho, o prazo é o senhor da razão. É sentar na frente do computador e fazer o melhor que dá.
Já, em relação às expectativas, é uma questão complicada. Não existe muita matemática do que é “bom”, “certo”, “melhor” em poesia. Então, há, sim, uma expectativa de que aquilo que eu produzo seja bem aceito. Entretanto, também existe a certeza de que há inúmeros canais e projetos de poesia, gostos pessoais que interferem, referencial diferente e que muita gente não vai gostar e outros vão, em alguma medida.
Aqui, um caso pessoal. Meu primeiro livro é fruto de uma premiação; ou seja, acreditei o suficiente para enviá-lo e passou por um júri conceituado. E, ainda assim, há insegurança sobre o material presente. Acho que é um movimento natural de que algo tão pessoal, produto de tanto esforço e dedicação seja bem quisto. Também há o fato de que amanhã eu posso olhar novamente para um destes poemas e “hm, tal palavra seria melhor”, “aquela quebra poderia ser diferente”, como já aconteceram tantas vezes.
Quantas vezes você revisa seus textos antes de sentir que eles estão prontos? Você mostra seus trabalhos para outras pessoas antes de publicá-los?
Bah, muitas. Não tem número. Já mexi em poema publicado. Acho que nunca está ou estará pronto. Isso pode ser pesado, mas também dá uma liberdade e desapego. Saber que não é porque algo já foi publicado que não posso continuar lapidando. Como tenho comentado, boa parte do meu processo é edição, lapidação.
Isso não quer dizer que dá pra entregar qualquer coisa, pelo contrário. Apenas creio que também desmistifica um pouco a questão. O trabalho é contínuo. Amanhã, serei diferente e terei outras escolhas. E tudo bem! O importante é que aquele texto esteja satisfazendo seus parâmetros naquele instante.
Procuro mostrar, sim. Acho importante ouvir, entender outra perspectiva, que alguém aponte coisas que não vi, ou que tomam uma direção oposta ao que imaginei. Às vezes, é nesta troca que o poema se abre e revela seus caminhos. Acredito muito em oficinas de escrita por isto.
Como é sua relação com a tecnologia? Você escreve seus primeiros rascunhos à mão ou no computador?
O rascunho do gmail é um dos locais que mais rabisco. Mas também tenho cadernos. Acho muito bom a possibilidade de ter um objeto de fácil acesso e sempre à mão, como caderno/agenda/bloco ou o celular, para que uma ideia não se perca. Depois de um tempo, é ir passando para o editor de texto aos poucos. Neste movimento, já tem um certo distanciamento que possibilita edição, corte, descarte. O bom do editor de texto é a possibilidade de brincar com a espacialidade de um modo mais concreto. Sem contar que a simplicidade de testar coisas diferentes de forma rápida e compará-las também é algo muito encorajador para quem gosta de ficar mexendo (meu caso).
De onde vêm suas ideias? Há um conjunto de hábitos que você cultiva para se manter criativo?
Todas minhas ideias nascem no ouvido. Não à toa, o lugar que possui um labirinto no corpo. É de escutar e provocar os sons que nascem entre os choques de palavras. Então, é manter o ouvido aberto. E a criatividade também tem muito da prática. Quanto mais se lê e escreve poesia, mais afiado fica o processo de escrita.
O que você acha que mudou no seu processo de escrita ao longo dos anos? O que você diria a si mesmo se pudesse voltar à escrita de seus primeiros textos?
Bah, muita coisa. Quando comecei a escrever, ainda na faculdade, eu tinha uma outra relação com texto. Era mais explosivo e acreditava mais em manter a naturalidade de uma primeira escrita. Muito fruto da geração de blogs que surgiram naquela época, creio. Hoje, sou adepto da tesoura e também da agulha e linha.
Eu me diria: aproveita o caminho.
Que projeto você gostaria de fazer, mas ainda não começou? Que livro você gostaria de ler e ele ainda não existe?
Ganhar na mega sena, mas sigo não apostando. E fazer um livro com um haicai para cada dia do ano, mas isto exigiria um tempo de escrita diário que, infelizmente, não possuo (talvez se ganhasse na mega sena).
Tem tanto livro que existe e que ainda quero ler, é melhor deixar que surja naturalmente.