Rodrigo Lacerda é escritor, editor e tradutor, autor de “O Fazedor de Velhos” (Cia das Letras, 2008), “Outra Vida” (Cia das Letras, 2009) e “Reserva natural” (Cia das Letras, 2018).
Como você começa o seu dia? Você tem uma rotina matinal?
Começo meus dias fazendo exercícios. tive um problema de coluna sério faz uns anos, em parte provocados pelo hábito de passar horas e horas do dia sentado na frente do computador escrevendo. Depois tomo café e começo a escrever.
Em que hora do dia você sente que trabalha melhor? Você tem algum ritual de preparação para a escrita?
Gosto mais de trabalhar pela manhã, é a hora do dia em que o trabalho mais rende. Mas não há hora certa, qualquer hora é hora quando você está com a ideia na cabeça. Meu único ritual é estar sempre bebendo alguma coisa, mas nunca alcoólica. Chá, água com gás, Coca-Cola, alguma coisa para ocupar as mãos enquanto se para e pensa na palavra, na frase etc.
Você escreve um pouco todos os dias ou em períodos concentrados? Você tem uma meta de escrita diária?
Tento escrever todos os dias, mas nem sempre é possível. E não tenho metas quantitativas, de número de páginas, mas tenho pedaços da história ou do livro que quero completar e me dou um prazo, dez dias, quinze dias etc. Mas são apenas cenouras para você correr atrás, não há obrigação de completar a tarefa nesses prazos.
Como é o seu processo de escrita? Uma vez que você compilou notas suficientes, é difícil começar? Como você se move da pesquisa para a escrita?
Em geral não tomo muitas notas. Tenho uma ideia e começo a colocá-la no papel como dá. Acho que um pouco de improviso é importante, a espontaneidade fica impregnada no texto, creio eu. Em geral, o mais difícil é achar o tom do livro, a linguagem em que a narrativa se dará. Costumo variar muito de um livro para o outro essa voz narrativa. Em geral, começo pelo personagem principal, vendo como ele fala, como ele é, o que ele faz etc. Depois chego nas situações que eu pensei.
Como você lida com as travas da escrita, como a procrastinação, o medo de não corresponder às expectativas e a ansiedade de trabalhar em projetos longos?
Lido muito mal, é muito sofrido. Mas nunca paro inteiramente de escrever, pois por outro lado a escrita me faz muito bem psicológica e até fisicamente (afora o problema nas costas). Fico mais leve, mais feliz, mais animado, se estou escrevendo. Então, se travo em um livro, vou para outro, ou para alguma outra parte do mesmo livro, ou escrevo coisas menores, mas nunca paro de escrever.
Quantas vezes você revisa seus textos antes de sentir que eles estão prontos? Você mostra seus trabalhos para outras pessoas antes de publicá-los?
Reviso infinitas vezes. Enquanto não vai para a gráfica, não consigo parar. É um processo bastante neurótico, por um lado. Por outro, é natural que seja assim, pois sempre dá para melhorar alguma frase, algum parágrafo, ou para reforçar a emoção de alguma cena. Gostaria de ter leitores de confiança, mas a verdade é que não os tenho. Faço cerimônia, fico sem graça de pedir. É muito chato ler coisas ainda não publicadas, eu sei porque sou editor e entendo que as pessoas não gostem. É diferente mesmo. Mas minha mulher costuma ler tudo o que escrevo antes de ser publicado, é a única vítima.
Como é sua relação com a tecnologia? Você escreve seus primeiros rascunhos à mão ou no computador?
Escrevo tudo sempre no computador. Nenhum problema com a tecnologia nesse aspecto. Mas, como dizia o João Ubaldo Ribeiro, a facilidade de mexer no texto, quando você trabalha no computador, é tanta que às vezes fica fácil passar do ponto. Continuar mexendo e acabar piorando o que já estava no ponto. Quando vejo que estou fazendo isso, aí sim dou uma parada na neurose e dou um tempo antes de reler de novo e mexer mais! (risos)
De onde vêm suas ideias? Há um conjunto de hábitos que você cultiva para se manter criativo?
Não há uma fonte. As ideias vêm da vida, dos assuntos que lhe interessam, das pessoas à sua volta, dos livros e filmes que você leu ou assistiu, enfim, as ideias vêm de todos os lugares. Por isso, o hábito para se manter criativo é consumir todo o tipo de produto cultural (cinema, teatro, livros, música clássica ou popular, escultura, vídeo-arte etc.)
O que você acha que mudou no seu processo de escrita ao longo dos anos? O que você diria a si mesmo se pudesse voltar à escrita de seus primeiros textos?
Acho que a única novidade agora é que, pela primeira vez na vida, sinto que encontrei um assunto que teria vontade de explorar até o fim, um universo poético, digamos assim, que é a relação do homem com a natureza. Quando lancei meu último livro, um crítico usou a expressão bio-existencialismo, que talvez seja mesmo boa para descrever o caminho que estou seguindo no momento.
Que projeto você gostaria de fazer, mas ainda não começou? Que livro você gostaria de ler e ele ainda não existe?
Nesse caminho que comecei a seguir, estou escrevendo o romance que eu gostaria de ler, sobre essas questões que sobrepõem a natureza humana e a natureza em geral. Se vai ficar do jeito que eu imagino, aí é outro problema.