Raquel Almeida é escritora, poeta, fundadora do Sarau elo da Corrente.
Como você começa o seu dia? Você tem uma rotina matinal?
Depende do dia e o que tenho que fazer nele, não costumo acordar cedo se não tiver compromissos. Mas é de praxe levantar, tomar um café preto e ouvir musica sentada na porta de casa.
Em que hora do dia você sente que trabalha melhor? Você tem algum ritual de preparação para a escrita?
Não tenho rituais, acho. Eu prefiro escrever de noite. Acredito que se houver um ritual é passar o dia pensando no poema, no conto, ou na crônica, ou em qualquer coisa que me inquiete. Eu construo na minha cabeça e passo o dia escrevendo invisivelmente, se eu achar que vou esquecer anoto em algum lugar, caderno ou celular, num papel avulso, depois vou montando os Frankenstein.
Você escreve um pouco todos os dias ou em períodos concentrados? Você tem uma meta de escrita diária?
Não trabalho com metas, e depende dos dias de como são os dias.
Eu não sou uma maquina, já fugi das fabricas por isso…(rs) gosto de liberdade inclusive no meu processo de escrita, e me considero escrevendo o tempo todo tenho minhas viagens internas, crio, recrio, descrio. O ato de escrever pra mim não está somente ligado a caneta e papel, computador, maquina de escrever, o ato de escrever no meu ponto de vista está interligado com o meu cotidiano, e é vivenciando ele que eu concebo um poema, uma crônica, um conto ou os sem gêneros.
Como é o seu processo de escrita? Uma vez que você compilou notas suficientes, é difícil começar? Como você se move da pesquisa para a escrita?
Acho que respondi um pouco disso na pergunta anterior. Ser independente me permite não ter que ficar desesperada pra escrever qualquer coisa a qualquer hora ou publicar sempre. Meu primeiro livro o “Duas Gerações Sobrevivendo no Gueto”, foi feito em parceria com outra poeta que frequentava o sarau que organizo, eu tinha um compilado de escritos muitas coisas que guardava desde a adolecência, selecionei os menos piores e publiquei. O segundo livro ja foi gerado com mais cuidado, tinha coisas de muito tempo, mas ali ja começou a despontar outro estilo, outra Raquel, o que me fortaleceu pra continuar pensando a escrita como um campo possível no meu universo. Se eu pensar num terceiro livro agora terá muitas bagagens de escrita e leitura. É sempre difícil pensar num trabalho escolher o que entra o que sai, a minha dificuldade é em criar títulos eu gasto tempo com isso, muito raramente o título vem de primeira mão quase nunca começo uma escrita pelo título.
Apesar de ser não encaro minhas leituras como pesquisas, gosto de ler gente que me inspira e quando estou num processo de escrita que se desencadeie num livro leio quase nada que eu me identifique ou irá influenciar minha escrita, isso para que que ela seja livre, e que tenha características próprias.
Como você lida com as travas da escrita, como a procrastinação, o medo de não corresponder às expectativas e a ansiedade de trabalhar em projetos longos?
Como uma coisa natural, mas dói. Procrastinar deve ser a maldição do escritor.
Em relação a expectativa, eu aprendi ao longo dos meus processos que escrevo muito mais pra por mim do que pra qualquer outra pessoa, ha quem chame de processos de cura, de auto reconhecimento, eu chamo de processo anti loucura, eu preciso desse escape. Se as pessoas se identificam é uma consequência gostosa, é bom ter retornos, ouvir elogios, a gente gosta. Lidar com a minha expectativa que é terrível, eu preciso me agradar primeiro antes de por na rua, se eu consigo fazer isso a expectativa externa não me incomoda.
Quantas vezes você revisa seus textos antes de sentir que eles estão prontos? Você mostra seus trabalhos para outras pessoas antes de publicá-los?
Não sei quantas vezes. Sei que são muitas, muitas mesmo. Eu gosto de deixar a escrita descansar também, depois de um tempo voltar nela, reler, trocar, manter, cada leitura é uma possibilidade. Mostro sempre pra outras pessoas isto é essencial. Gosto das trocas, das reações, dos pitacos…
Como é sua relação com a tecnologia? Você escreve seus primeiros rascunhos à mão ou no computador?
Sempre a mão, mantenho cadernos, muitas folhas soltas entre livros. O celular tem sido uma ferramenta pra escrita não posso negar, mas prefiro escrever no papel sem duvidas.
De onde vêm suas ideias? Há um conjunto de hábitos que você cultiva para se manter criativa?
Eu gosto de ouvir o mundo, ouvir as mulheres da minha família, as crianças, o pessoal no ônibus, ouvir musicas, me ouvir e ouvir o silêncio. Assim me mantenho criativa.
O que você acha que mudou no seu processo de escrita ao longo dos anos? O que você diria a si mesma se pudesse voltar à escrita de seus primeiros textos?
Mudou o cuidado, principalmente em publicar.
E eu diria, seja livre e fuja dos rótulos.
Que projeto você gostaria de fazer, mas ainda não começou? Que livro você gostaria de ler e ele ainda não existe?
Eu penso que um dia vou querer escrever um romance.
O livro que queria ler e que talvez não exista é o livro que fale das mulheres e do povo preto sem ter que lembras dos troncos, chicotes, sequestros, massacres, desvio de caráter, etc… Um livro que sejamos retratados pela nossa beleza, felicidade e nossa humanidade.