Pedro Lago é poeta, editor e performer, autor de “Corsário” (2018).

Como você começa o seu dia? Você tem uma rotina matinal?
Anoto vagamente algum tipo de sonho que tenha tido antes que desapareça, porque muitas vezes esqueço logo depois que acordo. Quase nunca faço nada com essas anotações de sonhos, mas é um bom exercício de memória.
Em que hora do dia você sente que trabalha melhor? Você tem algum ritual de preparação para a escrita?
Não tenho horário de trabalho, mas ainda assim, prefiro me dedicar a qualquer coisa durante o dia. Não tenho ritual de preparação de escrita ou qualquer coisa do gênero. Talvez um pouco de silêncio, por outro lado, também gosto muito de escrever na rua, em cafés, por exemplo. Escrever é uma prática natural, orgânica, não acho que um “ritual de preparação” seja necessário, sinceramente não acredito nem um pouco nisso. Escrever tem mais a ver com necessidade e desejo, não importa o lugar.
Você escreve um pouco todos os dias ou em períodos concentrados? Você tem uma meta de escrita diária?
Sim. Ainda que apenas memórias cotidianas, gosto da prática diária, porém, sem meta, nem obrigação. Naturalmente há períodos mais férteis que outros, tudo depende do que se está vivendo.
Como é o seu processo de escrita? Uma vez que você compilou notas suficientes, é difícil começar? Como você se move da pesquisa para a escrita?
Dificilmente sei que vou escrever um poema até começá-lo, não compilo notas, não faço pesquisa, acho a memória mais importante, ou pelo menos essa ideia de memória que se condensa num poema, uma espécie de memória insuportável que abrange tudo no corpo.
Como você lida com as travas da escrita, como a procrastinação, o medo de não corresponder às expectativas e a ansiedade de trabalhar em projetos longos?
“Trava de escrita” é um termo bem relativo, porque pode ter a ver com a pressão que você mesmo se impõe. Por isso é importante o exercício diário, natural, não deixar a escrita chegar num ponto em que necessite de um ritual, por exemplo. Você vai escrever muitos poemas ruins antes de escrever um que considere bom, e esses tidos como ruins são fundamentais, essenciais diria.
Corresponder expectativas não faz o menor sentido para mim, deixar de se preocupar com isso é uma libertação. Acho que a maior medida que se tem é você mesmo, quando um poema está pronto, sabe-se logo.
Quantas vezes você revisa seus textos antes de sentir que eles estão prontos? Você mostra seus trabalhos para outras pessoas antes de publicá-los?
Acho interessante deixar o poema dormir alguns dias para depois relê-lo e consequentemente mexer em alguma coisa. Quase sempre há coisas a serem feitas, uma palavra que entra outra que sai, às vezes o poema está dentro de um maior, por isso acho importante o desapego, sobretudo quando em processo de edição, por exemplo.
Leio para mim antes, em voz alta, depois para amigos, poucos amigos com quem mantenho um diálogo constante.
Como é sua relação com a tecnologia? Você escreve seus primeiros rascunhos à mão ou no computador?
Escrevo poema sempre à mão, sempre. Quando raramente escrevo prosa, aí sim, escrevo no computador, talvez pela particidade, pelo tamanho, porém, muitos poemas, quando os digitalizo, sofrem alguma mudança, sobretudo na forma. Decidir que o poema está definitivamente pronto, a ponto de ser publicado é um processo interessante.
De onde vêm suas ideias? Há um conjunto de hábitos que você cultiva para se manter criativo?
Ler é fundamental. Ler muito. Ler tudo. Reler. Lembro de uma coisa que o Guilherme Zarvos me disse quando estava começando sobre ler tudo que puder, esquecer de tudo e aí sim, escrever. Talvez faça isso até hoje, mas não penso mais.
O que você acha que mudou no seu processo de escrita ao longo dos anos? O que você diria a si mesmo se pudesse voltar à escrita de seus primeiros textos?
O corpo mudou. A percepção de mundo, a experiência, coisas óbvias mas que quando você se dá conta, é fascinante. Não diria nada. Os primeiros poemas, o primeiro livro, sempre há uma inocência, uma espécie de ingenuidade que nunca mais volta, bons ou não, esse lugar é muito raro. Só escrevo como escrevo hoje porque passei por esses lugares, e fico mais curioso para saber o que farei amanhã, ano que vem, daqui a dez anos, se estiver vivo e o mundo existir ainda.
Que projeto você gostaria de fazer, mas ainda não começou? Que livro você gostaria de ler e ele ainda não existe?
Queria ler todas as tragédias do Eurípides que não chegaram até nosso tempo. Tenho certeza que devem existir cópias escondidas naquela biblioteca do Vaticano, já até mandei e-mail para lá pedindo, mas eles não me responderam.