Pedro Henrique Neschling é escritor, diretor e ator, autor de Gigantes e Supernormal (Paralela).
Como você começa o seu dia? Você tem uma rotina matinal?
Costumo acordar junto com minha filha. Passo as primeiras horas do meu dia junto com ela, isso é minha prioridade hoje.
Em que hora do dia você sente que trabalha melhor? Você tem algum ritual de preparação para a escrita?
Quando era mais novo gostava de escrever à noite, era natural para mim virar a madrugada. Há alguns anos já vinha mudando isso, buscando trabalhar mais durante o dia, até que o nascimento da Carolina radicalizou essa inversão. Hoje trabalho em horários diurnos convencionais para poder estar com ela de manhã e durante o fim do dia.
Não tenho nenhum ritual de preparação para começar, mas hoje em dia dificilmente trabalho em casa. Sinto essa necessidade de mudar de energia para concentrar no trabalho e torná-lo mais produtivo.
Café. Café faz parte do meu ritual.
Você escreve um pouco todos os dias ou em períodos concentrados? Você tem uma meta de escrita diária?
Depende do projeto em que estou envolvido. Em meus dois romances, sim, me impus metas diárias de escrita e a consistência de produzir ininterruptamente durante o processo de escrita da primeira versão do texto. Não foi fácil. Alguns dias não alcançava o objetivo, muitas vezes terminava terrivelmente decepcionado com a qualidade do que escrevi, algumas vezes preferia sapatear no prego do que abrir o computador. Mas aí que tem que entrar o trabalho mental de seguir firme na rota.
Já em roteiros o processo é totalmente diferente e me adapto ao formato do projeto — se estou escrevendo sozinho ou com parceiros, o estágio em que se encontra a história quando começo a trabalhar nela, entre outras coisas.
Como é o seu processo de escrita? Uma vez que você compilou notas suficientes, é difícil começar? Como você se move da pesquisa para a escrita?
De novo, acho difícil dar uma resposta padrão. Depende do projeto. Em “Gigantes” eu sabia apenas que gostaria de falar sobre o amadurecimento de cinco amigos de colégio. Tinha a cena inicial e mais nada. Rascunhei cinco breves perfis dos personagens e parti para a escrita. O processo todo durou quarenta e cinco dias. Depois vieram as revisões mas tudo me pareceu simples. Já no “Supernormal”, estruturei bem a história antes de começar. Depois de iniciado o processo, senti falta de mais pesquisa e interrompi a escrita para voltar às entrevistas. Entre o momento que comecei a escrever o livro e o ponto final foram mais de dois anos.
Como você lida com as travas da escrita, como a procrastinação, o medo de não corresponder às expectativas e a ansiedade de trabalhar em projetos longos?
Não acredito em nenhum outro jeito de lidar com as inseguranças que não seja continuar trabalhando. Seguir em frente. Ignorar a vozinha na cabeça que pede pra gente desistir. Sobretudo em um romance, tem um momento que você acha que é louco. Que aquilo não vai servir pra nada. Que está jogando tempo fora. Vou dizer uma coisa: algumas das minhas “piores” sessões de escrita foram as que resultaram em capítulos que mais gosto dos meus trabalhos.
Quantas vezes você revisa seus textos antes de sentir que eles estão prontos? Você mostra seus trabalhos para outras pessoas antes de publicá-los?
Se depender de mim os revisarei para sempre. Envio o e-mail para meu editor com o arquivo finalizado e continuo revisando. É um trabalho insano que tende a virar TOC. É fundamental ter um prazo e alguém para dizer “chega”. Eu não consigo parar se depender só de mim.
Sim, gosto de enviar os textos para pessoas de confiança antes de publicá-los. Essas opiniões geralmente são muito valiosas e enriquecedoras para a versão final.
Como é sua relação com a tecnologia? Você escreve seus primeiros rascunhos à mão ou no computador?
Sempre no computador. Tenho um caderninho onde anoto frases, ideias, premissas. As vezes deixo ele com uma caneta ao lado da cama para não perder uma ideia que surja durante o sono. Mas escrever mesmo, é tudo no computador.
De onde vêm suas ideias? Há um conjunto de hábitos que você cultiva para se manter criativo?
Sobretudo das coisas que vivo, das histórias que me contam. Muitas vezes outras obras que vejo ou leio trazem a fagulha para uma outra leitura do tema. “Supernormal”, por exemplo, surgiu da vontade de fazer uma releitura de “Chasing Amy”, filme do Kevin Smith da década de 90.
O que você acha que mudou no seu processo de escrita ao longo dos anos? O que você diria a si mesmo se pudesse voltar à escrita de seus primeiros textos?
Passei a levar mais a sério o ofício. Esquecer a tal da “inspiração” (rá!) e acreditar no método. Sem falar que o nascimento da minha filha mudou minha vida inteira completamente. Hoje trabalho com mais organização, não tenho tempo a perder para dar conta de tudo que preciso fazer. Se eu pudesse dizer alguma coisa a mim mesmo antigamente seria “aproveita essa folga, garoto. As coisas vão mudar!”
Que projeto você gostaria de fazer, mas ainda não começou? Que livro você gostaria de ler e ele ainda não existe?
Não posso reclamar de falta de variedade de projetos. Tive a sorte de transitar em diversos formatos e gêneros e assim continuo fazendo. Difícil dizer algo que queira fazer e ainda não tenha começado. Prefiro dizer que torço para continuar tendo esse caminho multifacetado e estimulante que venho percorrendo.
Há muito para ler por aí. Não ouso dizer que algo não exista. Provavelmente eu é que não conheço ainda.