Paulo Vieira é Engenheiro Florestal e Professor de Literatura na Universidade Federal do Pará.
Como você começa o seu dia? Você tem uma rotina matinal?
Já escrevi livros em prosa, mas minha arte central é a poesia, o mundo dos poemas. E não há rotina, horário, momento pra isso, nem nos textos em prosa que escrevi isso foi levado em conta. Já escrevi poemas só na ideia, simplesmente porque eu estava em lugar “inadequado” para a poesia, sem papel, ou sossego, mas lutei, lutei. E depois de feitos, sem registrar na hora, perdi alguns (será?), salvei outros, poesia é esse caos perfeito.
Em que hora do dia você sente que trabalha melhor? Você tem algum ritual de preparação para a escrita?
O ócio criativo, a base da minha criação, pode ser a qualquer momento e em momento algum do dia. Sem ritual, a bruxaria acontece dia sim, dia não. Dia sim, dia-nunca-mais, depois, vaga chama, volta a fumegar o caldeirão. Depende muito mais das vontades da musa, essa volúvel…
Você escreve um pouco todos os dias ou em períodos concentrados? Você tem uma meta de escrita diária?
Como disse um dia uma estadista brasileira, quero sempre “dobrar a meta”, mas no fundo ultimamente mais tenho é dividido a meta por dez, por mil…
Como é o seu processo de escrita? Uma vez que você compilou notas suficientes, é difícil começar? Como você se move da pesquisa para a escrita?
Vejo que suas perguntas dão mais chances a um prosador de trazer respostas “úteis”, mas vamos lá. Às vezes o primeiro verso parte do vazio, da ideia nenhuma e traz alguma ideia, ou ao menos me arrasta na direção da ideia, daí os demais versos vão montando a paisagem até que se possa vislumbrar algumas formas, aí começo a modelar as árvores e as sensações, mas a coisa, a substância do poema, já se definiu sozinha. Mas, como eu disse, acontece assim às vezes. Pois há tantas veredas, de alguns poemas sinto, por exemplo, ao vê-los nascer, um gosto de não os ter escrito, como se tivessem nascido sozinhos, por conta própria, mas aí eu assino, só pra garantir.
Como você lida com as travas da escrita, como a procrastinação, o medo de não corresponder às expectativas e a ansiedade de trabalhar em projetos longos?
Não há expectativas além das minhas próprias e, se elas não são muito fáceis de serem correspondidas por um lado, por outro não são um problema. Um poeta escreve porque precisa, mas a poesia é uma arte difícil de realizar, a mais difícil. A tarefa, também por isso, é árdua e interminável e a satisfação de quem escreve os poemas poucas vezes se realiza, quase, plenamente.
Quantas vezes você revisa seus textos antes de sentir que eles estão prontos? Você mostra seus trabalhos para outras pessoas antes de publicá-los?
Reviso, refaço, reorganizo, recrio, retomo os poemas algumas dezenas de vezes até que sinto neles qualquer coisa de indiferença, qualquer coisa de sólido. As pessoas que leem meus poemas inéditos são cerca de dez amigos muito próximos.
Como é sua relação com a tecnologia? Você escreve seus primeiros rascunhos à mão ou no computador?
Faz quinze anos que só escrevo diretamente ao computador, muito raramente em papel.
De onde vêm suas ideias? Há um conjunto de hábitos que você cultiva para se manter criativo?
Ler e ler e ler literatura é um jeito eficaz de manter a criatividade. De onde as ideias vêm, não sei, mas gostaria de saber pra ir lá buscá-las direto na fonte.
O que você acha que mudou no seu processo de escrita ao longo dos anos? O que você diria a si mesmo se pudesse voltar à escrita de seus primeiros textos?
Depois de duas décadas sinto que abandonei o jeito acrobático de fazer os poemas, o apego a todas as formas para moldar o que me fazia sentir o gosto do moderno, e também para simplesmente brincar e jogar com as palavras. Hoje minha poesia está muito mais ligada ao discurso, embora a forma ainda importe e, claro, o brincar também.
Que projeto você gostaria de fazer, mas ainda não começou? Que livro você gostaria de ler e ele ainda não existe?
Às vezes tenho vontade de escrever um romance, mas depois perco a vontade. Há muitos livros que eu gostaria de ler, livros que existem. E sabemos que não conseguirei ler todos, não é mesmo? mas acho que posso viver, e morrer, com isso.