Paulo Henrique da Silva é escritor.
Como você começa o seu dia? Você tem uma rotina matinal?
Nada tão fora do comum e longe de ter um dia todo planejado em seus mínimos detalhes. Acordo ainda com flashbacks da noite passada. Às vezes com vontade de publicar um escrito ou ansioso para saber como o público reagiu ou teve identificação pela minha arte e se foi alcançado da melhor forma possível. Após me levantar, permaneço em silêncio durante 15 minutos. Depois, passo o dia na companhia da minha sobrinha. Não tenho uma rotina matinal programada, mas talvez gostaria de ter hábito de acordar cedo, ler livros, tomar café, praticar exercícios físicos, escrever, tomar sol pela manhã. Seria muito benéfico, porém, minha rotina é o oposto disso, tudo é sempre tão imprevisível, pelo menos nesse tempo.
Em que hora do dia você sente que trabalha melhor? Você tem algum ritual de preparação para a escrita?
Sou um escritor habitualmente noturno. Os trabalhos têm inicio quando perco o sono e me sinto inspirado à produzir. Enquanto todos na casa descansam, o silêncio surge e eu consigo fazer esse tempo nosso, às sós, valer a pena, sem interrupções. Não costumo escrever durante o dia, aconteceu apenas em duas oportunidades e foi uma experiência interessante que, aliás, adoraria que se repetisse.
Você escreve um pouco todos os dias ou em períodos concentrados? Você tem uma meta de escrita diária?
Quem dera, seria muito afortunado se assim ocorresse. Conseguir escrever a qualquer momento, ter meta de escrever três ou quatro contos ao dia ou um livro a cada ano. Talvez algum dia. Atualmente, minha realidade é outra. Escrevo por fruto do acaso, no instante que surge a vontade e os sentimentos transbordam, experimento uma atmosfera de criatividade que dialoga e se conecta com palavras que clamam para serem reunidas até formarem minha poesia. Encaro tudo com muita sensibilidade. Por outro lado, quando penso nas metas, voltando à elas, talvez ter um prazo prejudicaria o meu processo, fazendo com que as coisas fossem criadas às pressas, sem a devida atenção que é requerida e acabariam por ser menos prazerosas, portanto, não tenho metas ou períodos de concentração.
Como é o seu processo de escrita? Uma vez que você compilou notas suficientes, é difícil começar? Como você se move da pesquisa para a escrita?
O mais danoso possível. Primeiramente, é desenvolvido e concluído na minha cabeça. Em seguida, surge a dificuldade de extrair o material e escrevê-lo no bloco de notas, até porque eu altero bastante do que idealizei num primeiro momento e, eventualmente, os fatos se transmutam conforme vou matutando. Salvo vários rascunhos para retocar em outra ocasião, uns são descartados e caem no esquecimento, outros ganham uma nova roupagem. A pesquisa envolve a minha vivência, então, o bloco de notas é o que me ajuda a não começar do zero. Não deixo passar nada, seja uma palavra, pensamento ou frase. Por fim, tudo origina-se com naturalidade, ainda que o processo seja lento.
Como você lida com as travas da escrita, como a procrastinação, o medo de não corresponder às expectativas e a ansiedade de trabalhar em projetos longos?
Atualmente, com naturalidade. Outrora, com excesso de frustração e cobrança. Depois de ter contato com outros artistas mais experientes que foram me aconselhando, passei a encarar a procrastinação com mais paciência. Querendo ou não, ela existe e está sempre dando às caras – ainda mais em projetos longos – de mãos dadas com a ansiedade. Já me ocorreu de acordar assustado na madrugada para me auto sabotar e apagar o que havia publicado, antes que alguém pudesse ler. Hoje, sou mais maduro e não temo as expectativas, creio ser impossível corresponder a todas elas, inclusive as minhas próprias. Quando procrastino por um longo período, escuto música instrumental ou metal sinfônico. Dormir também ajuda.
Quantas vezes você revisa seus textos antes de sentir que eles estão prontos? Você mostra seus trabalhos para outras pessoas antes de publicá-los?
O suficiente para ganhar confiança de dizer que estão prontos para o público. Entretanto, antes de alterar, tenho o hábito de salvar um backup para caso me arrependa por julgar que não deveria ter alterado algum trecho específico. Nem sempre mostro os meus trabalhos, uma vez ou outra, prefiro mantê-lo exclusivo até o tempo do lançamento. Quando dá-se, compartilho com quem me incentiva. São pessoas que confio e se identificam com o que faço, portanto, considero justo ter esse contato com meus amigos. Há uma reciprocidade conjunta já que eles também são artistas.
Como é sua relação com a tecnologia? Você escreve seus primeiros rascunhos à mão ou no computador?
Somos os melhores amigos. Estou sempre com o celular em mãos anotando novas rimas, palavras e ideias. Por ser ágil, embora desgastado, ele atende bem às minhas necessidades e não me abandona. Apesar da minha letra ser ruim, já rascunhei no papel, mas faz muito tempo. Depois, evolui teclando no computador, porém, no momento só disponho do celular. Tenho curiosidade de usar uma máquina de escrever.
De onde vêm suas ideias? Há um conjunto de hábitos que você cultiva para se manter criativo?
A princípio, ocorre do falar pouco e observar (ouvir) bastante. A leitura complementa (dois livros: O Canto Geral, de Pablo Neruda e Os Cem Melhores Contos Brasileiros do Século) e, somada aos fatos da vivência cotidiana e periférica do meu bairro, abre-se um universo criativo repleto de possibilidades. Vêm da cultura hip-hop, o rock, a MPB, família, amigos, desenhos, animes, etc. Não me limito a cultivar hábitos, a arte se encarrega de tudo. Respiro fundo e permito que ela me envolva e transforme, à sua vontade.
O que você acha que mudou no seu processo de escrita ao longo dos anos? O que você diria a si mesmo se pudesse voltar à escrita de seus primeiros textos?
O meu conhecimento e vocabulário foram ampliados, o tempo trouxe maturidade, me ensinou a estudar as regras da língua portuguesa e aprender mais sobre pontuação. A ansiedade e cobrança ainda persistem, mas já não causam tanto dano. Eu diria que tivesse paciência para suportar os ciclos de evolução e aprendizado que, só são adquiridos com o passar do tempo e prática. Que percebesse o quão tóxico é, se cobrar e auto sabotar excessivamente. Que acreditasse mais no seu potencial, não tivesse medo de não ser lido e, sobretudo, em hipótese alguma, desistisse de escrever. Lembrasse dos tempos de escola, quando começou a fazer seus primeiros versos como fuga dos problemas e nem tinha noção do que estava porvir.
Que projeto você gostaria de fazer, mas ainda não começou? Que livro você gostaria de ler e ele ainda não existe?
A minha vontade é fundar um sarau para descobrir e incentivar o surgimento e desenvolvimento de novos talentos. O livro que eu gostaria de ler e ainda não existe, seria o meu. Não tem prazo definido para se tornar uma realidade, mas, cedo ou tarde, inevitavelmente, acontecerá. Portanto, carpe diem.
Para concluir, quero agradecer essas pessoas que foram fundamentais para o meu crescimento como escritor e acreditaram no meu talento: Valdete Raimundo, Priscila Cristina, Heloísa Fernanda, Ryan França Almeida, Raic José Almeida, Marlúcia Lemos, Luana Pereira, Rebeca Rosene, Douglas Lessa, Joice Vicente, Elton Silva, Kako Amaral, Istéffane Aquiles e Raquel Correia.