Paulo Bono é escritor.
Como você começa o seu dia? Você tem uma rotina matinal?
Nada de especial. Apenas como alguma coisa e vou trabalhar. Mas o dia só começa mesmo depois que leio as notícias do Flamengo.
Em que hora do dia você sente que trabalha melhor? Você tem algum ritual de preparação para a escrita?
Pela manhã. Primeiro horário. É quando mais tenho disposição e a cabeça tranquila. Isso quando estou de folga do trampo oficial. Então na maioria das vezes tem que ser à noite. Acho que não tenho ritual. Sei que preciso estar tranquilo, sem pensar em mais nada. Curto o silêncio também.
Você escreve um pouco todos os dias ou em períodos concentrados? Você tem uma meta de escrita diária?
Nunca gostei dessa tal meta. Me sentia pressionado. Além disso, sou preguiçoso pra caramba. Acontece que eu estava pendurado numa novelinha há quatro anos, e a parada só saiu depois que me obriguei a escrever todos dias. Qualquer quantidade. Um capítulo inteiro, um parágrafo ou só algumas linhas. Escrevia à noite em casa ou num ônibus intermunicipal que eu viajava duas vezes na semana. Talvez a tal meta funcione mesmo. Me ajudou muito. Mas é aquilo. Eu tinha esse livro pra terminar. Minha luta agora é deixar de preguiça e escrever todos os dias independente de ter ou não um projeto.
Como é o seu processo de escrita? Uma vez que você compilou notas suficientes, é difícil começar? Como você se move da pesquisa para a escrita?
Tenho várias notas guardadas. Ideias, personagens, cenas, diálogos pra livro ou roteiro. Ficam naquela maturação infinita. De vez em quando vou lá e dou um saque. Acho que a maioria não serve pra nada. Só quando descubro que tenho uma história pra contar que alguma dessas peças me ajudam no recheio. Mas sou lento. A parada demora. Primeiro preciso escrever a história toda ou quase toda na cabeça. Pelo menos o início e o fim. É quando você me encontra com a cara de imbecil olhando pro nada na fila do mercado, num bar, num casamento, num funeral ou no busu. É ali que escrevo antes. Só depois abro o computador. Aí é labuta.
Como você lida com as travas da escrita, como a procrastinação, o medo de não corresponder às expectativas e a ansiedade de trabalhar em projetos longos?
Sofro muito. Pra mim é escrever é um parto. Quando a coisa não anda me sinto o pior dos seres-vivos. Minha mulher já sabe quando não estou conseguindo escrever. Me xingo o tempo todo. Tenho pânico de fazer algo muito ruim ou ridículo. Hoje tenho encarado isso de forma mais positiva. Talvez signifique apenas que eu me importo, que não topo fazer nada nas coxas. Não que o resultado seja essa Coca-Cola toda. Mas acredito que se importar com a onda, fazer a autocrítica o tempo todo, querer fazer algo bacana seja um bom sinal. No geral acho que não correspondo às expectativas. Mas uma vez publicado, foda-se.
Quantas vezes você revisa seus textos antes de sentir que eles estão prontos? Você mostra seus trabalhos para outras pessoas antes de publicá-los?
Muitas vezes. Leio e reviso o tempo todo. Gostaria de revisar mais, de lamber mais, de afinar muito mais. Mas tem uma hora que cansa. Quando isso acontece, já era. Não mexo nem que me paguem. Nunca curti esse lance de submeter o texto a alguém. Pra mim não importava. Mas fiz isso com essa novelinha. Mostrei para alguns amigos escritores. A gente nunca sabe até onde vai a sinceridade nessa hora. Mas eles me ajudaram muito. Tem também a minha mulher, que geralmente não curte o que eu escrevo. Já é um parâmetro.
Como é sua relação com a tecnologia? Você escreve seus primeiros rascunhos à mão ou no computador?
Se eu for escrever no papel, depois não vou entender minha letra. Então sempre no computador.
De onde vêm suas ideias? Há um conjunto de hábitos que você cultiva para se manter criativa?
De tudo. De filmes, livros, memórias, conversas com os amigos, qualquer coisa que aconteça no dia. Meu lance é personagem. Se eu estiver sentado na praça bebendo um caldo de cana e tiver um grupo de aposentados jogando dominó, eles são meus heróis. A melhor coisa ainda é ir pra rua e manter os ouvidos atentos. Depois é o ócio. Não ter tanta coisa pra fazer também é importante. Curto não fazer nada. É tempo pra pensar.
O que você acha que mudou no seu processo de escrita ao longo dos anos? O que você diria a si mesmo se pudesse voltar à escrita de seus primeiros textos?
Na verdade o que mudou foi que eu li mais. Então me tornei mais exigente com o que escrevo. Penso mais antes de escrever. Eu diria pra mim justamente isso. “Bicho, leia mais. Não se preocupe tanto em escrever. Leia”. Diria também, “viaje mais na onda, não se apegue à realidade”. E por último diria, “cara, leia mais”.
Que projeto você gostaria de fazer, mas ainda não começou? Que livro você gostaria de ler e ele ainda não existe?
Ainda não escrevi nem uma linha do meu projeto de contos sobre futebol. E tenho vontade de escrever um longa de humor sobre gangsteres. Sobre livros que ainda não existem e eu gostaria de ler, tem esses caras: Pablo Juan Gutierrez, Fabian Casas, Rodrigo Melo, Marcus Borgon, Bruno Bandido e Saulo Ribeiro. Qualquer livro que esses caras escrevam, vou querer ler.