Paulo Barrozo é professor do Boston College Law School.
Como você começa o seu dia? Você tem uma rotina matinal?
Procuro dedicar as manhãs para ler e, quando um projeto alcança maturidade pensada, escrever. Nem sempre é possível, porém a perspectiva de uma manhã preenchida com leituras ou com dar forma escrita a um avanço qualquer no reino das ideias é já uma forma de deleite.
Em que hora do dia você sente que trabalha melhor? Você tem algum ritual de preparação para a escrita?
Manhãs chegam-nos energizadas e com um frescor próprio. Porém nada supera a inspiração, que para mim advém da percepção de que um avanço foi obtido na compreensão de algo importante e complexo. Assim, trabalho melhor quando quer que inspirado.
Meu ritual de preparação para escrever é simples, porém desafiador: primeiro procuro obter compreensão profunda e sistemática do domínio temático de minha intervenção escrita. Só então planejo a escrita, que é assim uma espécie de relatório de uma jornada concluída. O ritual então é de pensamento.
Você escreve um pouco todos os dias ou em períodos concentrados? Você tem uma meta de escrita diária?
Em razão do processo que mencionei, a escrita tende a concentrar-se no período logo seguinte à conclusão, na mente, do trabalho. Não tendo a criar escrevendo. Escrever para mim é um processo pós-criativo em larga medida. Relatório de uma jornada concluída…
Como é o seu processo de escrita? Uma vez que você compilou notas suficientes, é difícil começar? Como você se move da pesquisa para a escrita?
Idealmente, de início procuro estudar todas as dimensões relevantes do universo temático que adentro. Em seguida, procuro alcançar uma visão reveladora e sistemática desse universo. Então planejo o texto que dará forma escrita a tal visão. Faço quase nota alguma durante estas etapas. Por fim chego ao momento da escrita, que como mencionei é um processo preponderantemente pós-criativo.
Como você lida com as travas da escrita, como a procrastinação, o medo de não corresponder às expectativas e a ansiedade de trabalhar em projetos longos?
Tenho tido a boa ventura de não deparar-me com bloqueios ou travas. O desafio para mim costuma estar em reservar o tempo para dar forma escrita a um projeto que já concluí na mente; reduzir a termo um trabalho é assim para mim como que escrever um diário da última viagem quando já embarcado na viagem seguinte.
Quantas vezes você revisa seus textos antes de sentir que eles estão prontos? Você mostra seus trabalhos para outras pessoas antes de publicá-los?
Revejo o texto tantas vezes quanto possível, buscando organização e precisão amigas da cogência e sistematicidade que temas importantes merecem.
Como é sua relação com a tecnologia? Você escreve seus primeiros rascunhos à mão ou no computador?
O primeiro rascunho é escrito na mente. Os seguintes diretamente no computador.
De onde vêm suas ideias? Há um conjunto de hábitos que você cultiva para se manter criativo?
Havendo estudado e examinado um certo horizonte temático, a primeira e, ao fim, mais desafiante tarefa intelectual é desenvolver uma perspectiva, uma voz própria sobre esse horizonte temático e suas mais importantes questões. Tal para mim requer estudo e reflexão. Penso que o ócio da reflexão prolongada esteja em extinção. Lê-se, escreve-se, ouve-se, fala-se, reúne-se, assiste-se muito. Repouso em pensamento sistemático após estudo aprofundado parece virtude intelectual em acelerado processo de desaprendizagem.
O que você acha que mudou no seu processo de escrita ao longo dos anos? O que você diria a si mesmo se pudesse voltar à escrita de sua tese?
Eu diria que valeu a pena apostar em ambição amparada em trabalho duro e reflexão sistemática, a despeito de desincentivos ambientais a tal.
Que projeto você gostaria de fazer, mas ainda não começou? Que livro você gostaria de ler e ele ainda não existe?
Gostaria de ler o livro que venho tecendo em pensamento, sobre a conexão entre evolução de sistemas normativos e evolução dos dotes humanos para raciocinar, julgar, brincar, imaginar, fazer, criar…