Nuno Gonçalves é pai, poeta e professor.
Como você começa o seu dia? Você tem uma rotina matinal?
Acordar não tem nada a ver com escrever, só nos casos em que a escrita me acorda por meio de um sonho e, nesses casos, começo o dia escrevendo.
Em que hora do dia você sente que trabalha melhor? Você tem algum ritual de preparação para a escrita?
Na hora que o que precisa ser escrito se apresenta, reconhecer a chegada dessa hora já é em si mesmo um ritual.
Você escreve um pouco todos os dias ou em períodos concentrados? Você tem uma meta de escrita diária?
Não tenho nenhuma meta. Pode acontecer de passar dias e noites escrevendo sem parar e pode acontecer de passar semanas sem escrever nada.
Como é o seu processo de escrita? Uma vez que você compilou notas suficientes, é difícil começar? Como você se move da pesquisa para a escrita?
A pesquisa é a própria vida, com tudo que ela traz. A separação entre pesquisa, vida e escrita é puramente didática e falseia inteiramente a forma como vivo o processo de escrita. Difícil é parar de escrever. A escrita é um vício e como com todos os vícios parar implica mergulhar em uma síndrome de abstinência terrível. Causa dores corporais e pensamentos tenebrosos. Não estou pronto pra passar por isso, ainda.
Como você lida com as travas da escrita, como a procrastinação, o medo de não corresponder às expectativas e a ansiedade de trabalhar em projetos longos?
Da pior maneira possível.
Quantas vezes você revisa seus textos antes de sentir que eles estão prontos? Você mostra seus trabalhos para outras pessoas antes de publicá-los?
Depende do texto. Alguns nascem prontos, outros de tantas alterações que sofrem já quase nada conservam da versão original. Os textos têm vida própria. Geralmente gosto sim de mostrá-los antes de publicá-los.
Como é sua relação com a tecnologia? Você escreve seus primeiros rascunhos à mão ou no computador?
Escrevo à mão e em qualquer suporte quando estou em qualquer outro lugar que não em casa. Em casa uso o computador.
De onde vêm suas ideias? Há um conjunto de hábitos que você cultiva para se manter criativo?
Quem diabos sabe de onde vêm as ideias que se tem neste mundo? Quem não traz o espinhaço enredado nas teias dos hábitos que nos cultivam nesta vida? Os que sabem as respostas destas coisas morrem. E eu estou vivo, ainda.
O que você acha que mudou no seu processo de escrita ao longo dos anos? O que você diria a si mesmo se pudesse voltar à escrita de seus primeiros textos?
Mudou tudo e não mudou nada. E se um dia, por algum milagre, eu reencontrasse aquele jovem que saiu de São Bernardo das Éguas Russas, lhe diria acariciando seus cabelos já longos àquela época: você sobreviveu lindamente e lhe repetiria uma vez mais as mesmas palavras que Kerouac ofertou a Cassady em On the road: porra cara, sei muito bem que você me procurou só porque tá a fim de virar escritor e, afinal de contas, o que é que eu posso te dizer sobre isso a não ser que você tem que mergulhar nessa história com a mesma energia com que um viciado se droga.
Que projeto você gostaria de fazer, mas ainda não começou? Que livro você gostaria de ler e ele ainda não existe?
Os projetos são muitos. Escrever um romance em primeira pessoa sobre a vida de um pistoleiro da velha geração de pistoleiros do vale do Jaguaribe… Acho que esse é o livro que eu gostaria de ler e não existe…