Monica Demes é cineasta, mestra em cinema pela Maharishi Internacional University.

Como você começa o seu dia? Você tem uma rotina matinal?
Quando acordo preparo uma boa xicara de cafe preto e medito. É a hora magica, quando o véu do mundo dos sonhos e do mundo real ainda é tenue. É a melhor hora para ter ideias sobre as coisas que estou escrevendo. Depois vou comer alguma coisa e começo a escrever.
Em que hora do dia você sente que trabalha melhor? Você tem algum ritual de preparação para a escrita?
Trabalho muito bem de manhã, quando acordo. Se conseguir acordar no amanhecer, quando o resto do mundo ainda está dormindo, melhor ainda. Meu gato preto sempre me acorda justo antes de sair o sol. Mas na maioria das vezes volto a dormir até as 7.30. No entanto, quando consigo não voltar a dormir, visualizo com uma nitidez incrivel as cenas que estou escrevendo e vejo claramente o que funciona ou não. É a melhor hora para ter ideias. Trabalho até meio dia muito bem. Depois do almoço normalmente não consigo pensar com nitidez, mas junto com a noite, volta a concentração. Amo escrever a noite.
Você escreve um pouco todos os dias ou em períodos concentrados? Você tem uma meta de escrita diária?
Sim, tento escrever todos os dias, o fluxo de pesamentos de uma historia funciona melhor quando trabalho assim. Não tenho metas pois tem dias que flui muito bem e tem dias que não sai nada.
Como é o seu processo de escrita? Uma vez que você compilou notas suficientes, é difícil começar? Como você se move da pesquisa para a escrita?
Primeiro vem a intuição. As vezes, passo meses refletindo antes de começar dar forma. Vem uma ideia, vem um personagem, vem uma sitiação… e então começo a me fazer perguntas. Qual é a profissão desse personagem? Se isso acontecer com ele, onde vai levar? Qual historia estou contando? Quem é o outro personagem que se relaciona com ele? Como eles se encontram e por que? Quando a resposta vem do meu coração e não da minha mente, costumo acertar. Mas normalmente não tenho todos os elementos da historia claros antes de começar. Por mais que investigue sobre as localizações e os personagens só quando escrevo as primeiras 10 paginas a historia vai realmente tomando forma. Mas, as vezes, fica faltando alguma conexão, então para que a ideia tome forma, começo a escrever cenas soltas. Depois que tenho duas ou tres cenas que funcionam busco a logica interna dos personagens e do que acontece no filme. E tudo se revela com maior nitidiz. O mundo dos personagens toma forma e seus conflitos tambem. Depois de escrever o primeiro ato paro e reflito sobre o rumo que a historia está tomando e como está tomando aquele rumo. E me pergunto se tudo vai bem, para só então entrar no segundo ato, e o mesmo passa com o terceiro. Então tem a parte intuitiva do processo e uma parte formal, que se retro alimentam.
Como você lida com as travas da escrita, como a procrastinação, o medo de não corresponder às expectativas e a ansiedade de trabalhar em projetos longos?
Um dia atrás do outro, com uma meta firme: acabar a historia. As vezes, bate o medo e o desespreo – Claro! Faz parte do processo e das etapas de escritura. Mas o negocio é seguir. Voltar o foco pro que interessa que é dar vida aqueles personagens e ao universo onde eles vivem. Quando chega uma trava – acho que é o universo enviando a mensagem que tem alguma coisa errada – e daí o importante é pensar por que ela aí, para chegar a resposta do que fazer. E retomar. A procrastinação faz parte desse jogo. É até importante. As vezes é procrastinando que surgem as melhores ideias. Mas quando chega o ponto em que a bola tem que andar – eu começo a escrever cenas soltas. Mesmo que a historia não esteja desenvolvida o suficiente na minha cabeça, me ajuda muito e faz o projeto andar. A ansiedade se mistura aos medos – fazem parte do processo, Não tem nada a fazer a não ser vivê-los. Então acho que o melhor a fazer é deixar os medos fluirem pela minha cabeça, como faço com os pensamentos quando medito, e depois me concentrar em escrever. Porque quando escrevo deixo de existir e consequentemente os medos somem. E quando isso acontece só existe a historia. E aí vem a sensação maravilhosa de alivio e a certeza de que estou no rumo certo.
Quantas vezes você revisa seus textos antes de sentir que eles estão prontos? Você mostra seus trabalhos para outras pessoas antes de publicá-los?
Sempre mostro pra outras pessoas o texto, acho fundamental pois a escrita é um processo muito solitario. Então é importante ter um grupo de pessoas com quem conversar para identificar os problemas do texto e começar a melhorar e melhorar, até que chega um ponto que a historia quer ver a luz. Não tenho um numero exato de vezes que reescrevo um texto. Como diz o Lynch – o roteiro se reescrever até na sala de montagem, um filme nunca está pronto até ele ficar pronto. E como escrevo filmes, tenho claro que ele vai crescer até ir para a sala de exibição, na estreia.
Como é sua relação com a tecnologia? Você escreve seus primeiros rascunhos à mão ou no computador?
Gosto de escrever os rascunhos a mão, sempre tenho um caderno para cada projeto, onde escrevo sobre os personages e cada ideia que vai surgindo ao longo do processo. Acho mais intuitivo a escrita a mão. Só vou para o computador quando começo a escrever a s primeiras 10 paginas. Mas sigo com o caderno até o final, escrevendo cada ideia que surge no caderno, até durante as rodagens.
De onde vêm suas ideias? Há um conjunto de hábitos que você cultiva para se manter criativa?
As ideias flutuam no Universo, como os peixes flutuam no rio. Meditar certamente me ajuda muito a conectar com elas. Nesse contexto, criar habitos ajuda muito a que as ideias fluiam, porque repetir nos leva a um lugar seguro onde a mente pode fluir sem ter que estar atenta ao mundo exterior, aí você pode mergulhar sem medo dentro de você. Caminhar – na praia ou num bosque – meditar e as vezes até o som do chuveiro ajuda a entrar nesse transe que leva as ideias. Ouvir o barulho do vento nas folhas dos coqueiros, nos pinheiros…
O que você acha que mudou no seu processo de escrita ao longo dos anos? O que você diria a si mesma se pudesse voltar à escrita de seus primeiros textos?
Eu tenho mais controle sobre as historias que escrevo. Sei que sempre, passe o que passe, a historia vai sair, e que quanto mais seja capaz de contar de forma oral o que vai passar, mais rapido ela vai entrar no rumo correto. As vezes, demora, mas o rumo sempre acaba chegando. O que diria pra mim mesma nos primordios? CONFIA. Por mais que a logica queira ir pra outro lado, não deixa, confia no seu instinto. O instinto sempre tem razão. A logica vem depois.
Que projeto você gostaria de fazer, mas ainda não começou? Que livro você gostaria de ler e ele ainda não existe?
Estou louca para começar a escrever uma serie de terror. Ja tenho os elemntos iniciais na cabeça, já sei sobre o que será, os personagens principais, mas falta acabar de retocar dois projetos de longas pra me meter de cabeça. Vai ser a meta de 2021. Livro que gostaria de ler e ainda não existe…? Rs. Qualquer livro do Murakami ou da Ogawa que ainda não tenham sido escritos – sou fã!!!