Micheliny Verunschk é escritora.
Como você começa o seu dia? Você tem uma rotina matinal?
Eu acordo muito cedo, porque minha filha estuda de manhã e precisa sair de casa até as 6h30, mas não sou uma pessoa que funciona bem nesse horário, então geralmente depois que ela sai eu vou para a cama e volto a dormir. Levanto entre 8h30 e 9h e faço cerca de meia hora de yoga, só depois tomo café da manhã. Logo preciso arrumar meu outro filho para a escola. Meu dia de trabalho só começa, de fato, às 11h da manhã.
Em que hora do dia você sente que trabalha melhor? Você tem algum ritual de preparação para a escrita?
Eu costumava trabalhar melhor à noite, mas desde que os filhos nasceram que o melhor horário para trabalhar é aquele que dá. Costumo dizer que trabalho nas brechas. Hoje em dia escrevo à tarde, e não tenho nenhum ritual.
Você escreve um pouco todos os dias ou em períodos concentrados? Você tem uma meta de escrita diária?
Não tenho meta de escrita diária. E funciono caoticamente. Há períodos em que escrevo compulsivamente e há períodos em que paro. Quando estou no modo compulsivo, não durmo direito e é possível que acorde às 3h30, 4h da manhã para obedecer à necessidade de escrita. Já as paradas podem ser por exigências externas ou internas. As exigências externas são férias escolares, trabalhos remunerados etc. As exigências internas obedecem a uma necessidade de distanciamento daquilo que estou escrevendo. Preciso parar, ficar dias ou semanas sem mexer no que escrevi para, quando retornar, apurar melhor o que fiz até ali. Mas isso não significa que não estou pensando na escrita.
Como é o seu processo de escrita? Uma vez que você compilou notas suficientes, é difícil começar? Como você se move da pesquisa para a escrita?
Mesmo quando não estou escrevendo, estou escrevendo. Minha mente não para de trabalhar. E é um processo muito intenso. Não é difícil que eu trabalhe em projetos simultâneos. Como disse, meu funcionamento é caótico. E sou uma máquina de pesquisar. Pesquiso o tempo inteiro e um resultado sempre puxa outro num vórtice que tende ao infinito. O trabalho de pesquisa acontece antes e durante a escrita.
Como você lida com as travas da escrita, como a procrastinação, o medo de não corresponder às expectativas e a ansiedade de trabalhar em projetos longos?
Aceito tudo isso como parte do processo, mas sem deixar muito espaço para esses sentimentos. O meu tempo é muito resumido, então não posso desperdiçar com ansiedade, com medo. Sigo trabalhando e empurro essas coisas com a barriga, porque preciso ser muito prática.
Quantas vezes você revisa seus textos antes de sentir que eles estão prontos? Você mostra seus trabalhos para outras pessoas antes de publicá-los?
Não sei dizer. Acho que os textos nunca estão prontos e é comum que acrescente ou retire coisas mesmo na fase de revisão da editora. Acho que já falei isso, estou continuamente pensando nos livros. Eles só estão prontos depois de publicados, em se tratando de prosa. Em se tratando de poesia, mesmo os poemas publicados são passíveis de mudança. Sim, meus amigos leem o que escrevo antes da publicação. Normalmente espalho os originais entre três, quatro pessoas, leitores comuns ou escritores.
Como é sua relação com a tecnologia? Você escreve seus primeiros rascunhos à mão ou no computador?
Tecnologia é meio. Não tenho apego a nenhum instrumento. Hoje em dia escrevo mais em computador, mas venho escrevendo poemas à mão porque penso que é preciso recuperar um tempo que a nossa relação com as máquinas vem roubando.
De onde vêm suas ideias? Há um conjunto de hábitos que você cultiva para se manter criativa?
As minhas ideias vêm do mundo que me cerca e para o qual sou muito atenta. Não sei se meus hábitos me ajudam a ser criativa, mas creio que eles me compõem: andar, escutar as pessoas na rua, a yoga, conversar com meus filhos, ler outros autores.
O que você acha que mudou no seu processo de escrita ao longo dos anos? O que você diria a si mesma se pudesse voltar à escrita de seus primeiros textos?
Creio que ao longo dos anos eu passei a compreender melhor o que funciona ou não em um texto. Não tenho apego. Se for necessário recomeço tudo do zero. Foi assim com o terceiro livro da trilogia infernal, que deve sair em setembro pela Patuá. Joguei tudo fora e recomecei do zero quando percebi que não estava como eu gostaria. Eu sou escritora de literatura e acadêmica. Funciono de forma parecida em ambas as formas. Defendi minha tese de doutorado há três anos e não mudaria nada nela, gosto muitíssimo, o que é um espanto, pois a dissertação de mestrado para mim é um horror. Reescreveria toda.
Que projeto você gostaria de fazer, mas ainda não começou? Que livro você gostaria de ler e ele ainda não existe?
Eu fico curiosa sempre sobre qual vai ser o meu próximo romance. Eu sei que ele está logo ali, me esperando, e isso me enche de expectativa. Quanto aos livros que ainda não existem, não sei. Sei que há vários, como Os Maias, que ainda não li e por isso precisam existir para mim de uma forma mais orgânica.