Melissa de Sá é escritora.
Como você começa o seu dia? Você tem uma rotina matinal?
Normalmente cuido dos cachorros assim que acordo. São três: Ben, Madalena e Sauron. Depois faço yoga e medito um pouco. Aí parto para a lista de tarefas a fazer, o que normalmente inclui preparação de aulas e a escrita da minha tese de doutorado. Se tenho um tempinho, gosto de ler um pouco também.
Em que hora do dia você sente que trabalha melhor? Você tem algum ritual de preparação para a escrita?
Para escrita criativa, definitivamente trabalho melhor à noite. É quando as ideias fluem e consigo me desligar das tarefas do dia a dia. Não sei se é bem um ritual, mas gosto de fazer os esquemas, seja de conto ou de capítulos, no papel, com canetas coloridas.
Você escreve um pouco todos os dias ou em períodos concentrados? Você tem uma meta de escrita diária?
Em períodos concentrados. Isso porque sinto que ter uma meta diária me sufoca. Assim, quando tenho algo para entregar, separo dias mais livres para me dedicar à escrita.
Como é o seu processo de escrita? Uma vez que você compilou notas suficientes, é difícil começar? Como você se move da pesquisa para a escrita?
Antes de escrever alguma história, eu tenho que ficar ruminando a trama na minha cabeça por uns dias. Se a história ainda estiver comigo passado uns quatro dias, é porque ela merece ser escrita. Aí normalmente faço algumas anotações num bloquinho mesmo, só das ideias principais. Caso seja necessário pesquisar algo mais a fundo para escrever, normalmente pego um caderno para tomar notas. Eu gosto de fazer essa preparação toda a mão. Começar pra mim é super ok, o difícil mesmo é manter um ritmo depois. Gosto de escrever e pesquisar ao mesmo tempo. Se eu já tenho as informações básicas, parto pra escrita de cara, e depois vou consultando o que precisar.
Como você lida com as travas da escrita, como a procrastinação, o medo de não corresponder às expectativas e a ansiedade de trabalhar em projetos longos?
Olha, acho que esse é o maior desafio de todo escritor. Se tenho tempo, eu deixo o texto pra lá. Vou fazer alguma coisa completamente diferente e volto para o texto depois de alguns dias com os olhos e a cabeça frescos. Mas se eu tenho prazo, então trato de assistir ou ler algo que me inspire. Vale aí rever filmes favoritos ou mesmo me aventurar coisas novas. Desde que tenham alguma relação com o sentimento que quero trabalhar naquele texto que travou.
Quantas vezes você revisa seus textos antes de sentir que eles estão prontos? Você mostra seus trabalhos para outras pessoas antes de publicá-los?
Muitas vezes. Muitas mesmo. Eu sou daquelas que escreve muito rápido e meus rascunhos ficam com muitos erros. Costumo trocar letras e etc., e pra mim é difícil consertar isso nas minhas próprias revisões. Nessas eu fico mesmo é na caracterização de personagens, ambientação, etc. Na grande maioria das vezes mostro meus textos para outras pessoas. A Karen Alvares e a Nívia Fernandes são minhas beta de plantão e praticamente tudo que faço passa por elas. Costumo discutir plot com Diego, meu marido, que estuda literatura também e é ótimo em estruturas narrativas.
Como é sua relação com a tecnologia? Você escreve seus primeiros rascunhos à mão ou no computador?
Como eu disse, notas são à mão. Mas escrever, escrever mesmo, é no computador. Eu digito muito rápido e minha mão não acompanha meu pensamento! Fora que no computador é mais fácil mudar as coisas de lugar.
De onde vêm suas ideias? Há um conjunto de hábitos que você cultiva para se manter criativa?
Eu sou daquelas que não sabe muito bem de onde vem as ideias. Às vezes de uma música, um filme, ou mesmo uma conversa com alguém. Tento me manter aberta às experiências porque nunca sei quando um insight criativo vai sair delas. Acho que o melhor hábito pra se manter criativa é ler muito. Ler trabalha o cérebro da gente.
O que você acha que mudou no seu processo de escrita ao longo dos anos? O que você diria a si mesma se pudesse voltar à escrita de seus primeiros textos?
Hoje sou muito mais flexível em relação aos questionamentos dos leitores beta. Antes, eu tinha muito mais resistência. Coisa de escritor iniciante. Depois a gente aprende que o texto é trabalho e que tá tudo bem não acertar da primeira vez. Se eu pudesse falar algo com a Melissa do passado seria isso: desapega dessa ideia perfeccionista.
Que projeto você gostaria de fazer, mas ainda não começou? Que livro você gostaria de ler e ele ainda não existe?
Eu tenho muita vontade de escrever um livro inspirado na história das mulheres da minha família. Uma coisa realismo mágico, bem Isabel Allende, mas do meu jeito. Mas esse projeto vai demorar uns anos ainda porque eu tenho que pesquisar coisas que aconteceram mais de cem anos atrás! Envolve uma pesquisa muito grande. O livro que eu gostaria de ler e não existe é uma fantasia sobrenatural com bastante comédia que se passa em Belo Horizonte. Como não tinha, resolvi eu mesma escrever!