Maurício Palma Resende é doutor em Direito, Estado e Constituição pela Universidade de Brasília (UnB).
Como você começa o seu dia? Você tem uma rotina matinal?
Para ajudar a manhã a fluir, como sofredor de insônia, eu anoto minhas principais preocupações num bloquinho ou numa página antes de dormir no dia anterior. Como tenho que sair muito cedo às vezes, também deixo a comida mais ou menos pronta. Um dia produtivo, para mim, não acontece sem sete horas de sono, pelo menos.
Após acordar, bem cedo, tomo um expresso duplo, um pão com queijo e leio o jornal. Vejo as anotações que fiz. Agora estou sem redes sociais, mas também era a hora de checá-las. Acho que essa seria minha única rotina fixa, realmente, de manhã. Às vezes vou logo depois disso à academia.
Em que hora do dia você sente que trabalha melhor? Você tem algum ritual de preparação para a escrita?
Eu trabalho melhor a partir das 16 horas. Quando posso, vou até às 23 horas mais ou menos. Há cinco anos atrás, ia até umas quatro da manhã sem problema. Não tenho nenhum grande ritual, gosto apenas de tomar café antes de escrever; mas não tomo café depois das 16h.
Você escreve um pouco todos os dias ou em períodos concentrados? Você tem uma meta de escrita diária?
Metas diárias não funcionam direito comigo. Meu processo produtivo envolve períodos concentrados de leitura e escrita.
Como é o seu processo de escrita? Uma vez que você compilou notas suficientes, é difícil começar? Como você se move da pesquisa para a escrita?
Embora ainda trabalhe nisso, o início de meu processo de escrita é caótico. Há sempre um projeto inicial, mas o que li o altera bastante, geralmente. Isso traz a mim complicações futuras; sinto mesmo que textos acabados meus precisariam de ainda mais esmerilhamento nesse sentido.
Como você lida com as travas da escrita, como a procrastinação, o medo de não corresponder às expectativas e a ansiedade de trabalhar em projetos longos?
Experimentei travamentos durante o doutorado, principalmente. Tentei relaxar, procurei inclusive ajuda psicológica. Creio que o mais adequado a se fazer é ter uma vida social rica, ou seja, não fazer do seu trabalho sua vida, pois isso acaba por gerar travas. Para mim, a procrastinação tem a ver com o uso de computador e das redes sociais. Se não atentar, passo horas vendo coisas pouco importantes e, ao final, tenho a impressão de que não fiz nada. Por isso, por exemplo, saí delas nesse momento. Sou perfeccionista demais. Nunca fico realmente contente com o que tenho em mãos, tenho muitos textos guardados. É algo que ainda preciso trabalhar melhor.
Quantas vezes você revisa seus textos antes de sentir que eles estão prontos? Você mostra seus trabalhos para outras pessoas antes de publicá-los?
Não tenho ideia de quantas vezes reviso. Faço isso muitas e muitas vezes. Mostro meus textos para acadêmicos e amigos que confio.
Como é sua relação com a tecnologia? Você escreve seus primeiros rascunhos à mão ou no computador?
Escrevo muitas e muitas notas à mão, mas os textos já começo no computador. Gosto do computador, mas sua facilidade também pode ocasionar certa desorganização do texto. Por isso, ou imprimo ou uso um leitor digital para assegurar que o texto está fluindo ou não está se repetindo, por exemplo.
O que você acha que mudou no seu processo de escrita ao longo dos anos? O que você diria a si mesmo se pudesse voltar à escrita de sua tese?
Acho que fiquei ainda mais rigoroso com minha escrita, embora tema que isso vá afetar minha criatividade. Se pudesse voltar, diria para pensar por ainda mais tempo no meu sumário. Foi o que ouvi muito de meu orientador brasileiro e alemão – esse último sempre me perguntava a quantas andava minha Gliederung. Deve-se com certa frequência olhar para o sumário durante o processo de escrita da tese. Acho que um bom sumário ajuda a ver o trabalho de forma conjunta e faz com que se possa organizar melhor o tempo.
Que projeto você gostaria de fazer, mas ainda não começou? Que livro você gostaria de ler e ele ainda não existe?
Gostaria de fazer um estudo empírico rigoroso sobre o mundo das organizações não governamentais, uma espécie de estudo antropológico – não tenho ainda ferramentas, leitura, treinamento etc. suficientes para isso. Embora não seja acadêmico, quero ler Graça Infinita; li e gostei apenas do primeiro capítulo. Tenho a intuição de que a literatura ajuda na escrita, mesmo na acadêmica. O livro que ainda não existe que gostaria de ler seria o que contasse, em primeira pessoa, as impressões de uma criança e de um artista, como um músico ou um artista plástico, diante de uma reunião a portas fechadas do Conselho de Segurança da ONU.