Mariana Pargendler é professora da FGV Direito SP e Global Professor of Law na New York University (NYU).
Como você começa o seu dia? Você tem uma rotina matinal?
O meu dia atualmente começa com a rotina das minhas filhas pequenas. É uma rotina movimentada e sem mesmice, mas muito gratificante. Quando não leciono pela manhã, leio meus e-mails e notícias antes de começar a pesquisar ou escrever. Eu recebo atualizações de diversos blogs e e-journals na minha área de atuação. Essas leituras servem como aquecimento.
Em que hora do dia você sente que trabalha melhor? Você tem algum ritual de preparação para a escrita?
Antigamente, eu trabalhava melhor à noite. Hoje trabalho melhor pela manhã ou à tarde, quando ainda estou com a cabeça fresca. Não tenho propriamente um ritual de preparação. A ordem das coisas vai depender muito do estágio do projeto em que estou trabalhando, bem como do meu grau de inspiração e energia em cada dia.
Você escreve um pouco todos os dias ou em períodos concentrados? Você tem uma meta de escrita diária?
Gostaria muito de escrever um pouco todos os dias, mas não é o que acontece. Nunca tive metas de escrita. Para mim nem todos os dias são iguais, nem tampouco todas as horas do dia. Há dias mais e menos produtivos de acordo com a inspiração e energia disponíveis. Se elas são altas, a escrita rende muito e me dedico somente a ela. Quando são baixas, aproveito para adiantar outros afazeres e tarefas de pesquisa de natureza mais burocrática.
Como é o seu processo de escrita? Uma vez que você compilou notas suficientes, é difícil começar? Como você se move da pesquisa para a escrita?
Atualmente começo meus trabalhos pelo seu resumo (abstract) provisório. É somente a partir do momento que tenho clareza sobre o argumento ou hipótese de trabalho que passo a escrever. Porém, a pesquisa realizada no decorrer do trabalho invariavelmente irá alterar esse resumo inicial. Há um processo interativo entre pesquisa e escrita. Escrever bem é difícil, mas não tanto como escolher a qual projeto se dedicar. Quando a pesquisa já está encaminhada e o argumento consolidado, a escrita flui mais cedo ou mais tarde.
Como você lida com as travas da escrita, como a procrastinação, o medo de não corresponder às expectativas e a ansiedade de trabalhar em projetos longos?
Não tenho problema com procrastinação. Tive um professor na graduação que enfatizou a importância de realizarmos as tarefas com antecedência para podermos aproveitar novas oportunidades e convites que vão surgindo. Levo esse conselho muito a sério. Tenho verdadeiro pânico de prazos e faço tudo com a maior antecedência possível. A melhor forma de lidar com a insegurança e a ansiedade é continuar trabalhando.
Quantas vezes você revisa seus textos antes de sentir que eles estão prontos? Você mostra seus trabalhos para outras pessoas antes de publicá-los?
Reviso meus textos muitas vezes. Uma vez li que “qualquer um consegue escrever; já reescrever exige habilidade”. Sempre falo aos meus alunos sobre a importância de reescrever. Também costumo circular meus trabalhos a colegas e apresentá-los em workshops e conferências antes de publicá-los. Esse diálogo acadêmico contribui muito para a qualidade do resultado final.
Como é sua relação com a tecnologia? Você escreve seus primeiros rascunhos à mão ou no computador?
Escrevo sempre no computador, mas imprimo o texto de tempos em tempos para fins de revisão. Também costumo anotar ideias que surgem ao longo do dia como “Notas” no meu smartphone, antes que eu as esqueça. Adianto boa parte do trabalho dessa forma.
De onde vêm suas ideias? Há um conjunto de hábitos que você cultiva para se manter criativa?
Tenho percebido que as minhas principais ideias têm vindo de leituras, aulas e discussões travadas ao longo do tempo. É daí que surgem as perguntas, os insights e as conexões. Esse tempo de maturação é essencial. Sou inimiga da pressa. Tenho gestado alguns projetos ou ideias por anos antes de passar a escrever. Como hábito, leio continuamente sobre assuntos tanto na minha área como em outras áreas, ainda que não esteja escrevendo sobre eles. Também mantenho uma lista de projetos futuros que alimento continuamente. Ela me é muito útil no período de “entressafra”. O restante das ideias surge durante o próprio processo de escrita e, justamente por isso, também busco dedicar bastante tempo a esse estágio.
O que você acha que mudou no seu processo de escrita ao longo dos anos? O que você diria a si mesma se pudesse voltar à escrita de sua tese?
A principal mudança é a diminuição da ansiedade. Eu diria a mim mesma para me preocupar menos com a qualidade do produto final, pois o essencial (e controlável) é a dedicação.
Que projeto você gostaria de fazer, mas ainda não começou? Que livro você gostaria de ler e ele ainda não existe?
Tenho uma grande lista de projetos que ainda não comecei. Nunca sei com antecedência em que ordem irei abordá-los. Gostaria muito de ler uma “macro-história” sobre a evolução do direito brasileiro, bem como uma análise aprofundada sobre as causas e implicações da Operação Lava-Jato.