Marcus Vinicius Quiroga é poeta.
Como você começa o seu dia? Você tem uma rotina matinal?
Como minhas atividades não se repetem todos os dias, jamais consegui ter uma rotina, o que talvez fosse bom para um escritor.
Em que hora do dia você sente que trabalha melhor? Você tem algum ritual de preparação para a escrita?
Não tenho horário preferido para escrever, nem ritual, nem simpatias. Aos poucos passei a escrever como um jornalista ou um publicitário, isto é, profissionalmente, ainda que o direito autoral não nos trate como profissionais.
Também não sei explicar por que em certos dias o trabalho da escrita rende mais do que em outros dias. Sei que às vezes tenho mais dificuldade em criar, mas não atribuo a dificuldade à falta de inspiração. Não sou adepto da ideia de inspiração e cito, com frequência, a frase de Picasso: “Inspiração existe, mas é bom que, quando ela chegar, me encontre trabalhando”.
Você escreve um pouco todos os dias ou em períodos concentrados? Você tem uma meta de escrita diária?
Aprecio quem tenha essa disciplina e acredito que ela seja necessária para romancistas. Já poetas e autores de narrativas mais curtas podem ser mais indisciplinados quanto ao horário. Embora já tenha me planejado algumas vezes para escrever todos os dias e com horários, jamais cumpri o planejamento. De qualquer forma, recomendo que o façam.
Como é o seu processo de escrita? Uma vez que você compilou notas suficientes, é difícil começar? Como você se move da pesquisa para a escrita?
Meu processo é plural. Livros diferentes são consequência de processos diferentes.
Ao contrário de muitos poetas, faço pesquisas e leituras para escrever meus livros. E como a maioria dos livros é temática, a concepção talvez se aproxime (suponho) do olhar de totalidade que o romancista deve ter.
Antes de escrever Fazer-se Frida, vi filmes e li livros sobre Frida Kahlo, além, é claro, de estudar a sua pintura.
Como você lida com as travas da escrita, como a procrastinação, o medo de não corresponder às expectativas e a ansiedade de trabalhar em projetos longos?
A procrastinação é um grande mal em todas as áreas e projetos longos, como romances ou teses de doutorado, vítimas mais comuns. De qualquer forma, todos nós, em algum momento, adiamos trabalhos em nome de outras prioridades ou falsas prioridades, pois tendemos também a valorizar o serviço (inclusive um livro) que exigiu mais tempo para ser feito.
Meu problema maior não é a procrastinação, mas a dispersão. E, por reconhecer-me extremamente dispersivo, uma vez que inicio vários projetos literários ao mesmo tempo, sempre me dedico para terminar alguns deles. Por exemplo, interrompi o Xadrez e as palavras para escrever O cinematógrafo, porque a ideia do espelho, que tinha uma grande importância na arte barroca, me levou às imagens e ao cinema. Depois concluí o Xadrez e as palavras.
Por outro lado (talvez inconscientemente para compensar a dispersão), não gosto de abandonar trabalhos, projetos ou atividades. Ou seja, tenho um truque para me enganar: penso em fazer dez projetos e concluo quatro, o que é uma boa média. Na verdade, tenho uma produção literária elevada, como minha bibliografia pode comprovar. Enfim, sou um poeta-operário, não um vate iluminado.
Quantas vezes você revisa seus textos antes de sentir que eles estão prontos? Você mostra seus trabalhos para outras pessoas antes de publicá-los?
Reescrevo sempre os textos, afinal sou professor de oficinas literárias e uma oficina é a aprendizagem de reescrever. Também reviso os textos várias vezes, o que não impede de que algum erro, infelizmente, escape.
Não é fácil encontrar alguém que leia os nossos textos, a não ser a mulher ou um grande amigo. Todas as leituras e sugestões antes da publicação são sempre bem-vindas, no entanto isto significa gasto e escritores, de um modo geral, não têm dinheiro para pagar comentários ou pareceres. Escrever é, sem dúvida, um ato solitário, por várias razões.
Como é sua relação com a tecnologia? Você escreve seus primeiros rascunhos à mão ou no computador?
Sempre usei a máquina de escrever, portanto, adaptei-me logo ao computador. Ao contrário da maioria dos escritores que ouço, escrevo diretamente no computador, pois acho também mais fácil fazer as alterações no texto e gravar o novo arquivo. Aderi ao computador desde os anos oitenta e só escrevo a caneta quando não tenho o laptop por perto.
De onde vêm suas ideias? Há um conjunto de hábitos que você cultiva para se manter criativo?
As ideias vêm de outros livros ou de qualquer outra forma de arte, não sendo por acaso que tenho livros como O cinematógrafo (cinema), Autoestrada para Tebas (teatro) ou O livro amarelo de Van Gogh (pintura). Creio que tenho mais ideias do que tempo.
Recomendo a todo escritor que esteja sempre atento a livros, filmes, peças, exposições, músicas etc. Não tenho hábitos ou métodos para a criação. Acredito, sim, que aquele que se pretende escritor já tem algo (valores, ideologia) a dizer e cabe a ele aprender e exercitar as formas de dizer.
O que você acha que mudou no seu processo de escrita ao longo dos anos? O que você diria a si mesmo se pudesse voltar à escrita de sua tese?
Com o tempo, creio que adquiri mais consciência do fazer literário. E digo isto, não só por minha formação acadêmica em Letras (graduação, mestrado e doutorado), mas também (e talvez principalmente) por minhas leituras e atividades frequentes de escrita.
Quanto à tese, hoje presumo que a faria com mais organização e facilidade, pois tenho mais experiência e mais tempo.
Que projeto você gostaria de fazer, mas ainda não começou? Que livro você gostaria de ler e ele ainda não existe?
Tenho vários projetos de livros anotados e sei que farei alguns. Gostaria de escrever romances, mas ainda não tive disciplina e talento para realizá-los.
Às vezes imagino como seria um livro de poesia de um escritor que fosse a soma de dois ou de vários. Por exemplo, um Maiakovski mais um João Cabral ou um Fernando Pessoa mais um Gullar.