Márcia Barbieri é escritora, autora de A Puta.
Como você começa o seu dia? Você tem uma rotina matinal?
Embora eu não goste de acordar cedo, trabalho na parte da manhã. Então me levanto, tomo banho, faço café, pego um livro como companhia e saio. Torço para que o dia seja calmo, pois dias turbulentos acabam com a energia, a qual, mais tarde, deverá ser direcionada à escrita. Infelizmente, não vivo dos meus escritos e nem de direitos autorais. Aliás, quase ninguém vive da escrita efetivamente… Costumo dizer que trabalho para sustentar meu vício, a escrita… Vivo entre a realidade e a ficção…
Em que hora do dia você sente que trabalha melhor? Você tem algum ritual de preparação para a escrita?
Eu prefiro escrever no início da noite. Gosto de escrever escutando música clássica ou blues. Acendo um incenso, sento na cama, abro o notebook e tento deixar a escrita fluir. Claro que a maioria das vezes fico frustrada com o resultado. Escrever não é como solucionar uma equação, é sempre uma procura ingrata e o resultado é algo inexato… Assim mesmo, às vezes me surpreendo.
Você escreve um pouco todos os dias ou em períodos concentrados? Você tem uma meta de escrita diária?
A minha meta é abrir todo dia o arquivo em que estou trabalhando. Atualmente estou escrevendo um romance intitulado “A casa das aranhas”, é o terceiro de uma trilogia. O que liga os três romances é a temática do corpo. Não coloco uma meta em número de linhas, fico em torno de uma hora mexendo no texto. Alguns dias a coisa flui e escrevo um pouco mais. Em geral, não acho produtivo me ater durante mais de uma hora no texto. Tem dias que escrevo três linhas e fico super feliz, porque foram três linhas muito bem pensadas. Outros dias escrevo meia página, uma página e acho razoável ou medíocre. Acredito que alguns dias colhemos ouro, em outros dias conseguimos apenas algumas pedras vulgares…
Como é o seu processo de escrita? Uma vez que você compilou notas suficientes, é difícil começar? Como você se move da pesquisa para a escrita?
É sempre difícil começar. Sou uma eterna procrastinadora! Acho engraçado quando as pessoas comentam: “Ah, mas você já escreveu outros livros, então para você é super fácil!”. Definitivamente, não! Cada livro é um novo processo de escrita, reescrita, é um projeto singular e sinto como se nunca tivesse escrito antes e às vezes, até me surpreendo lembrando que escrevi um livro com mais de cem páginas. Sinto que tanta coisa já foi dita e que tenho tão pouco a dizer… Normalmente tenho notas sobre o romance espalhadas em lugares diferentes: agenda, diário, bloco de notas no celular…
Como você lida com as travas da escrita, como a procrastinação, o medo de não corresponder às expectativas e a ansiedade de trabalhar em projetos longos?
Eu converso o tempo todo comigo mesmo, tento me convencer que a procrastinação é algo normal e, às vezes, até desejável, pois quando percebo que não tenho nada de interessante a dizer, simplesmente fecho o arquivo e penso: “Para que a pressa?” Não escrevo por dinheiro, não estou ligada a nenhuma editora de grande porte, de forma que tenho todo o tempo do mundo para fracassar… ou para encontrar a palavra exata…
Quantas vezes você revisa seus textos antes de sentir que eles estão prontos? Você mostra seus trabalhos para outras pessoas antes de publicá-los?
Costumo revisar apenas uma ou duas vezes o livro todo, embora reescreva várias vezes alguns trechos antes do término do livro. Sempre peço a leitura de dois ou três amigos.
Como é sua relação com a tecnologia? Você escreve seus primeiros rascunhos à mão ou no computador?
Há muito tempo escrevo direto no computador, apenas algumas notas deixo em cadernos. Depois que termino o livro, imprimo, leio e faço algumas alterações à mão.
De onde vêm suas ideias? Há um conjunto de hábitos que você cultiva para se manter criativa?
Acho difícil dizer com precisão de onde vêm as ideias, pois elas vêm de origens bem diversas. Algumas devem ser resquícios de leituras, outras ideias são baseadas em experiências próprias ou de alguém próximo e outras são elementos do inconsciente.
O que você acha que mudou no seu processo de escrita ao longo dos anos? O que você diria a si mesma se pudesse voltar aos seus primeiros escritos?
Não consigo dizer com exatidão o que mudou, talvez a própria experiência sobre a vida influa sobre o texto de hoje. Talvez a persistência, o tempo dedicado à escrita… Diria a mim mesma para continuar, não há outro caminho além de seguir em frente…
Que projeto você gostaria de fazer, mas ainda não começou? Que livro você gostaria de ler e ele ainda não existe?
Não tenho projetos pré-definidos, quero apenas continuar escrevendo. Acho que todos os livros já foram escritos, só me falta tempo de lê-los. Não escrevemos para dizer nada diferente, mas para dizer algo, mesmo que seja repetição.