Maiquel Ângelo Dezordi Wermuth é professor dos cursos de graduação em direito da UNIJUÍ e da UNISINOS.
Como você começa o seu dia? Você tem uma rotina matinal?
Meu dia começa com uma boa caneca de café. É fundamental. Pela manhã, exceto nos dias nos quais leciono (terças e sextas), gosto de acordar um pouco mais tarde (por volta das 9 ou 10 horas) e prefiro atividades que possam ser realizadas em casa, sozinho. Geralmente eu durmo tarde e meu humor pela manhã não é dos melhores, razão pela qual evito atividades que envolvam outras pessoas. É pela manhã que organizo as minhas aulas, respondo e-mails, atendo demandas de alunos e colegas, corrijo avaliações, etc. Basicamente, a minha rotina matinal consiste em acordar, preparar um café e, então, realizar as atividades “burocráticas” mencionadas.
Em que hora do dia você sente que trabalha melhor? Você tem algum ritual de preparação para a escrita?
Durante a pesquisa para a tese de doutoramento, adquiri o hábito de escrever à tarde. Desde então, esse tem sido, para mim, o período mais produtivo do dia. Gosto de me sentar para escrever por volta das 14 horas, assim permanecendo até a tardinha. Como gaúcho que sou, o chimarrão costuma me acompanhar. Não possuo um ritual de preparação para a escrita propriamente dito. Apenas gosto de, antes de me sentar para escrever, cercar-me dos materiais que utilizarei. Busco todas as fontes, reúno todos os livros, e mergulho na produção. O silêncio absoluto é fundamental para a minha concentração.
Você escreve um pouco todos os dias ou em períodos concentrados? Você tem uma meta de escrita diária?
Costumo escrever todos os dias. Geralmente tenho mais de um texto em andamento. Então, depende da inspiração do dia. Não possuo uma meta de escrita diária. Penso que isso não me traria prazer. A escrita para mim precisa ser prazerosa. É a atividade que mais me realiza, então, não a faço mecanicamente, estabelecendo metas, mas como uma atividade que integra o meu dia e que o torna mais feliz.
Como é o seu processo de escrita? Uma vez que você compilou notas suficientes, é difícil começar? Como você se move da pesquisa para a escrita?
Depois do insight inicial – que geralmente vem de uma obra artística ou literária – eu parto em busca das fontes. Pesquiso muitos textos em livros, periódicos, internet… Fascina-me ver aquele universo sendo, paulatinamente, descortinado. Gosto muito de ler o que outras pessoas já escreveram sobre o assunto que será abordado e ver em que medida posso contribuir para além daquilo que já foi produzido. Alguns textos demoram muito tempo para ficar prontos. Pressupõem uma maior imersão na temática abordada. Algumas pesquisas tendem a ser mais complexas, por abrangerem, por exemplo, categorias filosóficas que exigem maior reflexão. Por outro lado, existem aqueles textos que nascem mais impulsivamente e que – voilà – ficam prontos muito rapidamente.
Como você lida com as travas da escrita, como a procrastinação, o medo de não corresponder às expectativas e a ansiedade de trabalhar em projetos longos?
Procuro não pensar muito nisso. Como já salientei, escrever para mim está relacionado a uma atividade que significa prazer. Então, não costumo procrastinar. Ao contrário de muitas pessoas, eu gosto de prazos. Eles me instigam a produzir. Acho-os desafiadores.
Quanto às expectativas, considero normal – e necessário – não corresponder a todas. É aqui, justamente, que reside a mágica: suscitar, com um texto, um bom debate a respeito de um assunto.
Quantas vezes você revisa seus textos antes de sentir que eles estão prontos? Você mostra seus trabalhos para outras pessoas antes de publicá-los?
Há um tempo atrás eu costumava revisar várias vezes o mesmo texto antes de finalizá-lo e encaminhá-lo para a publicação. No entanto, sentia que essa técnica, essa busca pela perfeição, às vezes inviabilizava o avanço. Cada vez que sentava para escrever, ao invés de partir de onde havia parado, eu precisava recomeçar, revisando o que já havia escrito, desde o começo.
Hoje, prefiro fazer uma revisão mais atenta após a produção do texto. Primeiro escrevo sem me preocupar muito com redundâncias, incongruências, para, uma vez terminado o texto, buscar saná-las. É comum, diante deste processo, que as versões iniciais de meus textos – que eu denomino “bagaços” – apresentem lacunas, observações pessoais, espaços a serem complementados a posteriori, no processo de finalização (por exemplo: checar uma fonte, buscar uma informação mais atualizada quando se trata de uma estatística, etc). Depois de ter colocado todas as ideias no papel, é hora da revisão. Aí é o momento de aprimorar, ler, reler, ajustar, pontuar, enfim, tentar deixar as ideias mais “organizadas” para o leitor.
Gosto muito de submeter meus textos a uma leitura prévia, de algum amigo ou colega, antes da publicação. No entanto, como sei das limitações de tempo de todos, nem sempre o faço. Ultimamente tenho produzido bastante em coautoria. Acho super produtivo e enriquecedor dividir o espaço de um texto com outra(s) pessoa(s), deixando-as à vontade, inclusive, para alterar/revisar aquilo que escrevi. É uma forma de desapego.
Como é sua relação com a tecnologia? Você escreve seus primeiros rascunhos à mão ou no computador?
Há muito tempo (muito mesmo) que não escrevo um texto à mão. Penso que nem o saberia fazer. Utilizo sempre o computador. Meu notebook é meu fiel companheiro. Eventualmente, tomo notas manuscritas (sempre tenho um “caderninho” à mão para isso).
De onde vêm suas ideias? Há um conjunto de hábitos que você cultiva para se manter criativo?
A arte me inspira muito. Tenho muitas ideias assistindo a filmes, passeando por um museu, ouvindo uma música ou lendo uma boa literatura. Nem sempre essas ideias efetivamente se transformam em texto, mas são fontes de inspiração.
Também costumo fazer “projetos mentais” de textos enquanto viajo. Como leciono em duas universidades que são distantes uma da outra – o que significa realizar viagens semanais entre duas cidades – aproveito a viagem para “divagar”. Muitas ideias jamais se concretizam. Mas muitos textos já surgiram assim.
O que você acha que mudou no seu processo de escrita ao longo dos anos? O que você diria a si mesmo se pudesse voltar à escrita de sua tese?
Acredito que, com o tempo, tendemos a ficar mais exigentes em relação ao conteúdo/densidade do texto mas, ao mesmo tempo, mais relaxados/autoconfiantes durante o processo de escrita. O ato de escrever vai se incorporando à nossa rotina e se torna muito mais confortável. Uma dica que eu me daria se pudesse voltar à escrita da minha tese: “vai com calma, essa não é a obra da sua vida.”
Que projeto você gostaria de fazer, mas ainda não começou? Que livro você gostaria de ler e ele ainda não existe?
Gostaria muito de poder produzir um roteiro de filme/documentário ou uma peça de teatro, sei lá, uma obra que pudesse chegar às pessoas por meio de uma outra forma de expressão que não a leitura propriamente dita. Tenho feito algumas experiências nesse sentido.
O livro que gostaria de ler e que não existe é o próximo livro do José Saramago (risos). Esse autor é minha maior inspiração e vivo à espera da descoberta de alguma obra inédita dele, que seja publicada postumamente…