Luiz Humberto França é jornalista e escritor.
Como você começa o seu dia? Você tem uma rotina matinal?
Minha rotina começa bem cedo. Como tenho programa de rádio às sete da manhã, acordo a cinco e chego à emissora às 6 para preparar o programa. Com isso a dedicação à literatura fica para os outros períodos do dia.
Em que hora do dia você sente que trabalha melhor? Você tem algum ritual de preparação para a escrita?
O meu rendimento é melhor de manhã. Nesse período do dia a disposição é maior e às vezes você inconscientemente pode absorver algum pensamento ou ideia que tivemos durante a noite, seja sua ou influenciada por forças maiores que nos guiam. Não podendo utilizar esse horário por outras rotinas, passo a me dedicar à tarde, evitando a noite por achá-la improdutiva pelo cansaço, sono etc.
Meu ritual de preparação para escrever é simples: procuro limpar a mente de preocupações do dia a dia com relaxamento ou meditação. Faço um cappuccino para despertar de vez e focar no que interessa e começo a trabalhar dentro do tema do livro. Se não estou começando do zero e não tem tema específico busco um assunto e a partir do que for surgindo vou direcionando para o que me interessa.
Você escreve um pouco todos os dias ou em períodos concentrados? Você tem uma meta de escrita diária?
O ideal seria escrever todo dia e ter essa disciplina, mas na prática isso é difícil pelos outros compromissos. Viver só de literatura deve ser ótimo e deve exigir uma disciplina quase militar. Como não é meu caso, a escrita vem em períodos concentrados, quando estou envolvido no projeto de um livro. Fora disso a escrita é esporádica e vai aumentando de acordo com o desenvolvimento do projeto do livro.
Como lancei livro recentemente, no momento atual diria que estou na entressafra. Aquele período em que você começa a se desapegar do ultimo livro e já parte para trabalhar ideias para o próximo. A tendência é que em breve eu mergulhe numa rotina de pelo menos uma hora por dia para dar andamento a esse novo trabalho.
Como é o seu processo de escrita? Uma vez que você compilou notas suficientes, é difícil começar? Como você se move da pesquisa para a escrita?
Meu processo funciona como se fosse uma extração de ouro. Faço a pesquisa, junto as informações que preciso no computador, depois vou separando o que presta e o que não presta – o ouro, as pedras preciosas de um lado e o cascalho e pedras sem valor de outro. O próximo passo é lapidar o que tem valor e, a partir daí, montar esse quebra-cabeças que é o livro, definir a melhor forma de contar a história.
Como você lida com as travas da escrita, como a procrastinação, o medo de não corresponder às expectativas e a ansiedade de trabalhar em projetos longos?
O autor que tem medo das críticas ou de não corresponder às expectativas ele não deveria escrever. Escrevemos para nós mesmos, para compartilhar nossa forma de pensar. Se tá bom para mim e eu tenho um senso crítico satisfatório, já é um filtro. Sei que tem escritores que mostram o texto para parentes e amigos antes como se fosse um laboratório. Não creio que isso funcione.
Prefiro trabalhar muito o livro e só entregá-lo quando acho que estiver no ponto certo. Sem exageros por que nunca vai ficar cem por cento. A ansiedade de ver o livro pronto é gostosa, mas não pode ser exagerada. Já passei da fase de achar que tenho que entregar o livro logo porque a humanidade espera ansiosamente para ler o material. Hoje vou com mais calma e com o propósito de entregar um conteúdo de qualidade e, de preferência, sem erros.
Quantas vezes você revisa seus textos antes de sentir que eles estão prontos? Você mostra seus trabalhos para outras pessoas antes de publicá-los?
São várias revisões antes de entregar o texto para a impressão. Difícil precisar quantas vezes eu mexo no livro, acredito que dezenas de mudanças são feitas durante o processo. Mudanças de ordens, mudanças de teor, de contexto, enxugamentos e depois a revisão ortográfica. Não costumo mostrar o trabalho pronto para ninguém, somente para o editor. O meu filtro e o editor são suficientes para garantir a qualidade do livro. Tem gente que mostra para parentes e amigos, mas penso que não é o ideal, porque só haverá consenso burro. Quem gosta mesmo vai elogiar e quem não gostou vai elogiar assim mesmo. Agora, se houvesse um grupo sério, imparcial, que analise sua obra de forma coerente, eu toparia mostrar para eles antes.
Como é sua relação com a tecnologia? Você escreve seus primeiros rascunhos à mão ou no computador?
Dificilmente uso rascunho de papel. Prefiro jogar as ideias direto no computador ou até mesmo no bloco de notas do celular. No computador é melhor ainda, porque você já joga na pasta ou arquivo certo e já vai mexendo ali mesmo. Minha relação com a tecnologia é tranquila, não sou dessa geração, porém curto bastante essas inovações, aplicativos. Sei tirar proveito do que a tecnologia oferece, sem exageros.
De onde vêm suas ideias? Há um conjunto de hábitos que você cultiva para se manter criativo?
As ideias não têm uma fonte única. Elas surgem de experiências pessoais, relações interpessoais, leituras, insights, contato por acaso etc. Costumo trabalhar vários temas ao mesmo tempo e os deixo maturando, para ver qual – ao acaso – vai crescer mais. Às vezes quando deixo o tema maturando passa pouco tempo e alguém, sem saber, me fala sobre aquele assunto e outras pessoas também. Coincidência ou destino, não sei. E aí quando fica forte demais é sinal que tá na hora de ser compartilhado em forma de livro. Outra forma são os trabalhos encomendados que, aí você não tem saída. Tem que produzir de forma sistemática e disciplinada para entregar dentro do prazo.
O que você acha que mudou no seu processo de escrita ao longo dos anos? O que você diria a si mesmo se pudesse voltar à escrita de seus primeiros textos?
Com o passar do tempo é natural que você aprimore o seu processo de escrita. Do primeiro livro até hoje, caminhando para o quarto, a experiência é outra e dá para usar esta expertise a seu favor. Ser mais objetivo, não perder tempo com coisas que não levam a nada, enfim, a gente fica mais focado, disciplinado. Passa a ter técnicas que dão mais produtividade.
Entrando na maquina do tempo e me encontrando escrevendo o primeiro livro eu daria algumas dicas, como: “amplie seus horizontes e organize melhor sua vida para encontrar mais tempo para se dedicar ao livro”.
Que projeto você gostaria de fazer, mas ainda não começou? Que livro você gostaria de ler e ele ainda não existe?
Existem vários projetos que ainda gostaria de fazer e que estão sendo trabalhados. Claro que nem todos vou conseguir transformar em livro, já que dependemos de mercado e algumas vezes de patrocínio, no caso de projetos maiores por meio da Lei Rouanet. Destaco um que está nesse bolo, que é sobre meio ambiente abordando os Pássaros Urbanos.