Luiz Antonio Aguiar é escritor, mestre em Literatura brasileira e professor em oficinas de criação literária.
Como você começa o seu dia? Você tem uma rotina matinal?
Quando não estou em viagem, percorrendo colégios, feiras e outros eventos literários, procuro ter uma rotina de trabalho. Até porque, para mim, escrever é trabalho. Não dá para escrever somente quando a gente se sente “inspirado”. Às vezes, tenho de “puxar a inspiração”, relendo o que escrevi no dia anterior, por exemplo, para pegar de novo “no tranco”… Geralmente, começo cedo, tipo antes das 9 horas, dou uma parada por volta das 13hs, retomo às duas, duas e meia, e vou direto até as 8 horas. Sou bastante “diurno” – não consigo escrever até tarde, nem virar a noite escrevendo. Preciso estar num lugar na medida do possível isolado, para mergulhar na minha história e no íntimo dos meus personagens. Escrevo direto no meu laptop, mas, quando acontecem aquelas “empacadas”, dou umas voltas pela casa. Procuro terminar meu dia já sabendo mais ou menos o que vai acontecer a seguir, ou seja, como vou retomar a história no dia seguinte. Ler à noite realimenta à beça minha cabeça, mesmo que o livro que estou lendo nada tenha a ver com o que estou escrevendo.
Em que hora do dia você sente que trabalha melhor? Você tem algum ritual de preparação para a escrita?
Como eu disse, só consigo escrever de dia. E a tarde geralmente é mais produtiva – estou mais engrenado, mais dentro da história, mais concentrado. Ao mesmo tempo, a pausa do meio do dia serve para mim para dar uma pensada e ver se estou no caminho e ritmo que a história pede. Minha preparação básica é rever o que escrevi antes. E também olhar de novo meu “roteiro”. Sempre tenho um “roteiro”, com o enredo, a sequência dos episódios, algumas falas etc… É claro que esse roteiro com frequência muda, quando a história “pede” um caminho que não estava previsto. Um personagem pode também “mudar de rumo”. Tudo isso vai acontecendo, à medida que a história vai se desenvolvendo. Quero dizer que a história acontece também à medida que é escrita. É quando ganha corpo, vitalidade. Pelo menos, acontece assim comigo.
Você escreve um pouco todos os dias ou em períodos concentrados? Você tem uma meta de escrita diária?
Não tenho meta diária. Às vezes, produzo um parágrafo e fico satisfeito. Ou revejo o que escrevi antes, faço ajustes, consertos, mudanças, e só. Para mim, o trabalho de escrever é um processo, vai acontecendo. Tem uma linha básica, um ponto a que eu quero chegar, e as mudanças de meio de percurso. Quanto mais eu avanço numa história, mais me envolvo nela, e portanto soluções que não estavam previstas surgem, caminhos aparecem, que são melhores, que têm mais impacto, do que aquele que eu havia pensado antes. Isso para mim é muito importante: impacto – estou permanentemente, a cada cena e a cada fala, pensando no impacto, no efeito que aquele trecho está causando no leitor. É uma obsessão… cativar o leitor, desde o primeiro momento. Aliás, é o que é mais pensado, nos livros que escrevo – o começo, os primeiros momentos, a página inicial, o primeiro capítulo. É ali que eu acho que tenho de ganhar meu leitor.
Como é o seu processo de escrita? Uma vez que você compilou notas suficientes, é difícil começar? Como você se move da pesquisa para a escrita?
Nem todo livro se move pela pesquisa. Mas, quando é assim, eu tento ler o máximo possível, anotar tudo o que me parece interessante, assistir a filmes relacionados, enfim, me envolver, me transportar para aquele “lugar” onde a história vai acontecer, e conhecer meus personagens, como se eles estivessem ao meu lado. Daí, tem um momento que a primeira cena começa a se formar, que as primeiras falas começam a surgir, dos esboços de personagens, das anotações. É o momento em que eu começo a “escrever” o texto. Mas, como eu disse, a pesquisa é um dos pontos de partida possíveis. Muitas vezes, a história é totalmente “inventada”. Daí, parte de anotações, de esboços que aos poucos se juntam, ganham falas, cenas.
Como você lida com as travas da escrita, como a procrastinação, o medo de não corresponder às expectativas e a ansiedade de trabalhar em projetos longos?
Bem, cada uma dessas “travas” tem sua maneira de ser superada, e depende do momento em que acontece. Geralmente, ler me ajuda nisso tudo. Eu começo a ler – às vezes sobre o tema do meu projeto de livro – e isso solta minha cabeça, “desaterrissa” meus pés. Me envolve. Preciso estar bastante envolvido – apaixonado mesmo – pelo que estou escrevendo. Caso contrário não acontece. Geralmente, um texto “trava” quando algo não está funcionando direito. Quando um personagem ou uma linha do enredo necessita ser mais desenvolvida, ou mudada.
Quantas vezes você revisa seus textos antes de sentir que eles estão prontos? Você mostra seus trabalhos para outras pessoas antes de publicá-los?
Não tem um número certo. Reviso meu texto muitas e muitas vezes. Cada vez que releio, tenho acertos a fazer. É às vezes um trabalho mais longo e intenso do que o de “escrever” – o “reescrever”. E mais exigente também. Eu não deixo passar nada que sinto que posso retrabalhar e fazer melhor.
Como é sua relação com a tecnologia? Você escreve seus primeiros rascunhos à mão ou no computador?
Sempre, direto no computador. Mas, tem também o momento das “anotações”, anteriores a tudo, que gosto de fazer a mão, num bloco novo, especialmente reservado para aquele texto. Sou fascinado por tecnologia, como ela entrou rápido na vida da gente, neste país. Daí, inclusive na temática de meus livros, procuro incorporar esse elemento. Tecnologias novas dão boas histórias.
De onde vêm suas ideias? Há um conjunto de hábitos que você cultiva para se manter criativo?
Essa é uma das perguntas mais difíceis de se responder. Creio que vêm em sua maioria dos livros que leio, embora essa relação nem sempre seja direta. É que ler me desperta alguma coisa, lá onde surgem as ideias. Não se trata de mágica, nem de “inspiração” – acho que tem a ver com entrar nessa realidade alternativa que chamamos de Literatura. De certo modo, tem sempre uma história correndo na minha cabeça.
O que você acha que mudou no seu processo de escrita ao longo dos anos? O que você diria a si mesmo se pudesse voltar à escrita de seus primeiros textos?
Acho que hoje consigo ser mais sintético, usar menos para conseguir mais. Há textos meus, lá do início, nos quais não mudaria nada. Outros, em que eu gostaria de ter ido mais direto ao ponto, trabalhar mais os enredos, talvez, a trama. Hoje estou bastante inclinado ao mistério ao suspense… Mas também em fazer histórias que tenham um toque de humor, outro de amor, outro de aventura – ou seja, um pouco de tudo. Quero alternar momentos, na minha história, mesmo que haja predominância de um gênero – como o terror, por exemplo.
Que projeto você gostaria de fazer, mas ainda não começou? Que livro você gostaria de ler e ele ainda não existe?
Acho que não sei responder nem uma pergunta, nem a outra. Principalmente a segunda. Há tanta coisa que ainda n]ao li… Que adoraria ler… Não dá tempo. Uma vida é pouco para a gente ler tudo o que tem vontade de ler. Minhas pilhas de livros “que eu compro e planejo ler” crescem sem parar. E que livro eu gostaria de escrever e ainda não escrevi… Talvez, o próximo livro. E, depois, o seguinte.