Lucas Perito é poeta, autor de “38 Movimentos”.

Como você organiza sua semana de trabalho? Você prefere ter vários projetos acontecendo ao mesmo tempo?
Na verdade, para mim, escrever acaba ocorrendo nos horários vagos que tenho fora do trabalho. Eu tenho um emprego que tem uma carga horária puxada, então não tenho uma rotina para escrever. Acabo escrevendo quando encontro tempo para poder produzir. Como é o caso destas respostas. Claro que quando ‘pinta’ algo, coloco no papel na hora que surge e, também, tenho os fins de semana para escrever e mexer nos projetos que estão em andamento. Mas não tenho uma rotina. Posso produzir de manhã, madrugada, num fim de semana, numa terça e por aí vai.
Sobre a segunda pergunta, tudo surge ao mesmo tempo e depois eu vou encaixando em projetos (poemas) diferentes, mas não sento para escrever voltado para um projeto específico.
Ao dar início a um novo projeto, você planeja tudo antes ou apenas deixa fluir? Qual o mais difícil, escrever a primeira ou a última frase?
É um ‘eterno’ fluir. Não que acredite em algo mágico ou superior como as musas me ditando aquilo que devo escrever, mas surgem palavras aqui, uma frase ali, em cima do que estou lendo, uma imagem de um filme, uma melodia de algo e vou anotando. Algumas vezes a coisa flui completamente e tenho um poema pronto, que só preciso ajustar. Outra vezes tenho pedaços separados, escritos em tempos diversos e tendo em mente coisas diferentes e que quando acabo mexendo, percebo que tal apontamento solto completa o que quero dizer em outro pedaço disperso.
Você segue uma rotina quando está escrevendo um livro? Você precisa de silêncio e um ambiente em particular para escrever?
Não chega a ser uma rotina. Mas gosto de silêncio absoluto ou uma música (normalmente instrumental) para me acompanhar enquanto vou laborando as ideias. Mas como não tenho rotina, algumas vezes escrevo tudo no metrô e depois só preciso passar para o computador. Nesse sentido, a única rotina de fato que tenho é esse silêncio ou música quando estou terminando um livro. Pois aí o trabalho é mais de cortar, ver com certa distância, analisar etc.
Você desenvolveu técnicas para lidar com a procrastinação? O que você faz quando se sente travado?
Nenhuma técnica. Já fui mais crítico no sentido de me cobrar por não produzir. Mas hoje sei que tenho os meus próprios tempos internos e que automaticamente as coisas vão se ajustando até eu chegar no resultado que quero.
Claro que acontece de ter um poema que está parado há muito tempo e que é essencial para algo que estou escrevendo. Em casos como esses, em que a procrastinação já está muito longa, me forço a escolher um dia para fazer a coisa andar, nem que seja um pouco à força.
Qual dos seus textos deu mais trabalho para ser escrito? E qual você mais se orgulha de ter feito?
Trabalhei durante anos fazendo livros de arte e fotografia, onde fazia os textos de acompanhamento. Esses foram os que deram mais trabalho, pois eram aqueles textos que foram pagos para eu fazer, e havia um prazo para entrega, algo que me cansa.
Mas em relação a trabalhos totalmente próprios, gosto do meu primeiro (e único) livro lançado (38 Movimentos, Lumme Editor, 2018). Há poemas ali que deram muito trabalho e outros que nasceram prontos e que só precisei ajustar. Entre o que está nesse livro e o que estou produzindo para um próximo, tenho o hábito de reescrever diversas vezes, até a ‘exaustão’. Nesse sentido, fico contente (orgulhoso) de cada poema que termino, até pelo simples fato de desistir de continuar reescrevendo – pelo menos por um tempo.
Mas para ser mais específico, deu muito orgulho fazer a antologia da obra poética do poeta uruguaio Alfredo Fressia, A Rosa Ilícita (no prelo), pois foi um trabalho cuidadoso e minucioso de entrar de cabeça em toda obra do autor, selecionar e traduzir mais de 50 poemas. Foram muitas idas e vindas, correções, ajustes etc. e o resultado ficou muito bom para todos aqueles que participaram do projeto.
Como você escolhe os temas para seus livros? Você mantém um leitor ideal em mente enquanto escreve?
Escrevo sempre os mesmos poemas. São os temas que me tomam desde sempre. Então, acabo não escolhendo, no sentido de “preciso dizer algo sobre isso”, mas sim eles acabam surgindo pois são os temas que estão numa espécie de inconsciente. Eles são a trama que sempre estará por baixo de cada poema.
Claro que acontece, muito raramente, de querer escrever sobre um tema específico. Mas me interessa mais escrever com uma palavra/frase específica, muito mais do que com um tema escolhido previamente.
Sobre o ‘leitor ideal’: acho que sou eu mesmo. Sei que existe um leitor ideal dentro da conjuntura em que vivemos atualmente, mesmo quando falamos de algo como poesia-brasileira-contemporânea, mas não consigo escrever pensando naquilo que seria melhor quisto dentro de um público específico e em voga.
Em que ponto você se sente à vontade para mostrar seus rascunhos para outras pessoas? Quem são as primeiras pessoas a ler seus manuscritos antes de eles seguirem para publicação?
Só quando está pronto para mim. Não mostro rascunhos. E de fato, não sou de querer mostrar. Acontece mais de amigos falarem “o que você está escrevendo?” e aí sim, envio para eles darem uma olhada. Mas, como falado, só aquilo que do meu ponto de vista está pronto. Isso não quer dizer que não aceite alterações e apontamentos, só acho importante enviar algo pronto e que tenho confiança, antes de enviar umas garatujas mal ajambradas. Não vamos ferir nosso ego já tão frágil.
Você lembra do momento em que decidiu se dedicar à escrita? O que você gostaria de ter ouvido quando começou e ninguém te contou?
Os romances são tão importantes para mim como a poesia. Se você me perguntasse meus escritores (as) favoritos (as) citaria na mesma quantidade romancistas e poetas. Mas aquilo que me deu impulso para escrever e que senti essa vontade quase que fora da minha escolha, foi quando li (quando adolescente) as Elegias de Duíno do Rilke. Sem pensar no ato de “quero ser poeta”, quase como algo automático, peguei um caderno qualquer e comecei a escrever umas coisas.
Sobre a outra pergunta, admito que não sinto falta de nenhum conselho que não me deram no começo. Mas levo aqueles que me dão no dia a dia, seja quando um poeta amigo aponta algo, ou leio/vejo algo que acaba sendo como um conselho para mim mesmo.
Que dificuldades você encontrou para desenvolver um estilo próprio? Algum autor influenciou você mais do que outros?
A poesia é perigosa. Há poetas que se você não se cuida, acaba inconscientemente copiando o estilo, ainda mais quando você está entranhado na leitura de um deles. Mas acho que de forma geral acabei achando o meu estilo, mesmo esbarrando aqui e ali no de outro, como é comum ao fazermos aproximações.
Para ficar só em poetas, poderia citar alguns como Rilke, Valéry, Cabral, Gastão Cruz, Orozco, Laforgue, Auden, Ungaretti, Cernuda, Vallejo, Villaurrutia, Piñera e Eielson.
Que livro você mais tem recomendado para as outras pessoas?
Para citar os mesmos de sempre: Em busca do tempo perdido e A educação pela pedra.