Lucas de Lucca é escritor e CEO da Flyve, uma startup para criadores de histórias.

Como você começa o seu dia? Você tem uma rotina matinal?
Nunca tive rotina e tenho certeza que se eu tiver uma rotina estarei medicado. Por ironia há duas semanas tenho uma receita de remédio para ansiedade na carteira o que pode significar que, em poucas semanas, essa resposta mude.
Entre as opções do começo do dia eu prefiro quando tenho café e alguns originais para ler. Analiso as inscrições de autores nacionais para a Flyve e tomo o café. Tomo tão devagar que fica frio. Outra opção é acordar apenas perto do horário do almoço, aí nesse caso pulo o café e almoço olhando os originais. Por vezes os originais se tornam vídeos no Youtube, outras vezes alguma conversa com a minha esposa. Mas no geral eu como ou bebo algo enquanto faço algo.
Em que hora do dia você sente que trabalha melhor? Você tem algum ritual de preparação para a escrita?
A escrita, propriamente dita, precisa de certa preparação pra mim. Primeiro, referências. Preciso estar cercado de referências sobre aquele tópico a ser escrito. Nem que eu mesmo escreva em folhas e cole nas paredes, algo ali precisa me deixar imerso. Além disso preciso de vento. Foi algo criado pela minha mente quando criei pela primeira vez de forma consciente. Eu estava na praia, não gostava de praia, batia vento e eu me senti confortável para escrever.
Normalmente escrevo quando tenho muito tempo livre. Ultimamente esse tempo sumiu, mas tenho muita fé que ele há de voltar.
Você escreve um pouco todos os dias ou em períodos concentrados? Você tem uma meta de escrita diária?
Escrevo quando tenho uma história que me obriga a escrever. Hoje tenho o privilégio de viver mais ajudando outros autores do que de fato lançando conteúdo meu. No entanto, preciso continuar lançando e escrevendo porque as histórias não me deixam em paz.
Costumo escrever um livro de trezentas páginas em um mês e trabalhar cinco ou seis pra aprimora-lo tanto na história, quanto escrita quanto como produto para o leitor. Ano passado, por exemplo, precisava escrever O Valor da Força, uma história de quase 800 páginas, e alcancei as 500 em 3 semanas.
Pra mim tudo é uma questão de foco.
Como é o seu processo de escrita? Uma vez que você compilou notas suficientes, é difícil começar? Como você se move da pesquisa para a escrita?
Sem dúvida a pesquisa é a parte mais divertida, além da roteirização. Quando se escreve as palavras acontecem. Elas fazem a parte delas, mas a demora em acontecerem, a lerdeza dos meus dedos, é a dificuldade.
Quando tenho conteúdo o suficiente, quando entendo o que realmente quero contar começo a escrever de fato. Aí me debruço, escolho uma trilha sonora, miro o vento em mim e escrevo até onde consigo.
Como você lida com as travas da escrita, como a procrastinação, o medo de não corresponder às expectativas e a ansiedade de trabalhar em projetos longos?
Normalmente se me sinto travado, algo não vai pra frente eu prefiro repensar aquele texto. Nunca na minha carreira breve tive uma história boa que me deixou travado. Por isso acredito sinceramente no poder da preparação e, dentro dela, das referências. Quando embebido de inspiração proposital e direcionado a uma história empolgante, o máximo que fiz foi mudar de ideia, mas nunca parei.
Quando parei é porque desde o início sabia que aquele roteiro não era bom. E as poucas vezes que insiste gerei filhos dos quais tenho vergonha.
Quantas vezes você revisa seus textos antes de sentir que eles estão prontos? Você mostra seus trabalhos para outras pessoas antes de publicá-los?
Não reviso diretamente meu livro, envio diretamente para outras pessoas. Betas sim, mas principalmente para pareceristas, analistas críticos e revisoras que confio. Também mando pra amigos escritores confiáveis e que leem rápido. Depois de saber a opinião dos outros sobre a história e sobre a escrita é que me debruço.
Acho isso produtivo. Seria péssimo passar três meses melhorando um texto, enviar a um crítico e ele apontar problemas que não percebi. Assim eles apontam muita coisa, mas ao menos eu consigo ser mais produtivo.
Como é sua relação com a tecnologia? Você escreve seus primeiros rascunhos à mão ou no computador?
Já tentei ser contemporâneo, mas sou neoclássico. Minha paixão é o rabisco e o rabisco no computador não existe. Me manifesto primeiro em papel ou outros materiais, como roupas. Tenho algumas peças que foram expressões de histórias que me incomodavam, mas eu não tinha tempo para conta-las. Por isso eu as visto.
Mas no geral escrevo roteiro, fichas e detalhes em papel. Colo tudo na parede ou penduro em painéis magnéticos e parto daí para o computador.
De onde vêm suas ideias? Há um conjunto de hábitos que você cultiva para se manter criativo?
Consumo de referências, das melhores as piores, de todos os cenários, mídias e fontes. Eu tento viver a vida e dizer sim para a maioria das experiências e isso me traz bastante inspiração.
O que você acha que mudou no seu processo de escrita ao longo dos anos? O que você diria a si mesmo se pudesse voltar à escrita de seus primeiros textos?
Conhecer técnica. Quando comecei criei meu livro que até hoje é mais citado, chama-se O Corvo Negro. Não tinha técnica e nem planejamento, apenas uma boa história e ânsia de escrever.
Hoje sei que planejando melhor e executando seguindo técnicas, minha obra poderia alcançar mais pessoas e gerar mais burburinho. Sem contar que me daria menos trabalho para lançar sua continuação.
Que projeto você gostaria de fazer, mas ainda não começou? Que livro você gostaria de ler e ele ainda não existe?
Gostaria de abrir uma imobiliária online, uma alternativa para imobiliárias onde tudo seja feito online. Como um Nubank ou Banco Inter com os bancos. Falo isso porque estou passando por um dos maiores estresses e perrengues da minha vida por culpa de imobiliárias. Culpem eles pelas histórias melancólicas que virão.
O livro que eu espero um dia ver, e ser real, é “Hipnose para convencer pessoas a lerem ficção”.