Liz Rabello é escritora.
Como você começa o seu dia? Você tem uma rotina matinal?
Sou escritora profissional por acaso. Professora por opção. E como tal, ao desenvolver uma atividade de escrita pessoal, participava com os meus alunos da mesma. E foi assim que me descobri com talento para escrever. Minha rotina de vida está ligada à vida e não à escrita. Meus textos poéticos ou em prosa nascem de fotos, de vivências, de diálogos com quem amo, de indignações com a política, com as injustiças. A escrita é consequência.
Em que hora do dia você sente que trabalha melhor? Você tem algum ritual de preparação para a escrita?
Certa vez estava numa trilha, caminhando, de repente nasceu a ideia: um conto “Código AGV”. Pistas que ao longo da narrativa iriam sendo descobertas. A primeira delas: “Siga sempre os girassóis, cinemas de entardecer”. Corri de volta para casa e comecei a escrever. Dali pra frente sempre levo papel e caneta a todos os lugares. Se alguma ideia brilhar será passada para o papel. A memória falha, a inspiração não é uma máquina que se liga a um determinado período do dia ou da madrugada. Já me aconteceu de sonhar com um poema, ao acordar, eu o transcrevi para o computador e tornei a dormir.
Você escreve um pouco todos os dias ou em períodos concentrados? Você tem uma meta de escrita diária?
Participo de desafios em grupos de WhatsApp. Poesia Coletiva, Poemas Curtos. Escrevo quando o celular me avisa que algo novo está acontecendo por lá. Não tenho metas diárias. Não consigo me impor regras. A escrita é para mim um lazer. Um momento de descontração. Uma aventura. Escrevo porque gosto.
Como é o seu processo de escrita? Uma vez que você compilou notas suficientes, é difícil começar? Como você se move da pesquisa para a escrita?
Não tenho experiência na escrita de romances. Escrevo crônicas, contos, ensaios. Amo escrever poesias. Fiz Latu Sensu em Literatura Moderna pela Santana, SP. Mestrado em Comunicação e Semiótica. O máximo que escrevi foram os trabalhos de finais de semestre de cada crédito que cursei pela PUC São Paulo. Escolhia o material de pesquisa, de acordo com os objetivos de cada matéria. Escrevia minhas impressões pessoais. Selecionava as melhores e fechava o trabalho com contextualizações que ia completando ao longo das leituras e fichamento de livros afins, com a ajuda, é claro, do mediador, orientador do semestre. Tenho facilidade para criar diálogos intertextuais, descobrir relações temáticas. Na época, não tinha condições financeiras para publicar meus escritos. Ficaram perdidos no tempo, infelizmente.
Como você lida com as travas da escrita, como a procrastinação, o medo de não corresponder às expectativas e a ansiedade de trabalhar em projetos longos?
Só consigo escrever sobre o que quero, gosto e escolho. Não tenho medo de não corresponder às expectativas de terceiros. Minha maior dificuldade foi o Mestrado, porque tive que me adaptar aos objetivos e moldes do meu Orientador. De qualquer forma o recado que passo é a humildade. Ouvir atentamente as indicações de quem está do teu lado para o que der e vier. Principalmente ler os livros indicados. Não ter medo de reagir aos textos de forma diferente de quem já leu. Confiar na própria leitura e dialogar sobre o texto. Para mim deu certo.
Quantas vezes você revisa seus textos antes de sentir que eles estão prontos? Você mostra seus trabalhos para outras pessoas antes de publicá-los?
Certa vez li um comentário de um escritor famoso, se não me engano Luís Fernando Veríssimo. “O escritor publica seus escritos porque não aguenta mais revisá-los”… Bem assim, cada vez que leio, mudo algo. Dou muito trabalho ao editor diagramador… Não mostro meu texto a ninguém. Escrevo e publico. Tenho um blog, que alimento, diariamente. O que o leitor pensa é com ele. Direito dele. Gostar ou não.
Como é sua relação com a tecnologia? Você escreve seus primeiros rascunhos à mão ou no computador?
Sou muito livre. Depende do espaço em que estou. Em Paraty, conhecendo Trindade, me sentei numa pedra e comecei a escrever. Tudo muito confortável. Em casa, vou direto no computador. Se o celular tem carga, é com ele que escrevo.
De onde vêm suas ideias? Há um conjunto de hábitos que você cultiva para se manter criativa?
Escrevo memórias, fatos reais recheados à ficção quando esta falha. Escrevo indignações, “Cordel para um Golpe”, totalmente fiel à realidade das notícias lidas e recortadas da off mídia, fora da Globo e afins. Escrevo armas palavras para me manter viva e conectada com a vida. Imagens me fascinam. Muitas poesias nasceram de fotografias minhas ou de amigos.
O que você acha que mudou no seu processo de escrita ao longo dos anos? O que você diria a si mesma se pudesse voltar à escrita de seus primeiros textos?
Em relação a conteúdo, valorizo cada etapa. Não mudaria nada. Tudo tem a ver com a sua vivência. No entanto, observo que usava muito a exclamação nos primeiros poemas. Passei a escrevê-los sem pontuação. Livres.
Que projeto você gostaria de fazer, mas ainda não começou? Que livro você gostaria de ler e ele ainda não existe?
Tenho quatro livros infantis. Três deles para um projeto “Adote, Doe, Não abandone”. O personagem principal é uma cadelinha que adotamos da rua. Desejo dar continuidade a este projeto. Quero também publicar um livro totalmente ilustrado com dobraduras. O tema poderia ser a última ararinha azul de Curuçá, na Bahia, antes de entrar em extinção. Conheço a história e quero escrevê-la.