Linaldo Guedes é jornalista, poeta e editor.

Como você organiza sua semana de trabalho? Você prefere ter vários projetos acontecendo ao mesmo tempo?
Na verdade, minha preferência seria trabalhar em apenas um, mas nestes tempos rápidos que vivemos, é muito difícil acontecer. No meu caso, também sou editor, além de poeta. Então, já começo a semana envolvido em diversos projetos diferentes de autores e autoras que editamos pela Arribaçã. Organizar os livros, editar, paginar, imaginar capa, conversar com nossos autores e autoras, pensar em promoções no Instagram da editora, enfim, uma gama de ações e projetos. Pouco tempo sobra para o poeeta. Quando sobra.
Ao dar início a um novo projeto, você planeja tudo antes ou apenas deixa fluir? Qual o mais difícil, escrever a primeira ou a última frase?
Sou bem metódico nas coisas profissionais e literárias, só em relação a amores deixo-me guiar pelas emoções. Então, geralmente planejo tudo, o que não impede que o impoderável altere algo no decorrer do tempo. Veja você, que quando lancei meu primeiro livro – Os zumbis também escutam blues (1998) – eu já sabia que queria mais três livros e a linha de cada um desses livros. Mas ai veio o imponderável e alterou em parte os planos. Dois livros não planejados surgiram no meio do caminho. Lógico, que falo de livros de poemas. Meus outros livros – acadêmicos ou jornalísticos – fazem parte de outros projetos e nesses me guio pelo senso de oportunidade ou pelos convites que recebo. Sobre o que é mais difícil escrever, sempre achei a primeira frase. Em tudo. Em relação a poesia ou texto jornalístico. Saindo a primeira frase ou o primeiro verso, tudo flui naturalmente.
Você segue uma rotina quando está escrevendo um livro? Você precisa de silêncio e um ambiente em particular para escrever?
Não sigo rotina. Meus livros demoram a sair justamente por essa falta de rotina diária. Também não preciso de silêncio para escrever. Pelo contrário. Só escrevo e leio com o som ligado, pode ser música ou um programa de rádio, ou então uma televisão ligada. Não me atrapalha. O silêncio que me atrapalha. Talvez porque quando comecei como repórter a redação era uma algazarra só, com televisões e rádios ligados simultaneamente, telex, barulho de máquina datilográfica, pessoas conversando e até gritando… Me acostumei com o barulho. Tenho pavor de silêncio. Gosto de escrever em meu quarto, no meu micro, com os livros que consulto ao lado. Mas quando preciso escrever mesmo, faço isso em qualquer lugar, sem problemas.
Você desenvolveu técnicas para lidar com a procrastinação? O que você faz quando se sente travado?
Não. Esse lance da procrastinação é foda mesmo. Estou com um livro de poemas praticamente pronto desde 2015, mas fico sempre adiando sua conclusão e resultado: novos poemas vão surgindo e sendo incorporados ao livro e ele não termina nunca. Vou ver se consigo este ano. Não tenho travamentos. Tenho períodos longos em que não surgem poemas novos. Mas quando decido escrever, eles saem.
Qual dos seus textos deu mais trabalho para ser escrito? E qual você mais se orgulha de ter feito?
De poesia, o “Metáforas para um duelo no sertão”, livro que lancei em 2012 pela Patuá. Considero meu melhor livro, mas creio que o próximo também será muito bom, se conseguir concluir. De forma geral, tenho orgulho de todos os meus livros. Sou pai coruja de todos eles. Mas tenho orgulho especial do livro que foi resultado de minha pesquisa de mestrado sobre as relações entre a poesia de Augusto dos Anjos e o Budismo. “O Nirvana do Eu”, o título do livro. O orgulho não é só em relação ao resultado final da pesquisa e depois da obra. Mas porque foi uma pesquisa que mudou minha vida, minha forma de encarar o mundo e temas que nos tocam muito, como a morte e o sofrimento. Creio que cresci muito como ser humano quando fiz essa pesquisa.
Como você escolhe os temas para seus livros? Você mantém um leitor ideal em mente enquanto escreve?
Meus livros de poemas são todos temáticos, a exceção do primeito, que é uma coletânea do que produzi até então. O segundo (Intervalo Lírico) é sobre uma relação amorosa com começo, meio e fim; o terceiro tem o sertão como tema (Metáforas para um duelo no sertão), o quarto é erótico (Tara), o quinto, ainda em gestação será sobre lugares (Cabo Branco e outros lugares que não estão no mapa) e o que prentendo que seja o últmo (Ãgama) ainda não quero revelar o tema. Não vou mentir: quando estou escrevendo um poema não penso no leitor, penso no que está me motivando a escrever aquilo. Mas quando organizo um livro de poemas, todo o livro é feito pensando no leitor – os capítulos, a ordem dos poemas, a capa, etc.
Em que ponto você se sente à vontade para mostrar seus rascunhos para outras pessoas? Quem são as primeiras pessoas a ler seus manuscritos antes de eles seguirem para publicação?
Não mostro rascunhos de poemas meu a ninguém antes de publicar. Com exceção para quem convido para prefaciar o livro.
Você lembra do momento em que decidiu se dedicar à escrita? O que você gostaria de ter ouvido quando começou e ninguém te contou?
Escrevo desde pequeno. Talvez porque seja o mais novo de uma família onde os dois irmãos mais velhos são jornalistas. Então, nunca faltaram livros e revistas para ler. Creio que por volta dos 10, 12 anos comecei a fazer poemas, ruins, é claro, mas fazia. Lancei meu primeiro livro com 30 anos incentivado por amigos poetas. Já era jornalista desde os 21 anos e tinha coluna diária nos jornais de João Pessoa, mas não me atrevia a publicar um livro de poemas. Tinha vergonha, medo, insegurança. O poeta Sérgio de Castro Pinto foi fundamental no sentido de me sentir capaz de publicar um livro.
Em relação a segunda pergunta: o segmento literário, assim como todo segmento, é corporativista. Quase ninguém revela segredos aos iniciantes. Parece que isso faz parte da índole humana. Por isso, não lamento ter ou não ouvido algo. Em minhas palestras costumo dar algumas dicas para quem está se iniciando no mundo literário, mas muita coisa a pessoa só aprende na prática. Afora, que tem muito jovem arrogante que pensa que já sabe tudo e faz ouvidos de mercador a conselhos dos mais velhos.
Que dificuldades você encontrou para desenvolver um estilo próprio? Algum autor influenciou você mais do que outros?
Dois autores mexeram muito comigo: Drummond e Fernando Pessoa. Eles foram determinantes na minha paixão pela poesia. Mas não diria que eles me influenciam. Tenho um estilo que quem acompanha minha poesia saca na hora. Um estilo que mistura beatniks, marginais, modernistas, clássicos, filosofia e cotidiano, mas com um olhar particular meu, sem copiar ninguém. Não abro mão de vida em meus poemas. Para mim, a poesia não se resolve enquanto mera metalinguagem. Sinto falta de vida em muitos poemas que venho lendo por ai, principalmente dos homens. A poesia feita por mulheres está muito melhor do que a dos homens. Justamente porque a delas têm vida. A poesia de hoje está muito parnasiana. Muita forma e pouco conteúdo.
Que livro você mais tem recomendado para as outras pessoas?
Recomendaria toda poesia de Drummond, Cabral, Pessoa, Bandeira, Gilka Machado e Augusto dos Anjos. A poesia de Lorca. A prosa de Garcia Marquez, Clarice, Jane Austen, Saramago, Cortazar, Graciliano e Rosa. O teatro de Nelson Rodrigues. Os ensaios de Rilke, Sartre, Schopenhauer. Tanta coisa… Leiam! Leiam todos os poetas, mas não deixem de ser vocês. Leiam todas as prosas e vejam como temos narrativas lindas e como isso pode ficar lindo num poema. Leiam ensaios, teorias, mas sigam suas próprias regras e seus próprios estilos. Não copiem ninguém. Sejam antropofágicos. Mas não copiem.