Leandro Carlos Esteves é escritor, jornalista, pesquisador e candidato a roteirista.

Como você começa o seu dia? Você tem uma rotina matinal?
Acordo nunca depois das 8, na maioria às 6:30hs. Tomo café lendo (e ouvindo) notícias e cuido da Kika, minha cachorra. Me exercito um pouco. Levo minha esposa ao trabalho e volto um pouco mais às notícias, respondo e-mails e coisas como: pagar boletos e etc.
Em que hora do dia você sente que trabalha melhor? Você tem algum ritual de preparação para a escrita?
Prefiro trabalhar o mais cedo possível. Não tenho nenhum ritual para escrever, a não ser ler bastante, em especial os clássicos (leio, de novo, Sthendhal e Kafka) além dos contemporâneos brasileiros e língua portuguesa, temperados com dicionários (adoro ler dicionários).
Você escreve um pouco todos os dias ou em períodos concentrados? Você tem uma meta de escrita diária?
Escrevo todo dia, quer profissionalmente (vez em quando a atividade literária se confunde com o trabalho, no meu caso) ou com literatura, o problema é que jogo fora a maioria do que escrevo. Não tenho meta diária, lembro que a Hilda Hilst tinha e ríamos dela porque ele escrevia muito mais do que a meta, tornando-a ociosa.
Como é o seu processo de escrita? Uma vez que você compilou notas suficientes, é difícil começar? Como você se move da pesquisa para a escrita?
Vez em quando não tem pesquisa, além da memória pessoal, outras praticamente só tem pesquisa, depende do tema.
Sou de natural preguiçoso. Gosto de ser ou ter a ilusão que sou. Vai daí que – na literatura- o tempo é meu aliado. Não tenho pressa. Escrevi um livro de contos que demorou 30 anos para ser editado. Tenho um romance no prelo que mereceu 10 anos mais ou menos. Minha mania é escrever e guardar. Se o que escrevi ficar na memória, me espicaçar vez por outra, é porque merece ser trabalhado e retrabalhado, quantas forem necessárias. Gosto de cortar texto, fazer sair sangue.
Como você lida com as travas da escrita, como a procrastinação, o medo de não corresponder às expectativas e a ansiedade de trabalhar em projetos longos?
Noto sua preocupação com as travas da escrita, a dificuldade de começar, o medo da página em branco. Tenho e não tenho. Ocasiões existem em que saio correndo para escrever com pavor danado de esquecer uma frase. Isso nunca acontece com uma ideia, mas com construções felizes de sentenças, frases, parágrafos. Acontece também de sentar e não sair nada. Paciência. Você pode achar que tem algo a escrever, mas não tem. Geralmente são repetições, digressões do que já está dito e bem-dito! Se não é uma coisa original, pra quê encher a paciência do leitor? Essa é a causa mais comum de jogar fora o que escrevo. Tempo atrás eu tinha prazer em amassar uma folha datilografada, hoje o prazer é deletar.
Quantas vezes você revisa seus textos antes de sentir que eles estão prontos? Você mostra seus trabalhos para outras pessoas antes de publicá-los?
Vezes sem conta. Só concluo textos (sou jornalista, roteirista e pesquisador além de escritor) por decreto. Dou-lhes por terminado. A faxina e a escrita não tem fim, são atividades gêmeas. Sempre mostro (coitada da Leusa), mesmo sem acabamento. Tem alguns amigos que os chamo de beta testeiros. Afinal, você vai ter de mostrar para o editor, supervisor, diretor, copy-desk, revisor antes da publicação. É obrigatório e eu sempre considero as sugestões. Pode ser que não as adote, mas analiso tudo que me falam.
Como é sua relação com a tecnologia? Você escreve seus primeiros rascunhos à mão ou no computador?
Nem sei mais assinar meu nome. Tecladiei-me definitivamente. Tomo notas a mão e só. Mesmo assim, velho repórter, uso uma espécie de estenografia, por exemplo, palavras em “dade” são duas barras //; capital é K, palavras em “ente” transformam-se em um travessão, além dos resumos: que é q, texto é tx, beijo é bj…
De onde vêm suas ideias? Há um conjunto de hábitos que você cultiva para se manter criativo?
Vem de muitos lugares, de muitas coisas, geralmente inesperadas. Tenho vários contos que foram sonhos que me acometeram. Sonho como todo mundo. Quase nunca me lembro deles e acredito até não ter sonhado, o que é impossível. Mas tive uma dúzia deles que se recusaram ao esquecimento. Se impuseram. Então os escrevi (no meu livro de contos: Anhangaçu). Poucos literais, os outros tive de completá-los (havia lapsos que não davam uma sequência lógica, apenas imagens). Creio que esses sonhos têm origem em filmes que assisti (os filmes são poderosos). Ainda tem mais uma meia dúzia que por enquanto não consegui escrever.
Outras vezes são fatos marginais de livros, especialmente de história; detalhes que o autor apenas aponta sem maior atenção, mas que por acaso me interessam. Outras histórias são frases, parágrafos e não uma “ideia”, escrever pelo texto, por escrever, despertar palavras que estão mudas, congeladas em forma de dicionário, usá-las, impedir que elas morram. As palavras são símbolos e por isso tem memória e vida própria.
Outras ainda são reminiscência de juventude, matérias de jornal etc.
Como escrevo sempre, não há um hábito específico para a criação. Anoto tudo… o que merece ficar, ficará.
O que você acha que mudou no seu processo de escrita ao longo dos anos? O que você diria a si mesmo se pudesse voltar à escrita de seus primeiros textos?
Demorei muito para escrever como escrevo agora. Vivo de escrever desde meus 15 anos e nunca me faltou pão, porque poucos sabem escrever, então sou trabalhador essencial. Devo isso a Machado de Assis. Tropecei em Memórias póstumas de Brás Cubas e aprendi maravilhado que escrever não me era complicado: os capítulos eram curtos, as frases simples, claras, exatas.
Não existem “primeiros textos”. Só publiquei literatura “ficcional” aos 56 anos. Como disse, não tenho pressa.
Que projeto você gostaria de fazer, mas ainda não começou? Que livro você gostaria de ler e ele ainda não existe?
Tenho projetos. Por ora, os roteiros “de encomenda” tomam meu tempo. Gosto deles, mas projetos pessoais vão esperar um pouco. São mais contos. O livro que gostaria de ler é o meu romance (memórias de um melancólico delirante) que deveria ter sido publicado há um ano, mas a pandemia adiou. Quem sabe mais uns 45 dias e ele venha à luz.