Laura Navarro é poeta, estudante de jornalismo na Faculdade Cásper Líbero.
Como você começa o seu dia? Você tem uma rotina matinal?
Sou estudante universitária e estagiária, então, sim, tenho uma rotina inflexível. Digo que meu dia só começa quando coloco maquiagem e entro no carro ou no ônibus, e é aí que meu dia começa. Costumo ouvir bandas de darkwave, post-punk, goth rock, black metal e shoegaze enquanto observo a mesma paisagem de sempre.
Em que hora do dia você sente que trabalha melhor? Você tem algum ritual de preparação para a escrita?
Particularmente, não existe um momento do dia, mas, enquanto estudante de jornalismo, eu tenho a sensação (mas isso vem mesmo de quando ainda estava na escola, com aquele combo de matemática e física) de que algumas aulas despertam algo muito pujante dentro de mim, do qual eu preciso colocar para fora. Tendo a ser uma pessoa que sente as coisas em excesso, logo, qualquer sentimento me é aproveitado como inspiração, e como emoção não se trata de matemática, o sentir pode ocorrer a qualquer hora do dia. Mas, em geral, escrevo de manhã, durante a aula, ou à noite, quando estou me desligando das atividades. Sou impulsiva, geralmente penso em alguma frase ou palavra específica e delineio algo a partir dessa ideia/palavra/frase central.
Você escreve um pouco todos os dias ou em períodos concentrados? Você tem uma meta de escrita diária?
Procuro escrever um pouco todos os dias, pelo menos um poema ou conto. No entanto, às vezes, a minha própria avalanche me incapacitava de criar coisas bonitas. Existem períodos, porém, em que eu escrevo mais, mas nunca me afasto totalmente, até porque eu uso isso como forma de terapia, de entender quem sou e o que eu sinto de fato. A respeito de metas específicas e bem estruturadas, eu me dedico ou as estabeleço se estiver elaborando um romance ou um projeto de contos, como foi o caso do meu (atualmente) magnum-opus, Natasha, e da minha plaquete de contos. E aí, mergulho completamente.
Como é o seu processo de escrita? Uma vez que você compilou notas suficientes, é difícil começar? Como você se move da pesquisa para a escrita?
Eu me considero um pouco dada às emoções nesse sentido, em especial a paixão, mas eu gosto de me ater a poemas, a linguagens e a ideias de outros antes de mim, como os simbolistas, que são a minha maior inspiração no momento. Eu me movo de forma estética, tenho facilidade em conectar várias linguagens, então as coisas fluem rapidamente, e eu não posso pensar demais pois, reconheço, perco o fio da meada. Preciso virar a chave na hora do vislumbre. Paradoxalmente, eu apresento bastante disciplina nisso, geralmente criando notas mentais ou mesmo estudos para depois vomitar. Sou meio modernista.
Como você lida com as travas da escrita, como a procrastinação, o medo de não corresponder às expectativas e a ansiedade de trabalhar em projetos longos?
Lido com isso, em geral, passando mais tempo lendo, e lendo bastante. Se eu me afastar da escrita, eu enlouqueço, me sinto extremamente vazia e entediada, então eu realmente não posso deixar isso de lado. Essa ansiedade não me abate, também, porque quando eu me dedico a algo que exija mais de mim, digamos, um romance, eu me ponho à determinação daquilo. A despeito da insegurança, acho… É um sentimento que eu tento calar em minha mente. Gosto de correr e caminhar para arrancar esses pensamentos de mim. A catarse também é cura.
Quantas vezes você revisa seus textos antes de sentir que eles estão prontos? Você mostra seus trabalhos para outras pessoas antes de publicá-los?
Certa vez, li uma entrevista da Paris Review com a Elizabeth Bishop em que ela dizia que geralmente só terminava seus poemas meses depois de os ter começado. E eu faço um movimento mais ou menos nesse estilo, geralmente com o auxílio de poetas mais velhos, como meus grandes amigos Donny Correia, Anna Karenina, Graziela Brum e Rafael Tahan. Geralmente, faço poucas revisões que acontecem em períodos distintos. Fernando Pessoa já dizia que é necessário se distanciar do eu para criar.
Gosto de mostrar meus textos para meu namorado, primeiro, e, depois para meus amigos mais próximos ou para alguns professores. Às vezes, dedico alguns textos para pessoas com quem tenho contato, geralmente porque algo que elas falaram soou interessante.
Também reviso meus poemas uma ou duas semanas depois de sua elaboração, para colocar em meu Tumblr.
Como é sua relação com a tecnologia? Você escreve seus primeiros rascunhos à mão ou no computador?
Isso depende do que estiver mais à mão no momento, mas tenho uma relação de posse com meus cadernos. Quando a inspiração é excessiva, me vejo escrevendo em papéis avulsos ou cadernos da faculdade. Mas o Tumblr também fornece um escape para isso, algumas vezes, assim como o bloco de notas do celular.
De onde vêm suas ideias? Há um conjunto de hábitos que você cultiva para se manter criativa?
Minhas ideias vêm de outros textos, como já diria Bahktin, de falas alheias, momentos do dia em que capto, como uma boa flaneuse. E sim, eu mantenho um conjunto de hábitos que envolvem muita leitura, muita escuta, muito… consumo cultural, no geral, e anotações e esboços. Minha mente é extremamente hiperativa, então estou sempre cozinhando ideias. Uma vez, escrevi um texto com base no nome de uma marca de vodka que achei interessante durante uma pesquisa no trabalho e relacionei com um poema de Rimbaud.
O que você acha que mudou no seu processo de escrita ao longo dos anos? O que você diria a si mesma se pudesse voltar à escrita de seus primeiros textos?
Comecei a escrever literatura por prazer quando ainda não era nem adolescente, eu tinha apenas doze anos, logo, meus hábitos mudaram e mudaram muito devido ao meu amadurecimento. Costumo dizer minha escrita se “estabilizou” ao longo dos anos. E eu não diria nada a mim mesma, essencialmente, pois aquilo era a experimentação de algo que descobri ser uma vocação. Mas, talvez, ir com mais calma e com menos impulsividade. E ouvir mais o Donny, pois, desde aquela época, quando o conheci na Casa das Rosas, ele se tornou um mentor para mim – não só para a literatura, mas para a vida também. Donny me ensinou, por exemplo, o valor da desconfiança, tanto auto quanto alter, para a elaboração e revisão de poesia e, também, para a vida no trânsito entre diferentes ambientes.
Que projeto você gostaria de fazer, mas ainda não começou? Que livro você gostaria de ler e ele ainda não existe?
Eu gostaria de criar um grupo de criação voltado ao Simbolismo e a esse tipo de atividade, que envolveria, por exemplo, a flânerie. Antes de começar a estagiar, eu costumava a praticar esse tipo de caminhada pela avenida Paulista (estudo na Cásper Líbero), que rendia bons textos. Estou com um projeto com a Dani Rosolen acerca de saúde mental e como abordar isso na literatura. Pretendo elaborar, com ela, algo sobre psicologia e conceitos psicanalíticos. Gostaria de ler mais livros sobre esse assunto, com abordagens diferenciadas, sem ser, necessariamente, alto extremamente elitizado. Tive essa idéia após assistir Neon Genesis Evangelion, que aborda questões freudianas e identitárias de forma compreensível, já que é feita numa linguagem mais voltada para o público adolescente. Achei tão genial que estou procurando fazer algo parecido dentro da literatura, tentando conectar com outras abordagens – algo que aprendi com outra grande poeta, e minha professora no futuro, Cândida Almeida.