Karina Heid é escritora e psicóloga.
Como você começa o seu dia? Você tem uma rotina matinal?
Quando estou escrevendo a páginas da manhã (técnica sugerida na década de 30 por Dorothea Brande, e popularizada por Julia Cameron no livro O Caminho do Artista, que permite que a gente acesse vozes interiores, sábias e criativas) acordo meia hora mais cedo, sento na frente do papel e escrevo três páginas (ou vinte minutos). O tema? Qualquer coisa, desde pensamentos aleatórios até versões de contos de fadas vindos de algum lugar pouco visitado da mente. Adoro!
Em que hora do dia você sente que trabalha melhor? Você tem algum ritual de preparação para a escrita?
Não tenho como escolher: as crianças vão para a escola à tarde, e é a tarde que escrevo. À noite meu marido fica com elas, e continuo a escrever. Rendo melhor por volta das quatro, quando já escrevi bastante e estou “aquecida”.
Você escreve um pouco todos os dias ou em períodos concentrados? Você tem uma meta de escrita diária?
Escrevo todos os dias. Não estipulo metas, só durante os meses de NanoWriMo, ou quando preciso terminar um livro (aí me forço a escrever um capítulo por dia).
Como é o seu processo de escrita? Uma vez que você compilou notas suficientes, é difícil começar? Como você se move da pesquisa para a escrita?
Preciso ler muito durante a escrita. Se estou escrevendo romances, leio romances. Preciso ouvir vozes diferentes, preciso achar uma cadência entre o que escrevo e a “música” do romance. Mas não só romance basta: preciso consumir palavras de todos os tipos, e o engraçado é que as vozes desses escritores vão influenciando devagarinho a minha própria escrita. Minhas frases ficam mais bonitas, meus argumentos mais sólidos, os diálogos mais ricos. Não tenho um escritor fixo, qualquer boa escrita serve. Por isso, jamais leio livros mal escritos. Acredito firmemente que uma escrita ruim pode nos influenciar.
Como você lida com as travas da escrita, como a procrastinação, o medo de não corresponder às expectativas e a ansiedade de trabalhar em projetos longos?
Escrevendo. Quando entendi que não escrever (consequências das travas, do medo e da ansiedade) era pior que escrever um livro pouco relevante (era um dos medos bobos que eu tinha), nada mais me parou. Não tenho mais nenhum medo, ou ansiedade. escrever para mim é algo curativo, intrínseco a quem eu sou, e por isso jamais deve ser abandonado. Nunca mais me vejo parando, só se eu quiser. Foi pensando em vários desses temas que criei o meu curso de escrita terapêutica (disponível aqui): porque como eu, muitos outros acham na escrita a cura para qualquer cosia. Inclusive para as travas, os medos e ansiedades de escrever.
Quantas vezes você revisa seus textos antes de sentir que eles estão prontos? Você mostra seus trabalhos para outras pessoas antes de publicá-los?
Milhares. Milhares, milhares, milhares. Acho que nunca paro. Sou distraída, por isso preciso revisar milhões de vezes. as reviso milhões de vezes para cortar todas as palavras que não interessam. Leitura precisa correr como rio, como um carro em uma pista de alta velocidade. Não pode haver quebra-molas (palavras rebuscadas, enrolações, chavões, explicações inúteis); tem que deslizar como criança em tobogã.
Como é sua relação com a tecnologia? Você escreve seus primeiros rascunhos à mão ou no computador?
Na escrita matinal e terapêutica, à mão. Livros, no computador.
De onde vêm suas ideias? Há um conjunto de hábitos que você cultiva para se manter criativa?
Minhas ideias vêm de qualquer lugar. De um diálogo, uma história contada, uma imagem, uma foto. À noite, quando todo mundo em casa está dormindo, elas chegam com tudo. Sempre preciso ter um caderninho na mão.
O que você acha que mudou no seu processo de escrita ao longo dos anos? O que você diria a si mesma se pudesse voltar à escrita de seus primeiros textos?
A concisão. Antes eu achava que boa escrita era floreio, descrições, uma coisa bem “rococoniana/barroca” (risos) Hoje estou mais para o minimalismo. Acho que a história é a coisa mais importante do ofício, por isso, o foco está em avançá-la, e jamais fazer rodeios para chegar até ela.
Que projeto você gostaria de fazer, mas ainda não começou? Que livro você gostaria de ler e ele ainda não existe?
Deus, quero fazer TUDO, quero ler TUDO, queria viver mil vidas. Como só tenho essa, não perco tempo com nada que não seja livros (Livros e a família, claro).