Juliana Borel é escritora, jornalista e assistente editorial da Editora e Fundação Cultural Casa Lygia Bojunga.
Como você começa o seu dia? Você tem uma rotina matinal?
Sim! Eu sou uma pessoa que, de certa forma, precisa de rotinas. Me desorganizo bastante quando elas sofrem alguma alteração (Freud deve explicar, eu acho!). Durante a semana, acordo bem cedo e a primeira coisa que tenho feito, ultimamente, é meditar. É algo novo pra mim, inclui recentemente na minha rotina e tem me feito muito bem. Depois disso, me arrumo para ir ao trabalho. De manhã é mais ou menos isso. Esse é também o melhor momento para meus escritos.
Em que hora do dia você sente que trabalha melhor? Você tem algum ritual de preparação para a escrita?
Gosto muito de escrever pela manhã. Se o dia está bonito, com céu azul, luz do sol boa, sinto uma conexão boa comigo mesma e um contato mais sensível com as ideias que caraminholam por aqui. Mas, durante a semana, essa parte do dia está tomada com os afazeres do trabalho. Então eu aproveito, às vezes, alguma noite tranquila para colocar as ideias no papel ou escrevo nos fins de semana (domingo, principalmente). À noite, em geral, gosto mais de escrever em meus diários.
Você escreve um pouco todos os dias ou em períodos concentrados? Você tem uma meta de escrita diária?
Já tentei ter esta disciplina (que é muito importante)! Mas minha escrita funciona primeiro com intuição e depois com lapidação. Ou seja, primeiro eu sinto vontade de escrever sobre algo: uma ideia surge, um pensamento se prende, uma imagem fica voltando, uma sensação que não me deixa… e eu preciso escrever sobre aquilo. Depois vem o processo de lapidar: cortar, mexer, trocar…
Sobre meta, a escrita não é exatamente um produto, né? Não acho que exista como bater meta em algo que sai da alma. Quer dizer, talvez até haja, porém, não acho que, comigo, isso funcionaria. Nada que é colocado no papel sob certa forma de pressão pode ser totalmente honesto.
Como é o seu processo de escrita? Uma vez que você compilou notas suficientes, é difícil começar? Como você se move da pesquisa para a escrita?
Depende daquilo que vai ser escrito. Em uma época muito difícil que passei há alguns anos, os textos fluíam feito água. Transbordavam. Isso porque eu estava derramando por dentro. A escrita era a única maneira de escoar tudo aquilo. Foi quando mais escrevi e li na vida em menos tempo. Li mais de 20 livros em 5 meses. Também criei um blog que servia de instrumento pra represar toda aquela água! Hoje, anos depois, vejo que naquela época a escrita era uma maneira de botar tudo pra fora, de qualquer jeito. Não havia lapidação, não havia exatamente todo o processo que envolve a escrita. Era cura! Era remédio! Era desespero mesmo.
Mas em épocas mais tranquilas os textos saem com mais calma, mais reflexões, e, portanto, com mais dificuldade, poderia dizer. Hoje em dia um texto fica semanas em mim até a hora que vou colocá-lo no papel. Tenho um que já está há meses começado, mas ainda não encontrei nem o meio nem o final dele. Toda vez que tento, empaco, mesmo sabendo o que gostaria de dizer.
A escrita tem o tempo dela. É ela que manda em quem escreve e não o contrário. E se a gente tenta apressar esse tempo, além de deixar de ser prazeroso, deixa de ser orgânico também.
Como você lida com as travas da escrita, como a procrastinação, o medo de não corresponder às expectativas e a ansiedade de trabalhar em projetos longos?
Com bastante frustração. Daquelas pra serem discutidas no divã, inclusive. É como se eu e a escrita fossemos amigas, mas ela não atendesse aos meus chamados.
Quando percebo que estou procrastinando, me dou uma obrigada. Sento na frente do computador e digo pra mim mesma “Começa”. Às vezes funciona.
Medo de não atender às expectativas aprendi a não ter. Em geral, quando escrevo, procuro atender às minhas expectativas e, se por sorte, o texto alcançar a expectativa de outras pessoas, fico muito feliz. Mas é claro que sempre haverá aqueles textos que ficam na gaveta porque, né?, não dá pra mostrar!
A ansiedade só me acomete com a pressão de prazos pra entregar, mas quando um projeto é longo, acho até que gosto.
Quantas vezes você revisa seus textos antes de sentir que eles estão prontos? Você mostra seus trabalhos para outras pessoas antes de publicá-los?
Um texto nunca está pronto. Toda vez que releio algum texto que escrevi, vejo alguma coisinha que podia mudar. É uma coisa!! Na verdade, acho que a gente é vencido pelo cansaço. Algo como “vou parar de olhar, senão não entrego nunca”.
Mostro meus textos para uma grande amiga minha, que mora em outra cidade. Passo também para a turma de literatura da qual faço parte no Instituto Estação das Letras e que é comandada pela Ninfa Parreiras. Os olhares de meus colegas e da Ninfa são cruciais pra que eu confie em um texto que escrevi.
Como é sua relação com a tecnologia? Você escreve seus primeiros rascunhos à mão ou no computador?
Tudo no computador. Só meus diários são à mão. Mas eu sou da geração que já tinha aula de informática na escola, então…
De onde vêm suas ideias? Há um conjunto de hábitos que você cultiva para se manter criativa?
As ideias vêm das mais diferentes fontes. Às vezes vejo algo na rua e isso me dá vontade de escrever. Às vezes é uma sensação ou um sentimento. Acho que meus diários me ajudam muito a manter minha criatividade. Ali eu coloco o que vi, o que senti, o que achei. Acabam surgindo ideias de textos mais elaborados. As aulas da Ninfa também ajudam muito, porque ela está sempre nos provocando com imagens, palavras, textos de outros autores… Ela sempre nos instiga a escrever e seu olhar é muito generoso e cuidadoso. Acho que todo mundo que gosta de escrever devia investir num curso assim.
O que você acha que mudou no seu processo de escrita ao longo dos anos? O que você diria a si mesma se pudesse voltar à escrita de seus primeiros textos?
Ficou mais madura e lapidada. Eu costumava escrever e não voltar ao texto para trabalhá-lo. Achava que, se estava no papel, estava pronto. Tenho vergonha de váááários textos meus que estão no blog. São muito frágeis, dramáticos, bobos. Mas não os apago. Acho que fazem parte do que a minha escrita se tornou hoje e são importantes por isso. Além do que foram eles que me salvaram na pior época da minha vida! Seria uma ingratidão apagá-los. Agradeço a cada um deles, pois me ajudaram a superar aquela fase da melhor maneira possível.
Que projeto você gostaria de fazer, mas ainda não começou? Que livro você gostaria de ler e ele ainda não existe?
Escrever um livro infantil solo, com belas ilustrações. Até hoje participei de projetos lindos e coletivos. Gostaria, então, de ter um livro infantil solo. Isso é algo que tenho muita vontade de fazer, mas ainda não aconteceu. Talvez eu ainda não esteja preparada. Talvez eu ainda não tenha escrito o texto que mereça isso.
Sobre um livro que eu gostaria de ler e ele ainda não existe? Ah, não sei responder isso. Acho que o meu mesmo, quem sabe um dia?