Juliana Almeida Cordeiro é escritora e comunicadora.
Como você começa o seu dia? Você tem uma rotina matinal?
Eu começo o dia com um copo de água grande e bem gelado. A partir daí, ele pode se desdobrar de muitas formas. Às vezes escolho ler para aproveitar a luz do dia, ou lavo os pratos da noite para já me sentir produtiva e com uma tarefa a menos. Isso, sempre acompanhada de um bom podcast acelerado.
Em que hora do dia você sente que trabalha melhor? Você tem algum ritual de preparação para a escrita?
Não tenho uma rotina de produção. Quando um tema ou momento me despertam, eu escrevo. Pode ser de madrugada, de manhã, no ônibus (saudades de ir para a rua), numa folha de rascunho, no celular… Depois eu tento concentrar numa pasta para facilitar a consulta, mas não faço um ritual.
Tem um livro excelente, Escrevendo com a alma, que a autora comenta justamente isso: querer preparar o ambiente perfeito, escolher um caderno muito especial, uma caneta chique… Isso pode gerar uma trava. O melhor é que você se sinta livre para escrever as maiores bobagens do mundo! Eu separo muito bem o momento de escrever com o de publicar, então isso faz bastante sentido pra mim.
Você escreve um pouco todos os dias ou em períodos concentrados? Você tem uma meta de escrita diária?
Às vezes me dou algumas metas para me incentivar, faço alguns acordos com amigos ou procuro concursos e olho o edital como um exercício. É bom porque nem sempre é um tema óbvio ou fácil. Ter um compromisso também auxilia a não adiar pro infinito.
Acho legal a ideia de escrever um pouco todos os dias, mas ler e ver o mundo é tão importante quanto. Isso é o que nos dá material e ferramentas.
Como é o seu processo de escrita? Uma vez que você compilou notas suficientes, é difícil começar? Como você se move da pesquisa para a escrita?
Costumo fazer pesquisas quando escrevo não ficção, em especial as cartas no meu projeto de mapear histórias: Cartografismos. Pesquiso um bocado antes, mas geralmente sinto a necessidade de confirmar e complementar alguns detalhes que anotei, então busco mais um pouco ou volto a consultar algumas fontes. Acho que é um movimento natural, se tentar “zerar” um assunto, não começo a escrever nunca e a própria escrita vai mostrando o que mais você precisa conferir antes de seguir adiante.
No jornalismo, algumas chances são únicas, então a gente tenta colocar o máximo no espacinho que tem (falando de impresso mas também de alguns portais). O que pode ser bom ou deixar mal contado. Na escrita livre, a gente tem um pouco mais de controle sobre o tamanho, mas acho essencial saber priorizar e desapegar de alguns elementos que estão apenas cansando o leitor. Mesmo que seja algo incrível, que você amou conhecer e pesquisar, é preciso perceber quando não funciona. Talvez levar para um spin-off ou tentar mudar um pouco do projeto.
Como você lida com as travas da escrita, como a procrastinação, o medo de não corresponder às expectativas e a ansiedade de trabalhar em projetos longos?
Quando tenho compromissos firmados com outras pessoas, raramente procrastino. E mesmo que o faça, cumpro o prazo. Agora quando é algo só para mim, a conversa muda. É auto sabotagem que chama, né? Uma luta! E constante, viu? Vários lembretes para respirar fundo e continuar tentando. Sempre fui uma pessoa muito crítica e ansiosa, então terapia e amigos ao telefone me ajudam.
Quantas vezes você revisa seus textos antes de sentir que eles estão prontos? Você mostra seus trabalhos para outras pessoas antes de publicá-los?
Não tenho um padrão para isso. Busco reler algum tempo depois de ter escrito, às vezes mostro para algumas pessoas ou só uma… Fazendo o curso de escrita criativa, tem muitas coisas que a gente debate, outras mostra só para o professor. No fim, a maioria ainda permanece na gaveta.
Como leio muito desde cedo e exijo um bocado de mim, meu sarrafo é lá em cima. Nunca houve um texto meu que eu dissesse excelente, mas também encontro muitas palavras ou frases que cortaria ou “poliria” em textos alheios. Talvez por isso eu também estude edição e revisão, é bem mais tranquilo lapidar que modelar do zero.
O que tenho buscado é separar bem a escritora da editora. Precisa ser uma etapa por vez. Publicar também precisa ter seu tempo. Algumas coisinhas coloco nas minhas redes sem problema, mas quero fazer um livro e aí tudo precisa estar muito bom. A gente tem sempre várias opções de coisas para fazer e, quando alguém estiver com meu livro nas mãos eu quero que essa pessoa tenha a melhor experiência possível. É uma forma de fazer valer aquela atenção.
Como é sua relação com a tecnologia? Você escreve seus primeiros rascunhos à mão ou no computador?
Coisas mais longas ou para entregar/enviar, eu costumo fazer no computador pela facilidade na edição, mas amo cadernos, mantenho uma agenda “bullet journal” (pode botar aspas que o meu não é tão lindo quanto os que vejo por aí hahaha) e às vezes faço umas anotações à la diário. Muitos textinhos acabam surgindo assim também, à mão, então uso o que estiver disponível, sem problemas.
De onde vêm suas ideias? Há um conjunto de hábitos que você cultiva para se manter criativa?
Nem eu sei. Quando algo me move a escrever, escrevo. Leio, vejo série, amo ver ilustrações e conversar. A vida é a matéria da escrita, sempre vai ser. O que produzo vem daí, de estar no mundo. Como falei ali em cima, gosto de procurar editais como exercícios, pequenos desafios para se testar.
O que você acha que mudou no seu processo de escrita ao longo dos anos? O que você diria a si mesma se pudesse voltar à escrita de seus primeiros textos?
Eu diria: escreva fanfic. Vá, seja livre em copiar o universo de Harry Potter que você tanto ama! Hahaha
Eu morria de medo em copiar e ser “um plágio”! Nossa! Isso me tolhia de uma forma horrível! E quanto mais eu lia, pior ficava, né? Tudo era “ideia de fulano”. Escrevia inícios e travava. Rascunhava uma ideia e não saia dali. Era muito sofrido. Hoje eu parei de sofrer tanto. Ainda tenho angústias e questões para resolver (quem não, não é mesmo? hahaha), mas procuro respirar fundo e me permitir.
Que projeto você gostaria de fazer, mas ainda não começou? Que livro você gostaria de ler e ele ainda não existe?
Tenho uma senhora pilha de livros que adquiri e ainda não li. Alguns, que existem nos meus arquivos digitais, estão ali apenas para consultas. Sei que não lerei todos mesmo que viva mais cem anos com uma boa visão. Há vários, vários deles que quero ler e são tantos temas e formas que não ouso dizer que algum tipo de livro ainda não foi escrito. E isso esbarra um pouco no que quero ou não escrever. Eu tenho muito apreço por boas histórias e me desligo um pouco das classificações. Então não vou responder bem a essa pergunta também, não vou falar sobre o que eu ainda não comecei. O que eu tenho feito é buscar escrever boas histórias.