José Luiz Foureaux é professor titular de Literatura Portuguesa e Comparada na Universidade Federal de Ouro Preto.
Como você começa o seu dia? Você tem uma rotina matinal?
No que diz respeito ao ato de escrever, não há um começo programado, rotineiro. Geralmente, depois do café, leio um jornal. Vejo mensagens eletrônicas, agendas de aniversários e, se der vontade, ou estiver animado escrevo alguma coisa. Quando trabalhava (faz mais de ano que me aposentei) a rotina era outra, mesmo interessante aqui.
Em que hora do dia você sente que trabalha melhor? Você tem algum ritual de preparação para a escrita?
Não há ora do dia melhor, nem há preparação prévia. A escrita se faz de acordo om outros critérios, muito subjetivos.
Você escreve um pouco todos os dias ou em períodos concentrados? Você tem uma meta de escrita diária?
Escrevo quando me dá vontade, se me der vontade. Não anteponho metas -penso que isso é incompatível com o ato da escrita, sobretudo a artística, diferente em tudo da acadêmica que admite regras prévias e datas limite.
Como é o seu processo de escrita? Uma vez que você compilou notas suficientes, é difícil começar? Como você se move da pesquisa para a escrita?
Costumo não fazer “pesquisa” para a escrita criativa. Logo, não conheço este esquema de “notas suficientes”. Às vezes tomo nota de ideias ou frases e ou pensamentos, mas isso não é pesquisa. Começo a escrever depois de longo processo de maturação de ideias, de adequação de intuições. Mais penso que escrevo, pra começar. Depois de pensar muito, matutar, imaginar, delirar, então começo a escrever, sem roteiro prévio.
Como você lida com as travas da escrita, como a procrastinação, o medo de não corresponder às expectativas e a ansiedade de trabalhar em projetos longos?
Não conheço procrastinação. Não escrevo para “corresponder às expectativas” de quem quer que seja, mesmo às minhas, raríssimas. Como não faço “projetos” não experimento ansiedade de qualquer espécie. Não sei “medir” esse processo. Isso para mim é tão difícil quanto era quantificar correção de provas de literatura. Como é que se transforma efeito de leitura em números? Passei trinta e um anos leciono e confesso, despudoradamente, que me aposentei sem encontrar a resposta a esta pergunta, se é que ela existe. Assim, tudo isso de ansiedade, projeto, prévias, esquemas, anotações, pesquisas constitui universo alheio à escrita criativa “em si”. Os donos de oficinas de escrita criativa, se me lerem, hão de quere submeter-me à inquisição…
Quantas vezes você revisa seus textos antes de sentir que eles estão prontos? Você mostra seus trabalhos para outras pessoas antes de publicá-los?
Houve um livro que revisei quatro vezes e ele saiu com erros grosseiros e horrorosos, sobretudo na diagramação, para além dos de digitação etc. No mais, não registrei quantas vezes revisei. Uma revisão, minha, é de lei. Quando a editora manda o miolo do livro revisado por ela, faço outra revisão complementar. Isso, geralmente basta.
Como é sua relação com a tecnologia? Você escreve seus primeiros rascunhos à mão ou no computador?
Hoje escrevo direto no computador, mas gosto de imprimir o que escrevi para fazer uma leitura e acrescentar emendas, fazer correções e acréscimos – isso quando me dá vontade, se tenho paciência e se ocorre de ser o caso.
De onde vêm suas ideias? Há um conjunto de hábitos que você cultiva para se manter criativo?
Não “cultivo hábitos” para me manter criativo. Eu não sei dizer de “onde” vêm as ideias, se é que seja possível localizar sua “origem”. Um cheiro, uma frase musical, uma palavra, uma imagem, uma situação, uma lembrança, tudo isso pode sugerir alguma coisa. Às vezes, uma frase de romance é tomada como título de um livro que eu tenha desejo de escrever. Às vezes, chego a escrever o tal livro. O mais comum é esta frase ficar perdida, na memória ou em alguma página esquecida, de caderno guardanapo ou caderno – e o livro jamais se consumar.
O que você acha que mudou no seu processo de escrita ao longo dos anos? O que você diria a si mesmo se pudesse voltar à escrita de seus primeiros textos?
Penso que nada mudou, o sentido de superação ou descoberta. A mudança, creio, se dá/deu na maturação da consciência de escrever, na minha maturação como indivíduo, como sujeito. Assim, essa maturação apresenta espectro muito amplo e variado, a escrita é apenas um dado – digamos, aleatório – neste universo de referências. Logo, penso que a mudança é igualmente ampla e variada. Não sou capaz de apontar este o aquele traço/detalhe específico e individualizado que possa identificar tal passo de mudança.
Que projeto você gostaria de fazer, mas ainda não começou? Que livro você gostaria de ler e ele ainda não existe?
Com não faço projetos – materialmente falando – identificar e nomear um como exemplo de meu desejo de escrever é impossível. A imagem que tenho quanto a esta pergunta é que existem inumeráveis livros a escrever. Alguns deles eu me imagino capaz de escrever, mas não sei levantar a mão e pegar um destes no ar e materializá-lo no papel/tela do computador.