José Henrique Calazans é poeta, contista, dramaturgo, roteirista e letrista.
Em que hora do dia você sente que trabalha melhor? Você tem algum ritual de preparação para a escrita?
Sinto que trabalho melhor da tarde até o meio da noite. Como preparação, às vezes gosto de colocar alguma trilha sonora. Se estou sem inspiração, às vezes gosto de reler as pesquisas que faço ou rever trechos já escritos para ir me concentrando e entrando no clima. Mas não costuma ser um ritual de preparação muito longo.
Você escreve um pouco todos os dias ou em períodos concentrados? Você tem uma meta de escrita diária?
Prefiro escrever em períodos concentrados, quando tenho algum projeto determinado ou bate alguma inspiração repentina. Antigamente eu tinha uma meta de páginas diárias, hoje simplesmente me esforço para escrever o máximo que posso no tempo que tenho disponível para tanto.
Como é o seu processo de escrita? Uma vez que você compilou notas suficientes, é difícil começar? Como você se move da pesquisa para a escrita?
Meu processo de escrita é variável. Às vezes começa com uma ideia que surge de repente, como um verso de um poema ou um parágrafo para um texto, e depois eu parto para a elaboração. Se for um poema, por exemplo, procuro decidir se vai ser rimado ou não, metrificado ou não, e vou testando vários versos diferentes até encontrar algo que me deixe satisfeito. Às vezes faço uso de dicionários de sinônimos e de rimas. Se for um conto, posso pesquisar sobre o assunto do texto em livros, na internet, ou posso buscar ler outros contos do mesmo estilo. Então o começo para mim geralmente é fácil, o difícil é o processo de elaboração que vem depois. Às vezes posso passar anos reelaborando um texto, reelaborando até mesmo textos que já tenham sido publicados. Se você for comparar, por exemplo, a primeira e a segunda edição do meu livro de poemas (intitulado Quem vai ler esta merda?), vai notar diferenças entre alguns poemas.
Como você lida com as travas da escrita, como a procrastinação, o medo de não corresponder às expectativas e a ansiedade de trabalhar em projetos longos?
Tento evitar a procrastinação me apoiando em pesquisas. Acho que não adianta muito forçar a barra quando bate aquele “branco”, mas ficar parado também não ajuda. Então, quando travo, vou procurar ler algum outro texto sobre o assunto que estou trabalhando, vou revisar o que já escrevi, fazer alguma coisa que mantenha a mente em atividade. Quanto às expectativas, às vezes ajuda pensar que o que eu estou escrevendo não é ainda o texto definitivo, apenas um rascunho. E que posso revisá-lo quantas vezes forem necessárias até que ele fique a contento. E acho que, independente de estar trabalhando num projeto curto ou longo, a ansiedade para mim é a mesma.
Quantas vezes você revisa seus textos antes de sentir que eles estão prontos? Você mostra seus trabalhos para outras pessoas antes de publicá-los?
Não tenho um número fixo de revisões. Reviso até perceber que todas as questões do texto estão resolvidas, ou até minha intuição me dizer que o texto está pronto para ser lido por outras pessoas. Por muito tempo participei de oficinas literárias. Acho benéfico você ter a visão de um leitor especializado antes de lançar o texto para o público em geral. Estou preparando um livro de contos agora (que provavelmente via se chamar Não existem finais felizes) e seus textos passaram por oficinas em diferentes momentos. Outra opção que também considero válida é pedir a algum amigo escritor para ler o texto. Por mais maduro que você esteja para perceber por si mesmo as qualidades e os problemas de um texto, o olhar do outro pode abrir perspectivas que você não tinha percebido.
Como é sua relação com a tecnologia? Você escreve seus primeiros rascunhos à mão ou no computador?
Geralmente faço quase tudo, tanto os primeiros rascunhos quanto as revisões, no computador.
De onde vêm suas ideias? Há um conjunto de hábitos que você cultiva para se manter criativo?
Acho que minhas ideias vêm da vida em geral. Coisas que aconteceram comigo, que aconteceram com pessoas que eu conheço ou coisas das quais simplesmente ouvi falar. É possível também imaginar coisas que não tenham acontecido. Mas acredito que tudo, até as criações mais imaginativas, tem alguma base na vida. E é claro que, quando o acontecimento se transmuta na arte, ele pode ganhar novas roupagens, sem a necessidade de ser cópia da realidade. Quanto a hábitos, acho que o hábito mais importante é estar o máximo possível em contato com a arte. Participar de saraus, ler livros, ver filmes, ouvir músicas, enfim, estar na busca de coisas que estimulem sua criatividade. Sem, é claro, se desligar dos fatos do dia-a-dia, que também podem ser fonte importante de inspiração.
O que você acha que mudou no seu processo de escrita ao longo dos anos? O que você diria a si mesmo se pudesse voltar à escrita de seus primeiros textos?
Acho que fui ficando mais crítico em relação ao que escrevo. E também aumentou minha capacidade de entender o que funciona e não funciona em cada texto, ter uma noção do impacto que cada escolha criativa pode causar. Se pudesse voltar à escrita de meus primeiros textos, diria para me concentrar mais nos projetos de longo prazo. Houve uma fase da minha carreira em que eu me preocupava demais com concursos literários, o que fazia com que eu tivesse uma atitude um pouco imediatista.
Que projeto você gostaria de fazer, mas ainda não começou? Que livro você gostaria de ler e ele ainda não existe?
Gostaria de criar um musical com texto e música de minha autoria. Quanto a um livro que ainda não existe, não sei dizer. Mas há tantos bons livros que já existem, além de novos livros encantadores que são publicados a cada dia, que me dou por satisfeito.