Joelmo Jesus de Oliveira é Analista do Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação e Doutor em Ciência Política pela Universidade de Brasília.
Como você começa o seu dia? Você tem uma rotina matinal?
Não tenho uma rotina fixa para escrever. Meu trabalho diário no Ministério de Ciência e Tecnologia exige, frequentemente, a produção rápida de pequenos textos, então procuro adequar o esforço à necessidade. Quando estou envolvido com atividade acadêmica, escrevendo artigos ou similares, mantenho o foco num esforço mais concentrado ao longo de vários dias seguidos.
Em que hora do dia você sente que trabalha melhor? Você tem algum ritual de preparação para a escrita?
Não tenho o hábito de trabalhar durante a noite. Procuro não escrever quando estou cansado ou indisposto, comigo a produção textual demanda muita concentração e disposição. Antes de escrever tenho o hábito de pesquisar e estudar bastante, juntar as referências e construir uma linha de argumentação. Faço um esboço do fluxo das ideias, de onde vou partir e onde quero chegar.
Você escreve um pouco todos os dias ou em períodos concentrados? Você tem uma meta de escrita diária?
Gosto de concentrar o trabalho em um período, num esforço concentrado por vários dias e várias horas seguidas. É cansativo, mas gosto da sensação que o estado de concentração proporciona. As palavras fluem bem depois que alcanço essa condição, é quando o texto começa a sair com bom acabamento e as ideias ganham lucidez. Em seis horas de trabalho consigo produzir entre cinco a sete páginas de texto acabado.
Como é o seu processo de escrita? Uma vez que você compilou notas suficientes, é difícil começar? Como você se move da pesquisa para a escrita?
Resumindo o que disse anteriormente, estudo bastante o assunto e relaciono as referências antes de começar a escrever. Parto de uma ideia forte e formulo a argumentação passando pelas referências que considero mais importantes. Costumo definir inicialmente o tamanho dos tópicos em número de palavras, isso ajuda a projetar o “início-meio-fim” do texto.
Como você lida com as travas da escrita, como a procrastinação, o medo de não corresponder às expectativas e a ansiedade de trabalhar em projetos longos?
Não sou alguém que já alcançou o patamar de senioridade acadêmica. Ainda tenho que lidar com esses medos, ansiedades e angústias. Mas consigo bons resultados sempre que saio da inércia. Considero isso importante, se a página em branco permanece assim por muito tempo é sinal de que, pelo menos no meu caso, não estou pronto o bastante para começar a escrever. De qualquer forma, considero o ponta-pé inicial muito importante. Só consigo obter coesão e fluência na escrita depois de pelo menos 30 minutos tentando escrever, pensando na argumentação e mantendo a concentração na tarefa de colocar as ideias no papel. Depois que o estado de concentração chega tudo fica mais fluente, aí então aproveito para fazer o máximo que puder. Isso implica às vezes em passar do horário de almoço, o que não é algo recomendável, mas é assim que funciona comigo.
Quantas vezes você revisa seus textos antes de sentir que eles estão prontos? Você mostra seus trabalhos para outras pessoas antes de publicá-los?
Em geral considero que meus textos saem bem acabados. Mas reviso pelo menos duas vezes. Antes da última revisão deixo o texto “descansar” um pouco, para não viciar minha percepção sobre ele. Crio um afastamento de um ou dois dias, isso depende do tamanho do texto, para conseguir avaliar melhor.
Como é sua relação com a tecnologia? Você escreve seus primeiros rascunhos à mão ou no computador?
Uso sempre o computador, nunca fiz diferente. Costumo rascunhar no papel a divisão em tópicos e seu tamanho em número de palavras, os argumentos e ideias que servem de guia. A produção textual, no entanto, é feita sempre no computador.
De onde vêm suas ideias? Há um conjunto de hábitos que você cultiva para se manter criativo?
Tive uma professora que dizia que o “pesquisador” é aquele que escreve muito e lê pouco, e que um “tecnologista” seria aquele que lê muito e escreve pouco. Pensando assim, considero que tenho um perfil mais próximo de um “tecnologista”, gosto de ler os trabalhos e seguir as referências, entrando e saindo de um artigo para outro. Quando me dou conta, acabei lendo partes de dez até quinze trabalhos em três horas de esforço. Esse hábito, que desenvolvi de forma instintiva, ajuda a deixar a imaginação fértil, e a articular ideias diferentes com desenvoltura.
O que você acha que mudou no seu processo de escrita ao longo dos anos? O que você diria a si mesmo se pudesse voltar à escrita de sua tese?
Venho de uma formação em ciências exatas e fiz uma transição para a área de humanas na pós-graduação. Não foi fácil, essa transição passou necessariamente por um enorme esforço para elevar bastante minha capacidade de comunicação escrita. A tarefa de traduzir o pensamento em linguagem discursiva convencional, o que em ciências exatas é feito com a ajuda da matemática e de suas codificações, exige o desenvolvimento de uma noção estética mais apurada e da capacidade de ser preciso e fiel com o que se deseja expressar. Nem que para isso os parágrafos tenham que ficar um pouco grandes…
Não costumo pensar muito mais na tese, embora tenha defendido há poucos anos. Ela foi uma construção importante, em um momento muito importante. Considero que tenha aproveitado aquela fase, mas o pensamento está voltado para outras coisas agora. A tese não é o final de tudo, mas o início de outro momento, de outras possibilidades para a permanente tarefa de pensar e escrever.
Que projeto você gostaria de fazer, mas ainda não começou? Que livro você gostaria de ler e ele ainda não existe?
Terminei a tese de doutorado há quase três anos. Tenho todos os projetos possíveis ainda por começar. Mas tenho interesse especial pelas áreas de pesquisa que hoje aproximam as ciências humanas das ciências exatas. Um livro que resuma pesquisas mais impactantes nessa interface ainda não existe, pelo menos que eu saiba.