Professor da Universidade Católica de Pernambuco (UNICAP) e da Faculdade de Direito do Recife, Universidade Federal de Pernambuco (FDR/UFPE).
Como você começa o seu dia? Você tem uma rotina matinal?
Costumo acordar invariavelmente cedo, mesmo quando não tenho aulas ou outros compromissos durante o dia. Logo cedo, olho o e-mail e os jornais e blogs de notícias. Quando não tenho aulas, aproveito para ler alguma coisa relacionada ao tema que estou pesquisando no momento. Se não for dia de agenda pesada, a pesquisa e a leitura podem se estender por um tempo mais longo. Muitas vezes quando estou envolvido em um trabalho mais longo, acordo mais cedo e aproveito para escrever.
Em que hora do dia você sente que trabalha melhor? Você tem algum ritual de preparação para a escrita?
Produzo melhor durante o período da manhã, quando meu estado mental parece estar mais suscetível a um maior fluxo de ideias. Também gosto do período da tarde. Procuro almoçar sempre cedo, dividindo os turnos da manhã e da tarde em períodos mais ou menos iguais. Este hábito ajuda a manter alguma organização e disciplina. Não há exatamente um ritual de preparação para a escrita, mas sempre procuro revisitar mentalmente as principais ideias do trabalho no qual estou envolvido antes de passar propriamente ao texto.
Você escreve um pouco todos os dias ou em períodos concentrados? Você tem uma meta de escrita diária?
Não tenho qualquer meta de escrita. Escrever exige uma disposição de espírito que não combina com o estabelecimento de esquemas ou metas. Às vezes dedico mais tempo para a leitura. Outras vezes para a escrita. Geralmente aproveito os momentos no avião para trabalhar, quase sempre lendo alguma coisa. Quando tenho algum prazo, procuro me concentrar no trabalho, aproveitando todo o tempo disponível para concluir o texto a tempo.
Como é o seu processo de escrita? Uma vez que você compilou notas suficientes, é difícil começar? Como você se move da pesquisa para a escrita?
Quando estou lendo um livro, geralmente risco, rabisco e faço algumas anotações. Quando acontece de reler um mesmo livro depois de um longo intervalo de tempo, procuro utilizar cores e marcadores diferentes para as anotações, assim consigo perceber os diferentes registros e a evolução das minhas preocupações ao longo do tempo. Antes de começar a escrever, organizo um roteiro com os principais argumentos a serem trabalhados e um esboço da estrutura do texto, como um fio de Ariadne, para não me perder no labirinto de informações.
Como você lida com as travas da escrita, como a procrastinação, o medo de não corresponder às expectativas e a ansiedade de trabalhar em projetos longos?
Lembro que Neruda dizia que escrever não é exatamente uma tarefa difícil. Basta começar com uma letra maiúscula e terminar com um ponto final colocando algumas ideias no meio. É claro que as coisas não funcionam exatamente assim, sobretudo quando temos uma rotina intensa de aulas, orientações, palestras e tantas atividades que concorrem com a escrita. O risco dessa rotina é a dispersão e o abandono da escrita. Para driblar o problema, procuro terminar tão prontamente quanto possível o texto com o qual estou envolvido. A existência de prazos costuma ser um fator importante a ser considerado, já que pode comprometer a espontaneidade do processo. A melhor maneira de lidar com isso é tentar não se cobrar em excesso e manter o foco no que realmente interessa. Um bom exercício é conhecer os limites da sua própria autocrítica para que ela exerça efeito positivo e não comprometa a escrita. Não é à toa que dizem que perfeccionismo rima com ineditismo.
Quantas vezes você revisa seus textos antes de sentir que eles estão prontos? Você mostra seus trabalhos para outras pessoas antes de publicá-los?
Não costumo revisar muitas vezes o texto. Quando dou o trabalho por encerrado, faço uma única revisão e o encaminho para publicação.
Como é sua relação com a tecnologia? Você escreve seus primeiros rascunhos à mão ou no computador?
Não tenho regras rigidamente estabelecidas para isso. Alguns trabalhos começo a rascunhar à mão, no pedaço de papel que encontrar à disposição. Outros, começam a ser rascunhados diretamente no computador. Meu primeiro trabalho acadêmico foi escrito numa velha máquina Olivetti e foi um processo muito mais complicado do que o que temos hoje à disposição. Com a chegada do computador, o processo de edição tornou-se muito mais rápido e eficiente. Mantenho no meu computador uma infinidade de pastas sobre diferentes temas que me interessam, muitas delas catalogadas e organizadas em diferentes níveis de indexação. Procuro organizar o material digital para uma referência rápida, caso precise. Como este é um material que venho reunindo há alguns anos, cuidei de deixá-lo também disponível para consulta via celular e tablet. Também utilizo o tablet para armazenar vários livros e assim consigo transportar bibliotecas inteiras para onde quer que eu vá. Mesmo assim, as anotações que faço quando leio um texto digital são feitas à mão, em uma folha de papel. Quando o trabalho é realizado em coautoria, o e-mail e o WhatsApp são ferramentas importantes. No meu grupo de pesquisa, o REC (Recife Estudos Constitucionais), temos produzido coletivamente de maneira satisfatória graças ao apoio da tecnologia.
Já as redes sociais funcionam como uma espécie de laboratório. Muitas vezes lanço alguma ideia e aguardo as reações.
De onde vêm suas ideias? Há um conjunto de hábitos que você cultiva para se manter criativo?
Não tenho obsessão por criatividade. Acho que o mais importante é manter uma certa postura de perplexidade, duvidando de tudo que é dado como certo e natural. Além do universo jurídico, mantenho interesse sobre vários outros assuntos como música, cinema e literatura.
O que você acha que mudou no seu processo de escrita ao longo dos anos? O que você diria a si mesmo se pudesse voltar aos seus primeiros escritos?
Sob o ponto de vista do estilo sempre gostei de períodos curtos em homenagem à clareza do argumento. Nos meus primeiros escritos, o texto final saía a fórceps. Era um processo muito tormentoso. Hoje, percebo que o texto já sai quase pronto sem muito sofrimento. A continuidade da prática da escrita torna o escritor menos inseguro e o texto mais maduro.
Que projeto você gostaria de fazer, mas ainda não começou? Que livro você gostaria de ler e ele ainda não existe?
Ao longo do tempo me envolvi no mestrado com temas tão díspares quanto a teoria da argumentação do finlandês Aulis Aarnio e a teoria crítica dos direitos humanos de Joaquín Herrera Flores. No doutorado, meu interesse recaiu sobre a teoria habermasiana da democracia. Em todos os momentos, o pano de fundo mais evidente é a discussão sobre o papel da jurisdição, colocando em evidência as relações entre política e direito no contexto do projeto racional moderno. Atualmente tenho me sentido inclinado a revisitar estes temas a partir dos novos olhares que as pesquisas recentes me proporcionaram. Tenho muitos projetos ainda não concluídos e outros ainda não iniciados, mas já relativamente esboçados na minha cabeça. Por serem trabalhos mais longos e demandarem algum tempo de dedicação contínua, podem demorar a sair.