Jeová Santana é escritor, professor na rede pública de Sergipe e na Universidade Estadual de Alagoas.
Como você começa o seu dia? Você tem uma rotina matinal?
Não tenho uma rotina matinal. Não tenho nem a disciplina de Graciliano Ramos, que escrevia à mão uma página por dia, a qual, datilografada, renderia menos que uma lauda. Nem a de João Ubaldo Ribeiro que escrevia quinhentas palavras diariamente.
Em que hora do dia você sente que trabalha melhor? Você tem algum ritual de preparação para a escrita?
Não tenho uma hora específica para me dedicar à escrita, até porque em parte do dia e em algumas noites estou na condição de professor no ensino médio, em Aracaju, e na Universidade Estadual de Alagoas, em União dos Palmares.
Como é o seu processo de escrita? Uma vez que você compilou notas suficientes, é difícil começar? Como você se move da pesquisa para a escrita?
Meu primeiro livro de contos, Dentro da casca (1993; 2ª. ed 2018), foi escrito numa Remington portátil, que batizei de Iracema e hoje repousa placidamente em cima de uma estante. Talvez o fato de ter usado teclas, fiz a transposição natural para o computador. Nele escrevi os livros seguintes, A ossatura (2002) e Inventário de ranhuras (2006). Esse procedimento, porém, não acontece em relação ao poema. Com ele, sempre papel e caneta. Depois vem a digitação. Nessa bitola, produzi Poemas passageiros (2011) e Solo de rangidos (2016). Ainda em relação aos contos, notícias e relatos pessoais são uma fonte constante de inspiração. Quanto ao poema, além das epifanias, tocam-me as questões sociais.
Como você lida com as travas da escrita, como a procrastinação, o medo de não corresponder às expectativas e a ansiedade de trabalhar em projetos longos?
Estou indo mais ou menos bem na seara do conto e do poema. Este é mais frequente que aquele. Ambos atendem as expectativas para me presentificar no mundo. Como meu fôlego é curto, passo ao largo, por exemplo, da angústia e “ansiedade de trabalhar projetos longos” como os que envolvem o romance.
Quantas vezes você revisa seus textos antes de sentir que eles estão prontos? Você mostra seus trabalhos para outras pessoas antes de publicá-los?
Reviso muitas vezes e passo a bola adiante, pois o olho do autor é o pior revisor. É importante, também, não submeter o texto não só a quem manja a gramática, mas também a quem saca sobre técnica narrativa, estrutura poética etc.
De onde vêm suas ideias? Há um conjunto de hábitos que você cultiva para se manter criativo?
Principalmente da realidade. Costumo dizer que a vida é muito ficcional. Portanto, não quebro muito a cabeça para, no caso do conto, inventar narrativas.
O que você acha que mudou no seu processo de escrita ao longo dos anos? O que você diria a si mesmo se pudesse voltar à escrita de seus primeiros textos?
Creio ter amadurecido depois da primeira experiência com a prosa em 1993. Já tinha passado dos trinta anos quando publiquei o primeiro livro, o que não deixa de ser uma marca significativa, pois fugi do alvoroço natural de se querer publicar cedo. Em relação à poesia, a “estreia” foi mais tarde ainda, aos cinquenta. Ou seja, não é uma idade para brincar de literatura (a palavra mais bonita do mundo na minha modesta opinião), mas sim para dizer a que veio.
Que projeto você gostaria de fazer, mas ainda não começou? Que livro você gostaria de ler e ele ainda não existe?
Penso em reunir o material crítico que, por conta da atividade acadêmica, está disperso por jornais e revistas. Também tenho material suficiente para um livro de crônicas escritas tanto em jornais quanto na internet. Quanto ao “livro inexistente”, creio que os estão espalhados ao longo da história do mundo, já são suficientes para atender as expectativas, pensando em Camões, deste “bicho da terra tão pequeno”. Sem contar a brevidade da vida para nos concentrarmos em outro prazer fundamental: a releitura.