J.A. Castro é poeta.
Como você começa o seu dia? Você tem uma rotina matinal?
Saio de casa bem cedo para o trabalho e retorno à noite. Sou topógrafo na construção civil, profissão que aprendi com meu pai. Minha rotina é bem turbulenta, máquinas pesadas, poeira, sol, pressão e muitos cálculos. À noite me entrego às leituras e, às vezes, à escrita.
Em que hora do dia você sente que trabalha melhor? Você tem algum ritual de preparação para a escrita?
Não tenho um horário específico em que escrevo melhor. Quase sempre meus poemas surgem de uma imagem, lembrança ou observação, a qualquer hora e lugar, surge então um verso, que escrevo no bloco de notas do telefone ou num papel que estiver ao meu alcance, então vou trabalhando aos poucos nele, ao longo dos dias ou semanas. Não tenho nenhum ritual de preparação para a escrita, é tudo espontâneo.
Você escreve um pouco todos os dias ou em períodos concentrados? Você tem uma meta de escrita diária?
Nenhuma meta. Às vezes gasto um mês inteiro em um poema, às vezes um poema surge em alguns minutos. Vou trabalhando, um verso por dia. Às vezes uma ideia surge no meio do serviço mesmo, de repente. Como disse, meus poemas surgem, quase sempre, a partir da observação.
Como é o seu processo de escrita? Uma vez que você compilou notas suficientes, é difícil começar? Como você se move da pesquisa para a escrita?
Meus poemas surgem a partir de uma ideia, a partir da construção de uma imagem, quase sempre de uma lembrança. Então o texto vai tomando forma, linguagem e conteúdo vão se delineando juntos. Quanto à relação das minhas leituras com a escrita, leio muito mais do que escrevo. Mas, é muito comum criar algo enquanto leio outros poetas e não é raro também eu consultar um poema que goste para balizar o meu.
Como você lida com as travas da escrita, como a procrastinação, o medo de não corresponder às expectativas e a ansiedade de trabalhar em projetos longos?
Como não tenho nenhum tipo de meta e nem horários para escrever, não tenho problemas com as travas. Se a ideia surge, vou lá e escrevo, aos poucos, nunca sento para escrever sem alguma ideia, primeiro escrevo mentalmente, entende? Nunca forço meu processo criativo. Não crio nenhuma expectativa também, muito menos ansiedade, isso já tenho demais em minha profissão. E não encaro a minha escrita como um projeto, é tudo fragmentado, atemporal, sem data. Deixo que manifeste sozinho.
Quantas vezes você revisa seus textos antes de sentir que eles estão prontos? Você mostra seus trabalhos para outras pessoas antes de publicá-los?
Reviso muitas vezes, incontáveis, enquanto o poema vai sendo construído. Gosto de mostrar à minha esposa antes de publicá-lo.
Como é sua relação com a tecnologia? Você escreve seus primeiros rascunhos à mão ou no computador?
Uso muito o bloco de notas do celular, também tenho um caderninho, escrevo até nos projetos das obras em que trabalho. Tudo para não esquecer a ideia. Depois, com mais tempo, organizo o poema no computador. Até agora, todos os meus poemas foram publicados em meio eletrônico, ou em revistas virtuais ou nas redes sociais.
De onde vêm suas ideias? Há um conjunto de hábitos que você cultiva para se manter criativo?
A fonte de meus poemas é o meu próprio olhar frente às várias questões que envolvem nossa passagem por esse mundo. Olhar que não coincide obrigatoriamente com o presente. Muitos de meus poemas falam de coisas que vi e ouvi a muito tempo atrás. Eu sempre fui meio calado, gosto mais de ouvir. Minha mãe dizia que eu gosto muito de prestar atenção nas coisas, e essas coisas que presto atenção vira poesia. Ler é o principal hábito que tento manter para ser mais criativo.
O que você acha que mudou no seu processo de escrita ao longo dos anos? O que você diria a si mesmo se pudesse voltar à escrita de seus primeiros textos?
Acho que a poesia é um lance atemporal, sabe? Tem poemas que gosto muito e que são bem antigos e que não conseguiria escrever no momento atual. De qualquer forma, minha escrita não mudou muito, até porque não faz tanto tempo que escrevo, a grande maioria dos meus poemas é de três anos pra cá. É uma busca a longo prazo, uma vida inteira, talvez. Mas houve sim um amadurecimento, devido principalmente às leituras que tenho feito ao longo desse tempo. Se pudesse voltar e dizer algo a mim mesmo a alguns anos atrás, nos primeiros textos, seria para pedir paciência.
Que projeto você gostaria de fazer, mas ainda não começou? Que livro você gostaria de ler e ele ainda não existe?
Na verdade, nem é um projeto, pois projetos costumam ter um plano, alguma estratégia e um objetivo a serem alcançados, e não os tenho. Porém, meu desejo é alcançar um número de poemas que considere bons e, a partir disso, organizar um livro, mas isso também não tem data. Até achei que, por duas vezes, estava pronto e enviei originais para editoras, sem, no entanto, obter retorno. E realmente não estavam bons ainda. Mas no momento, publicar um livro não é um objetivo principal para mim.
Tenho gênios da poesia na minha estante, livros de tirar o folego, mas, um livro que gostaria de ler e ainda não existe, talvez nunca existirá, seria algo como o último grau da expressividade daquilo que eu vejo e penso, poeticamente, do mundo. Mas acho que isso é inatingível, pois é incomunicável, nem por mim mesmo. É um lado da poesia que cada um carrega em si mesmo, e parece ser intraduzível, ao que parece. Mas, para mim, a poesia é justamente essa tentativa, essa luta, e que, por essa razão, me fascina tanto, é a linguagem que mais se aproxima desse todo incomunicável.