Ivan Jaf é escritor.
Como você começa o seu dia? Você tem uma rotina matinal?
Tenho um apartamento,separado da minha residência, que uso como escritório. Passo três ou quatro dias por semana trancado nele, isolado, e assim consigo manter minha rotina ideal: acordar às oito, fazer um café, sentar diante do computador e começar a escrever. É importante não falar com ninguém. Acredito que dessa forma meu cérebro ainda vai estar funcionando num “modo sonho”. Eu só escrevo ficção.
Em que hora do dia você sente que trabalha melhor? Você tem algum ritual de preparação para a escrita?
Como meu único ritual é não falar com ninguém antes, só consigo trabalhar pela manhã. E vou assim até o meio-dia. Incomunicável. Não atendo telefone. Se der um “bom dia”, estraga.
Você escreve um pouco todos os dias ou em períodos concentrados? Você tem uma meta de escrita diária?
Tento escrever todos os dias, mas a realidade às vezes impede. Não tenho meta, algo como um número determinado de páginas, mas sinto quando a vitalidade está diminuindo e o texto está saindo sem energia. Aí eu paro e me dou uma dose de uísque de presente.
Como é o seu processo de escrita? Uma vez que você compilou notas suficientes, é difícil começar? Como você se move da pesquisa para a escrita?
Pesquiso muito antes de escrever. Acho que escrevo para poder pesquisar. Meus interesses vão desde História do Brasil à vida sexual das sardinhas. Geralmente rabisco as anotações nas páginas dos próprios livros. Só não faço isso nas obras raras. Fico tão empolgado nessa fase de pesquisa que tenho um critério aleatório para me impedir de continuar indefinidamente: quando a pilha de livros alcança um metro de altura eu paro. Então começa a rotina de escrever todos os dias e a coisa simplesmente vai saindo, devido a um processo misterioso que faço questão de não elucidar.
Como você lida com as travas da escrita, como a procrastinação, o medo de não corresponder às expectativas e a ansiedade de trabalhar em projetos longos?
Não sinto nada disso. É o meu trabalho. Não faço outra coisa na vida. Procuro ser um escritor em tempo integral. Não existe a idéia de férias. Minha mente está sempre cheia de palavras, epifanias e projetos. Gosto especialmente dos projetos longos. Eles me dão a certeza de que terei o que fazer por muito tempo.Gosto da sensação de que a vida é curta.
Quantas vezes você revisa seus textos antes de sentir que eles estão prontos? Você mostra seus trabalhos para outras pessoas antes de publicá-los?
Uso a técnica de deixar o texto na gaveta por um mês ou mais, para que os defeitos apareçam, num processo de decantação. Quando coloco o ponto final em um trabalho, depois de tanto investimento anímico, acho que ele está ótimo, perfeito, genial. Mas não está, e só o tempo me convence disso. Nunca mostro meus trabalhos antes. Só quando já viraram livros. Apenas os editores lêem os originais.
Como é sua relação com a tecnologia? Você escreve seus primeiros rascunhos à mão ou no computador?
Uso a tecnologia como um instrumento de facilitação, sem deixar que ela se torne determinante. O requisito é que seja útil ao meu trabalho. Escrevo direto no computador, mas faço as correções no papel. Quando entro nas mídias sociais fico o tempo todo aflito, com a sensação de estar perdendo tempo. Gosto do Google, mas não tenho celular.
De onde vêm suas ideias? Há um conjunto de hábitos que você cultiva para se manter criativo?
Toda a história da Filosofia ocidental é a tentativa de responder a essa pergunta. As ideias vêm da realidade, da experiência, ou são inatas, já estão dentro de nós? Empirismo ou idealismo? Provavelmente, de ambas as fontes. Às vezes sinto que uma ideia me veio do nada. Outras, claramente o mundo exterior me mostrou. Nos dois casos, o que eu preciso é ficar atento. E ter um pedaço de papel e um lápis. Posso citar um hábito: leio, todas as noites, durante pelo menos duas horas. Livros.
O que você acha que mudou no seu processo de escrita ao longo dos anos? O que você diria a si mesmo se pudesse voltar à escrita de seus primeiros textos?
Acumulei mais conhecimento e experiência, e isso se reflete no trabalho. Sei dosar melhor minha energia. Antes construía meus livros como casas pré-fabricadas. Hoje elas são de pau-a-pique. A cada dia eu jogo um pedaço de barro e aliso, com calma.
Se eu voltasse no tempo e pudesse dar um conselho a mim mesmo, ficaria calado e me deixaria errar. Meus acertos saíram dos erros.
Que projeto você gostaria de fazer, mas ainda não começou? Que livro você gostaria de ler e ele ainda não existe?
Eu gostaria de fazer uma imensa pesquisa , sobre todos os povos, de todos os tempos e lugares, recolhendo as concepções que os seres humanos criaram sobre o que nos acontece após a morte. O título: PARA ONDE VAMOS? A intenção: achar um denominador comum. Se uma ideia, mesmo que só um detalhe, perpassasse todas as teorias, quem sabe teríamos uma resposta para o título. Mas como eu decidi só escrever ficção, não vou fazer nada disso. Melhor assim. Essa tal resposta teria tudo para virar mais uma religião.