Ivan Colangelo Salomão é Professor da Faculdade de Ciências Econômicas da Universidade Federal do Rio Grande do Sul.
Como você começa o seu dia? Você tem uma rotina matinal?
Se há algo de que eu não consigo me desvencilhar é a minha rotina matinal. Acordo relativamente cedo, leio dois jornais e as manchetes de vários outros, de panfletos regionais ao NY Times. Depois faço atividades físicas, almoço, tomo banho e então começo a trabalhar. Nos dias em que dou aula de manhã, volto da faculdade, leio jornal e só começo a trabalhar após almoçar.
Em que hora do dia você sente que trabalha melhor? Você tem algum ritual de preparação para a escrita?
Eu nunca tinha parado para pensar nessa questão até ler as respostas dos outros entrevistados. Jamais escrevo pela manhã. Durante a tarde, talvez. Mas mesmo contrariando o que eu gostaria de ser – um sujeito diurno – penso que os melhores trechos que já escrevi vieram no início da madrugada. Mas é apenas um chute, realmente não saberia responder de forma categórica.
Você escreve um pouco todos os dias ou em períodos concentrados? Você tem uma meta de escrita diária?
As duas coisas. Mas prefiro pensar que tenho longas horas para sentar e escrever. Se tiver menos de uma hora, nem gasto energia ligando o computador. Talvez não seja a estratégia mais inteligente, mas é assim que funciono. Uma meta? Já aceitei que, no meu ritmo de escrita, não consigo escrever mais de duas páginas por dia.
Como é o seu processo de escrita? Uma vez que você compilou notas suficientes, é difícil começar? Como você se move da pesquisa para a escrita?
A dificuldade maior está justamente na compilação das notas. Sou obsessivo em relação a isso e não começo a escrever se não tiver compilado tudo o que imagino utilizar como subsídio para o texto. Obviamente que, na maioria das vezes, não uso nem metade. Mas uma vez iniciada a escrita, eu embalo. Não exatamente na velocidade – até porque quem escreve duas páginas por dia não pode ser reconhecido como um Bolt das letras. Mas fico vidrado no texto a ponto de não conseguir me concentrar em outras questões. Várias foram as vezes em que fui deitar e tive que levantar da cama porque me ocorreu uma ideia impostergável para o artigo.
Como você lida com as travas da escrita, como a procrastinação, o medo de não corresponder às expectativas e a ansiedade de trabalhar em projetos longos?
Para mim, essa questão da trava tem vida curta. De fato, há momentos ou dias em que não vai, não adianta insistir. Mas isso não dura mais que horas ou um dia, no máximo. Sair de casa, espairecer, relaxar, são estratégias que realmente devem ser consideradas nessas situações.
Quantas vezes você revisa seus textos antes de sentir que eles estão prontos? Você mostra seus trabalhos para outras pessoas antes de publicá-los?
Incontáveis. Antes de apertar o enter, eu li tantas vezes o original que já nem aguento mais olhar para ele. E se me fosse dada a possibilidade de oferecer um conselho a alguém, ele seria: imprima e leia o seu texto no papel antes de dá-lo por encerrado. O grau de atenção é infinitamente maior se comparado à leitura em meios eletrônicos, mesmo para aqueles que nasceram nas gerações VWXYZ.
Como é sua relação com a tecnologia? Você escreve seus primeiros rascunhos à mão ou no computador?
Logo que comecei a escrever, os dois ou três primeiros textos eu rascunhava à mão. Mas logo depois passei a usar o computador. Talvez seja menos convidativo para rabiscar ideias, mas usando cores diferentes, por exemplo, dá para organizar a redação futura de forma mais ou menos satisfatória.
De onde vêm suas ideias? Há um conjunto de hábitos que você cultiva para se manter criativo?
De um esforço espartano para ser criativo. Na verdade, não sei se criatividade está entre as habilidades que podem ser adquiridas por meio de treino ou bagagem de leitura, ou se é um talento com o qual se nasce. No meu caso, como não nasci com esse dom, eu leio e releio várias vezes para identificar todas as possibilidades de melhoria.
O que você acha que mudou no seu processo de escrita ao longo dos anos? O que você diria a si mesmo se pudesse voltar à escrita de sua tese?
Não saberia responder à primeira pergunta de forma cabal. Talvez a maturidade me fez enxergar o valor da sobriedade. Quando se é jovem, a poesia às vezes vale mais do que o conteúdo. Querendo impressionar o leitor, já me fartei de trechos panfletários como recurso retórico. Não que eu me arrependa, mas hoje certamente não escreveria muitas das coisas que publiquei aos vinte e poucos anos. E dado que defendi a tese há quatro anos, eu (ainda) não mudaria muita coisa nela. Não na escrita, ao menos.
Que projeto você gostaria de fazer, mas ainda não começou? Que livro você gostaria de ler e ele ainda não existe?
Artigos acadêmicos, inúmeros. Tenho um projeto de pesquisa acadêmica para a vida inteira. Mas estou começando a organizar um livro, junto com outros colegas historiadores e economistas, que terá, imagino, uma boa repercussão entre o público não especializado. Posso ver o livro na cabeceira da cama de ministros, presidentes e homens públicos em geral.