Itamar Vieira Junior é escritor, autor de A oração do carrasco.
Como você começa o seu dia? Você tem uma rotina matinal?
Eu costumo acordar muito cedo, levanto com a luz do sol entrando no quarto. Nesse horário, gatos e cães costumam demandar minha energia. Quando está tudo em ordem leio os jornais pelo smartphone e saio para praticar exercícios físicos. Cinquenta minutos de caminhada, corrida e exercícios aeróbicos. Depois sigo para o meu trabalho, que não envolve literatura.
Em que hora do dia você sente que trabalha melhor? Você tem algum ritual de preparação para a escrita?
Eu costumo escrever à noite, depois das 18 horas. Nos dias de grande furor chego à madrugada escrevendo. Gosto de meditar antes, reservar um tempo para acalmar meu corpo e mente do estresse diário. Dez minutos são suficientes para repor minhas energias e começar a trabalhar. Tem dias em que leio um pouco antes de escrever: poesia, romance ou qualquer leitura de meu interesse. Sento-me confortavelmente em meu quarto – com os animais ao meu redor – e trabalho até esgotar o que tenho para escrever naquele dia.
Você escreve um pouco todos os dias ou em períodos concentrados? Você tem uma meta de escrita diária?
Quando estou envolvido em algum projeto – a escrita de um livro ou artigo – escrevo todos os dias, inclusive sábado e domingo, que são os dias em que costumo render mais. Sou tão metódico nesse processo que chego a ficar incomodado se preciso estar em algum outro local no horário que reservo à escrita. Estabeleço uma meta de acordo com a extensão do projeto. O contador de palavras do Word me ajuda a saber se estou ou não cumprindo o que me propus. Penso que a disciplina é a maior aliada para quem se propõe a fazer qualquer coisa na vida: desde o preparo de uma refeição até escrever um romance.
Como é o seu processo de escrita? Uma vez que você compilou notas suficientes, é difícil começar? Como você se move da pesquisa para a escrita?
Meu processo de escrita sempre começa em meu corpo e entorno. Os temas surgem de todas as formas possíveis, e quando tenho certeza que é um projeto viável, começo a pesquisar e reunir o material que existir (e de que eu tenha conhecimento) para leitura e estudo. Nesse momento faço breves anotações em cadernos e continuo sentindo a história. É como se abrisse um portal, um mundo paralelo, onde passeio e me surpreendo com histórias e personagens. É assim que a história se inscreve em mim e esse ciclo permanecerá até o ponto final. Quando começo a escrever, de fato, costumo trabalhar até terminar o projeto.
Como você lida com as travas da escrita, como a procrastinação, o medo de não corresponder às expectativas e a ansiedade de trabalhar em projetos longos?
Procrastinação é uma palavra que desconheço. Escrevo ou não, é muito simples. Se tenho vontade, escrevo. Se adio algum projeto é porque não era o momento para ser escrito. Se a história for consistente, conseguirei chegar até o fim e a carpintaria continuará muito além do ponto final. O medo da avaliação é um fato, mas ele não se antecipa no tempo. Só surge quando o livro está publicado e nas mãos dos leitores.
Quantas vezes você revisa seus textos antes de sentir que eles estão prontos? Você mostra seus trabalhos para outras pessoas antes de publicá-los?
A revisão de um escritor é quase eterna. Por isso, é melhor não abrir o livro depois de publicado, senão sentirei vontade de reescrevê-lo. Reviso cada trabalho exaustivamente, até considerá-lo pronto. Posso levar meses revisando um texto. Gosto de submeter meus escritos a leitores criteriosos, que sejam honestos em sua avaliação.
Como é sua relação com a tecnologia? Você escreve seus primeiros rascunhos à mão ou no computador?
Costumo escrever o texto, em si, no computador. Já utilizei máquina de escrever também. Faço anotações a todo instante: em cadernos, pedaços de papel e no bloco de notas do smartphone. Na correria do dia-a-dia uso até o gravador de voz para registrar notas importantes para o trabalho que estou desenvolvendo. No momento da revisão, gosto de alterná-la na tela do computador e também nas páginas impressas. Não abro mão de corrigir com a caneta no papel, onde as anotações flutuarão nos espaços possíveis.
De onde vêm suas ideias? Há um conjunto de hábitos que você cultiva para se manter criativo?
A vida é a maior fonte de ideias para quem trabalha com criação. E a arte é que alimentará o desejo de criar. Para um escritor, ler exaustivamente é o melhor hábito que se pode cultivar. Escrever, da mesma forma. Pela música, a dramaturgia, o cinema, as artes plásticas, as ciências, transitar através das múltiplas formas da expressão humana e, principalmente, estar alerta, vivo, é o que melhor podemos fazer para nos mantermos criativos.
O que você acha que mudou no seu processo de escrita ao longo dos anos? O que você diria a si mesmo se pudesse voltar à escrita de seus primeiros textos?
À medida que o tempo avança, minha escrita se modifica, porque ela se reelabora a cada livro novo com que tenho contato. Vamos assimilando novas formas de narrar que estão enredadas do mundo que nos cerca e que vive transformações, numa velocidade impressionante. Se pudesse voltar à escrita dos livros anteriores, certamente seriam livros diferentes, narrados de uma forma diferente, porque já não sou mais o mesmo.
Que projeto você gostaria de fazer, mas ainda não começou? Que livro você gostaria de ler e ele ainda não existe?
Tem um projeto que alimento há nove anos e ainda estou reunindo o material necessário, mas sinto que ainda não chegou o momento de escrevê-lo. Sobre o livro que gostaria de ler, deixo que a própria vida me surpreenda com essa história mágica que ainda não existe.