Isabel Florinda Furini é escritora, poeta e educadora.
Como você começa o seu dia? Você tem uma rotina matinal?
Não tenho rotina matinal, porque escrevo no momento em que sinto o desejo de escrever. Às vezes, sigo alguma rotina por um tempo, até terminar o trabalho. O trabalho do escritor se divide em dois momentos: o momento da inspiração e o momento do aprimoramento. A inspiração chega em qualquer horário do dia. Já o aprimoramento pode ser organizado. Levantar de manhã, tomar o café e ler o texto aprimorando as estrofes, no caso de poemas, ou os parágrafos se for prosa. No meu caso, esse trabalho de aprimoramento é organizado – mas só é mantido até terminar a correção do livro.
Em que hora do dia você sente que trabalha melhor? Você tem algum ritual de preparação para a escrita?
Eu escrevo melhor à noite. Talvez porque o horário noturno é mais silencioso e isso me permite maior concentração, pois meu apartamento está localizado ao lado de uma via rápida. Sei que alguns escritores precisam de um objeto, ou de um ritual para escrever. García Márquez precisava ver na mesa de trabalho uma flor. Outros necessitam organizar bem o local. Quando começo a escrever, eu gosto de beber chá de frutas, o que talvez seja um ritual que eu não havia percebido.
Você escreve um pouco todos os dias ou em períodos concentrados? Você tem uma meta de escrita diária?
Pessoas organizadas têm metas diárias. Eu escrevo sem um horário fixo para começar ou para terminar. Gosto de escrever quando sinto vontade. Alguns dias escrevo muito, e noutros não escrevo nem uma linha.
Como é o seu processo de escrita? Uma vez que você compilou notas suficientes, é difícil começar? Como você se move da pesquisa para a escrita?
Eu já escrevi livros de não ficção como “O Livro do Escritor”, “Como Escrever crônicas”, “Práticas de Oratória”, e outros. O método que sigo para esses trabalhos é diferente do caminho que sigo quando escrevo poesia. Quando decido escrever um livro de não ficção, procuro material, anotando minhas reflexões, pensamentos e conclusões. Escrevo e reescrevo. Geralmente inicio anotando definições sobre o assunto tratado. Definir e limitar o assunto me ajuda a esboçar os passos que vou seguir. Quando escrevo poesia é diferente. É o caos total. Escrevo em guardanapos de restaurantes, cafés e lanchonetes. Escrevo em agendas, em cadernos, se estou na rua escrevo em pedaços de papel, em sacolinhas, nos cantos de revistas e de jornais, enfim, só preciso de uma caneta na mão, pois qualquer papel pode servir.
Como você lida com as travas da escrita, como a procrastinação, o medo de não corresponder às expectativas e a ansiedade de trabalhar em projetos longos?
Esse é um aspecto difícil para qualquer escritor. Alguns assuntos produzem bloqueios. Seja porque o tema escolhido é difícil ou pelo medo de não ser claro na abordagem ou de ser mal entendido. Muitas vezes você escreve “a”, e, magicamente, as pessoas entendem “z”. Essa preocupação de usar as palavras adequadas, de organizar as frases e os parágrafos, de criar metáforas, é constante e, muitas vezes, é desgastante. A tarefa de escrever não é só diversão. A estrada do escritor não é só feita de flores. Quando em 2006, a editora Bolsa Nacional do Livro me chamou para escrever em 4 meses uma coleção de Filosofia para crianças, dividida em 6 volumes, o estresse foi muito profundo. Tanto que quando entreguei os originais de “Corujinha e os filósofos”, respirei profundamente e pensei que conseguiria descansar, mas acabei ficando doente. A ansiedade é terrível quando você é contratado para fazer um livro. Você sabe que o editor tem seu próprio projeto na cabeça, e o livro precisa apenas preencher as expectativas dele. No caso dessa coleção, o resultado foi ótimo, pois ela me proporcionou muitas alegrias. Fui entrevistada em dois ou três programas de televisão e no dia do lançamento uma senhora se aproximou para falar comigo, contando que o marido havia falecido fazia 5 meses e sua filha não queria sair de casa. Ela estava assistindo tevê, sentada no sofá da sala, quando a menina disse: “Eu quero ir e comprar essas histórias da Corujinha para entender filosofia”. A mãe nem havia notado que a menina estava atenta ao programa de entrevistas. Fiquei muito emocionada. Penso que a filosofia é alimento para nossas almas.
Quantas vezes você revisa seus textos antes de sentir que eles estão prontos? Você mostra seus trabalhos para outras pessoas antes de publicá-los?
Faço várias revisões, dependendo do texto podem parecer infinitas. Outros textos só precisam de um olhar. Às vezes, peço opinião de outras pessoas.
Como é sua relação com a tecnologia? Você escreve seus primeiros rascunhos à mão ou no computador?
Para contos, crônicas e livros de não ficção aproveito a tecnologia, escrevo no computador. Poesia é um gênero diferente, escrevo à mão e depois digito.
De onde vêm suas ideias? Há um conjunto de hábitos que você cultiva para se manter criativa?
Gosto de escrever livros de filosofia, pois a filosofia mantém a mente ativa, permite o questionamento. Também leio poesia, seja livros ou postagens no Facebook e em sites do Google.
O que você acha que mudou no seu processo de escrita ao longo dos anos? O que você diria a si mesma se pudesse voltar à escrita de seus primeiros textos?
Essas perguntas são muito importantes, porque ao longo dos anos vamos fortalecendo nosso estilo, deixando aflorar nossa própria voz. Se pudesse voltar no tempo daria um bom conselho para mim mesma: “Não fique tão ansiosa com a opinião dos outros, foque-se em fazer o melhor – confie em sua própria visão”.
Que projeto você gostaria de fazer, mas ainda não começou? Que livro você gostaria de ler e ele ainda não existe?
Tenho vários projetos que deixei pelo caminho. Alguns iniciei e nunca terminei. Outros, nem foram iniciados, ficaram na mente. Entre esses projetos está o de escrever um livro de poesia homenageando os grandes poetas do mundo, de Jorge Luís Borges à Ezra Pound, de Cervantes e Camões a Fernando Pessoa e Ferreira Gullar, de Gabriela Mistral à Helena Kolody. É um trabalho gigantesco. Nunca tive a coragem de iniciar esse livro.